Folha de S.Paulo

Viagem ao centrão da Terra

- Bruno Boghossian

Antes de ganhar um ministério, o PSD ajudou Jair Bolsonaro a aprovar a reforma da Previdênci­a. A pauta era considerad­a amarga, e a proposta foi desidratad­a pelos parlamenta­res, mas a sigla colaborou com o governo: deu 34 votos a favor da medida e apenas 2 contrários.

Nas últimas semanas, líderes partidário­s brincavam que, ao distribuir cargos para o centrão, o presidente pagaria por um apoio que já recebe. Era um exagero. Apesar do avanço da pauta econômica, Bolsonaro nunca teve vida fácil na Câmara e no Senado. O gracejo, porém, mostra que a relação entre o Planalto e sua nova base aliada deve continuar instável.

Nas conversas em que ofereceu espaço aos partidos, o presidente não pediu apoio a uma agenda de governo. Segundo dirigentes, Bolsonaro só cobrou a aprovação do projeto que prorroga a validade das carteiras de motorista. Não citou nenhuma ideia para a economia ou para a saúde na esteira da pandemia.

O principal compromiss­o dessa sociedade é a defesa do presidente e de sua família. Alguns dos caciques estão dispostos a blindar o clã Bolsonaro em eventuais votações em CPIs, denúncias por crimes comuns, pedidos de impeachmen­t e nos conselhos de ética do Congresso.

A negociata não inclui, por exemplo, os retrocesso­s da agenda ideológica do presidente. Propostas econômicas podem ser vistas com boa vontade, mas o centrão é mais simpático ao aumento de gastos do que à tesoura de Paulo Guedes.

Ao amarrar siglas que somam cerca de 200 deputados, o governo pode até sofrer menos trancos no plenário, mas ainda está longe de obter maioria para tratorar a oposição e parlamenta­res críticos a Bolsonaro.

O presidente comprou a própria proteção, mas a fidelidade dessa base dependerá dos benefícios políticos do contrato. Além dos cargos em órgãos com orçamentos bilionário­s, a popularida­de de Bolsonaro também vai ditar os termos da relação. Todas essas siglas estiveram ao lado de Dilma Rousseff, até que os números da petista derreteram.

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