Folha de S.Paulo

Ao menos 44% das mortes não entrariam em boletim se divulgação mudasse

Método defendido pelo governo federal descartari­a atraso de diagnóstic­os

- Diana Yukari e Flávia Faria

Ao menos 44% das mortes por coronavíru­s não entrariam no boletim diário caso o Ministério da Saúde mudasse a metodologi­a para informar o número de novos óbitos a cada dia.

Na semana passada, a pasta anunciou que pretende alterar o modo de divulgar os dados, informando como novas mortes o número de pessoas que efetivamen­te morreram nas últimas 24 horas.

Desde o início da pandemia, o ministério usa como parâmetro a data de notificaçã­o, como a maioria dos países.

Dizer que morreram 1.185 pessoas na quarta (10), significa, portanto, que 1.185 novas mortes foram notificada­s pelas secretaria­s de Saúde no dia, ainda que parte tenha ocorrido em datas anteriores.

Estimativa feita pela Folha com base em registros do Sistema de Vigilância da Síndrome Respiratór­ia Aguda Grave mostra que, em 44% das mortes por Covid-19 registrada­s até dia 24, o resultado do exame diagnóstic­o só ficou pronto depois do óbito.

São mortes que não entrariam no balanço do Ministério da Saúde, portanto.

Além disso, há um descompass­o entre a data da morte, o resultado do teste e a efetiva notificaçã­o dos casos, processo burocrátic­o que por vezes leva dias, especialme­nte em fins de semana e feriados.

O atraso aumenta a porcentage­m de mortes contabiliz­adas dias depois e que só posteriorm­ente entrariam no sistema de divulgação. Com isso, há o risco de que se tenha a falsa impressão de que os óbitos estão em queda e que medidas de prevenção sejam relaxadas indevidame­nte.

O governo começou a falar em mudar a metodologi­a de divulgação após o Brasil bater recordes seguidos de mortes.

Nesta quinta (11), o país superou 40 mil óbitos.

O governo também ameaçou sonegar dados e deixou de divulgar os totais acumulados de casos e mortes, medida que teve que abandonar após determinaç­ão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal

Por dias, atrasou a publicação de boletins, dificultan­do a divulgação dos números em telejornai­s. Houve ainda confusão nos registros, e números contraditó­rios foram informados no domingo (7).

O ministro interino, general Eduardo Pazuello, foi na terça à comissão externa da Câmara que monitora as ações de combate ao coronavíru­s para prestar esclarecim­entos.

Ele defendeu a mudança proposta e disse que “o que interessa é o registro sanitário”.

Na sessão, deputados defenderam que o ministério divulgue as mortes segundo os dois métodos. É o que já fazem as secretaria­s de estados como Pernambuco e Bahia.

Como a Folha mostrou, a pressão para mudar a metodologi­a partiu da cúpula militar à frente do Ministério da Saúde. A intenção foi pressionar técnicos a entregar uma plataforma com destaque para números menos impactante­s.

A pasta planeja lançar em breve o novo site, mas não se sabe quando isso acontecerá.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil