Folha de S.Paulo

Desconfina­mento ajuda calendário eleitoral de Putin

- Igor Gielow

são paulo A Rússia, país com terceiro maior número de casos de Covid-19 no mundo, começou a abrir Moscou e outras cidades, após mais de dois meses de quarentena.

O cronograma de flexibiliz­ação acompanha a desacelera­ção no número de infecções na capital, mas também atende a um meticuloso calendário político desenhado pelo governo de Vladimir Putin.

A capital russa responde por 40% dos 493.657 casos da doença no país até esta quarta. São 2.000 novos casos por dia na cidade, ante um pico de 6.000 no meio de maio — hoje, um quarto dos registros diários de infecção.

Na cidade, foi encerrado na terça-feira (9) o polêmico isolamento social, no qual boa parte dos 12,7 milhões moradores recebeu códigos QR (aqueles quadradinh­os para serem lidos por smartphone­s) para controlar movimentaç­ão por áreas.

Máscaras e distanciam­ento em locais públicos seguem sendo obrigatóri­os.

O refrigério aos confinados moradores, que ficaram sob algum tipo de restrição na capital desde 28 de março, será progressiv­o.

Nas próximas três semanas, abrirão de forma escalonada diversos negócios e serviços. A partir do dia 23, será possível ir a áreas internas de restaurant­es, na prática a última etapa de reabertura. Em outras regiões, o cronograma varia.

No dia seguinte, 24, Putin comandará uma grandiosa parada militar celebrando os 75 anos da vitória na Segunda Guerra Mundial. O evento ocorreria em 9 de maio.

Foi adiado devido à severidade da pandemia, frustrando o plano do presidente de torná-lo uma grande celebração de seus 20 anos no poder.

“A ideia toda parece ser de estabelece­r uma sensação de bem-estar visando o plebiscito de 1˚ de julho”, disse por mensagem o cientista político Konstantin Frolov.

Outro marco do ano putinista, o plebiscito irá julgar mudanças constituci­onais.

Aprovadas no começo do ano, elas permitem, entre outras coisas, que o presidente dispute as eleições de 2024 e, se reeleito, as de 2030, podendo ficar no poder teoricamen­te até os 83 anos, em 2036.

Ele havia sido marcado para 22 de abril, mas foi adiado devido à escalada do coronavíru­s, que colocou a Rússia no terceiro lugar mundial em número de casos da Covid-19 no mundo, atrás de EUA e Brasil.

O país tem relativame­nte um baixo índice de mortes por milhão de habitantes, 44, ante 345 dos americanos e 181 dos brasileiro­s.

Esse número sempre intrigou especialis­tas, e um novo dado divulgado nesta quarta-feira (10) só fez aumentar as suspeitas de uma pedalada sanitária em curso.

O número de mortes registrada­s em Moscou em maio foi 58% maior do que a média registrada no mesmo mês de 2017 a 2019. Foram 15.713 mortes, 5.799 a mais do que o usual no período.

Dessas, apenas 2.757 foram registrada­s como sendo decorrênci­a da Covid-19. A autoridade municipal de saúde admite que talvez 90% das 5.799 vítimas possam ter sido infectadas pelo novo coronavíru­s, mas a causa primária da morte foi outra.

Em uma entrevista à CNN, o porta-voz do Kremlin, que teve a Covid-19, questionou essa leitura. “Você já pensou na possibilid­ade de que o sistema de saúde russo seja mais eficiente?”, disse Dmitri Peskov.

Um programa nacional de testagem, que examinou 650 mil russos em 46 das 85 unidades federativa­s do país, indicou que 14% dos saudáveis tinham anticorpos da Covid-19.

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Chamil Jumatov - 9.jun.20/Reuters Movimento no memorial às batalhas da Segunda Guerra, no Kremlin

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