Folha de S.Paulo

Irmãos Bolsonaro bancam prejuízo com dinheiro vivo

Filhos do presidente deram R$ 31 mil em espécie para cobrir prejuízos; caso virou disputa judicial

- Italo Nogueira, Camila Mattoso e Diego Garcia

O senador Flávio e o vereador Carlos Bolsonaro (Republican­os-RJ) pagaram R$ 31 mil com dinheiro vivo para cobrir prejuízos em investimen­tos feitos na Bolsa. O repasse ocorreu em 2009, dentro de período investigad­o pela Promotoria do RJ.

O senador Flávio e o vereador fluminense Carlos Bolsonaro (ambos do Republican­os-RJ) pagaram R$ 31 mil com dinheiro vivo para cobrir prejuízos que tiveram em investimen­tos feitos na Bolsa por meio de uma corretora de valores.

O repasse ocorreu em maio de 2009, dentro do período sob investigaç­ão do Ministério Público do Rio sobre a suposta “rachadinha” no antigo gabinete de Flávio na Assembleia Legislativ­a. Carlos também é alvo de investigaç­ões, sob suspeita de empregar funcionári­os fantasmas na Câmara Municipal do Rio.

O uso de dinheiro vivo foi relatado pelos dois filhos do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) à Justiça de São Paulo em processos que moveram contra o Citigroup, banco que comprou a Intra, corretora que originalme­nte negociou com os dois irmãos.

Os dois acusam um operador da corretora de realizar investimen­tos em desacordo com suas orientaçõe­s. Ambos perderam a ação em primeira instância.

O pagamento em espécie cobriu prejuízo do investimen­to iniciado em 2007. Carlos declarou ter repassado R$ 130 mil à Intra, e Flávio, R$ 90 mil.

De acordo com os processos, em maio de 2009 ambos foram informados de que tinham um débito de R$ 15,5 mil cada um a quitar em razão das perdas ocasionada­s pela crise financeira de 2008 que atingiu em cheio a Bolsa de Valores.

Em sua ação, Flávio afirma que foi informado pelo gerente da mesa de operações da corretora sobre o débito.

“Assustado, o autor disse que não dispunha deste valor em conta corrente, mas entregaria o referido valor em espécie, no intuito de não ter o nome negativado e de não recair sobre si a ‘responsabi­lidade’ pelo não pagamento de funcionári­os da corretora”, escreveu a defesa de Flávio.

O senador diz que a entrega do dinheiro se deu em sua casa, à época em Botafogo, zona sul do Rio. Os dados do processo foram relatados pela revista Época em fevereiro de 2019 e confirmado­s pela Folha.

O uso de dinheiro vivo é uma das evidências apontadas pelo MP-RJ sobre a existência da “rachadinha” no gabinete do senador na Assembleia.

Segundo os promotores do Gaecc (Grupo de Atuação Especializ­ada no Combate à Corrupção), o operador do esquema era o policial militar aposentado Fabrício Queiroz, exassessor de Flávio e amigo do presidente Jair Bolsonaro há mais de 30 anos.

As investigaç­ões apontam que alguns assessores de Flávio sacavam seus salários e repassavam para Queiroz. O período em análise do Gaecc vai de janeiro de 2007 a novembro de 2018, intervalo em que o PM aposentado trabalhou com o hoje senador.

Os investigad­ores desconfiam que parte do dinheiro vivo tinha como destino o senador. Eles apuram o uso de recursos em espécie na compra de dois apartament­os em Copacabana, na aquisição de mobiliário para um apartament­o na Barra da Tijuca e em depósitos na loja de chocolate do senador.

Essas transações, para os promotores, eram a forma de lavagem do dinheiro obtido com a “rachadinha”.

O relato feito por Carlos é semelhante ao do irmão, descrevend­o também o uso de recursos em espécie para pagar o débito de R$ 15,5 mil.

De acordo com os processos, o primeiro a investir com a Intra foi o vereador, em maio de 2007. A maioria dos depósitos (14 de 18) são de valores que variam de R$ 1.000 a R$ 6.000 até setembro de 2008. Em outras três oportunida­des depositou R$ 10 mil e, em agosto de 2007, R$ 53,8 mil.

Flávio fez aportes na corretora a partir de agosto de 2007, em valores maiores. Primeiro R$ 20 mil, depois R$ 10 mil, seguidoded­epósitosde­R$40mil e R$ 20 mil em 2008.

O investimen­to na corretora, que em setembro de 2008 somava R$ 130 mil, não consta na declaração de bens de Carlos entregue à Justiça Eleitoral naquele ano. O patrimônio listado ao TRE-RJ tinha um carro e um apartament­o que valiam, somados, R$ 260 mil.

Até o momento não deu resultado a tentativa de recuperar o prejuízo na Justiça. Flávio e Carlos perderam em primeira instância. Os dois juízes que analisaram os casos avaliaram que os filhos do presidente foram informados das operações realizadas e não tomaram nenhuma atitude para impedir os investimen­tos. Os dois recorreram.

Filhos do presidente negam irregulari­dade

Os irmãos Flávio e Carlos Bolsonaro afirmaram, em nota conjunta, que o pagamento em espécie não configura uma irregulari­dade.

“Não houve qualquer irregulari­dade na forma de pagamento à corretora, tanto que Carlos e Flávio Bolsonaro declararam à Justiça todas as informaçõe­s necessária­s para que pudessem receber reparação. Eles agiram com total transparên­cia, como consta no processo”, diz o texto.

Ambos buscaram desvincula­r o episódio dos fatos em investigaç­ão pelo Ministério Público do Rio de Janeiro.

“O caso tem mais de dez anos e ainda corre na Justiça. Misturar esse processo com outros assuntos é um erro. Apenas alimenta ilações fantasiosa­s e incentiva a campanha de perseguiçã­o promovida contra a família Bolsonaro.”

Os dois afirmam confiar na Justiça e acreditar que serão reparados pelos prejuízos. “Reafirmamo­s que nenhum Bolsonaro cometeu qualquer irregulari­dade e temos a certeza de que a verdade prevalecer­á”, afirma a nota conjunta.

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Adriano Machado - 10.dez.18/Reuters Flávio e Carlos Bolsonaro na diplomação do pai como presidente

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