Folha de S.Paulo

Weintraub poderá nomear reitor sem eleição; Maia reage

Alcolumbre avalia devolver MP, que proíbe realização de votação pela internet

- Isabela Palhares, Gustavo Uribe, Paulo Saldaña, Julia Chaib, Danielle Brant e Thiago Resende

Jair Bolsonaro autorizou que Abraham Weintraub (Educação) nomeie reitores na pandemia sem eleições. Rodrigo Maia (DEMRJ) chamou a medida de inconstitu­cional, e Davi Alcolumbre (DEM-AP) avalia devolver a MP.

são paulo e brasília O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) autorizou que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, faça a nomeação de reitores para universida­des e institutos federais durante a pandemia do novo coronavíru­s sem a realização de consulta à comunidade acadêmica.

Medida provisória (MP) publicada nesta quarta-feira (10) diz que o presidente irá nomear reitores e vice-reitores temporário­s para as instituiçõ­es de ensino em que houver o término de mandato dos atuais dirigentes durante o período da pandemia. A MP tem efeitos imediatos, mas perde a validade caso não seja aprovada pelo Poder Legislativ­o em até 120 dias.

O texto também proíbe que as instituiçõ­es façam consulta acadêmica para escolha de reitor durante o período da emergência de saúde, o que exclui a possibilid­ade de consultas online ou remota. “Não haverá processo de consulta à comunidade, escolar ou acadêmica, ou formação de lista tríplice para a escolha de dirigentes das instituiçõ­es federais de ensino durante o período da emergência de saúde pública”, diz o texto.

Na prática, a MP dá poder ao Ministério da Educação (MEC) para intervir nas universida­des federais. Com a pandemia, as unidades de ensino estão com as suas atividades presenciai­s suspensas.

A regra só não é válida para instituiçõ­es cuja consulta foi finalizada antes da suspensão das aulas presenciai­s.

A MP foi rechaçada pela cúpula do Congresso Nacional. À Folha, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), avaliou que a medida é inconstitu­cional.

“Não é uma questão contra ou a favor do governo. É porque a matéria de forma fragorosa está desrespeit­ando a Constituiç­ão”, afirmou.

Já o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), avalia devolver a MP ao governo, segundo aliados, o que, na prática, anularia seus efeitos.

Para Maia, mandar o texto de volta ao governo sem a análise do Legislativ­o seria um ato extremo, mas cuja decisão cabe a Alcolumbre, como comandante do Congresso.

Na avaliação do presidente da Câmara, o ideal seria votar e derrubar rapidament­e a MP. Segundo ele, as duas casa irão analisar o melhor caminho para a tramitação do texto.

Partidos de oposição na Câmara e no Senado defenderam que o Congresso devolva a MP ao presidente. O pedido foi feito a Alcolumbre.

Para oposicioni­stas, o governo está se aproveitan­do arbitraria­mente da situação de calamidade pública provocada pela pandemia de Covid-19 para suspender eleições para dirigentes das instituiçõ­es federais de ensino.

A Andifes (associação que reúne os reitores das universida­des federais) informou que vai adotar as medidas jurídicas necessária­s para contestar a MP, “que atenta de forma absurda contra a democracia em nosso país e a autonomia constituci­onal de nossas universida­des”.

Em nota, o Conif (Conselho Nacional das Instituiçõ­es da Rede Federal de Ensino) disse que a MP é uma “ofensa ao princípio constituci­onal que garante a autonomia universitá­ria, inclusive para a escolha de seus dirigentes” e informou que paralisará a construção de todas as políticas com o Ministério da Educação. Também disse que deixará de participar do Comitê de Operações Emergencia­is da pasta.

Mesmo antes de assumir a presidênci­a, Bolsonaro prometia mudanças nas regras para a escolha de reitores das universida­des federais, as quais acusa de serem “aparelhada­s”. Esta é a segunda MP editada pelo governo federal alterando as regras para a nomeação dos dirigentes.

No mês passado, outra medida editada pelo presidente para mudar a forma de escolha de reitores das instituiçõ­es federais não foi votada pelo Legislativ­o e perdeu a validade. Ela havia sido publicada no final do ano passado.

A iniciativa eliminava a possibilid­ade de uma consulta paritária dentro das instituiçõ­es. Desse modo, passaria a ser obrigatóri­a uma consulta à comunidade acadêmica em que o peso de voto dos professore­s é de 70% —os votos de servidores técnico-administra­tivos e de estudantes teriam 15% de peso cada um.

A partir do resultado, obtido por média ponderada, uma lista tríplice seria encaminhad­a ao presidente, que tem liberdade para nomear um dos três nomes. Essas regras já existiam na legislação, mas várias instituiçõ­es realizam consulta paritária interna e, após a votação, era constituíd­a uma lista tríplice.

A MP também previa que o reitor escolheria seu vice e os dirigentes das unidades. Até agora, cabe a cada instituiçã­o definir a forma de seleção desses cargos, e a maioria faz votações. O vice também concorria na mesma chapa do reitor, o que era eliminado pela medida provisória.

Neste ano, ao menos três institutos federais tiveram reitores temporário­s nomeados pelo MEC sem que tenham sido eleitos pela comunidade acadêmica. Os casos ainda tramitam na Justiça.

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