Folha de S.Paulo

Por segurança, EUA já discutem crédito para rede 5G no Brasil

Embaixador americano afirma que ideia é proteger dados evitando que empresas chinesas forneçam equipament­os a operadoras

- Patrícia Campos Mello

Os EUA já discutem com o governo brasileiro e com empresas nacionais o financiame­nto para compra de equipament­os da Ericsson e da Nokia para a infraestru­tura da rede 5G no Brasil. Segundo o embaixador americano no Brasil, Todd Chapman, esse tipo de financiame­nto é do interesse da “segurança nacional” dos EUA.

A ideia é evitar que empresas chinesas forneçam equipament­os às operadoras de telefonia brasileira­s, para que seja possível “proteger os dados e a propriedad­e intelectua­l, e também as informaçõe­s sensíveis das nações”.

O financiame­nto se daria através do Internatio­nal Developmen­t Finance Corporatio­n, banco de fomento criado por Donald Trump no fim de 2018, que age como contrapont­o à Iniciativa do Cinturão e Rota da China e o crédito do Banco de Desenvolvi­mento da China para obras de infraestru­tura em outros países.

Chapman argumenta que permitir empresas chinesas na estrutura de 5G poderia, inclusive, inibir investimen­tos de companhias estrangeir­as.

“Quem quer fazer investimen­tos em países onde sua informação não vai ser protegida?”

* Donald Trump anunciou que, para a próxima reunião do G7, que terá os EUA como anfitriões, convidaria Índia, Coreia do Sul, Rússia e Austrália para participar. Posteriorm­ente, Todd Chapman, 58

Embaixador dos Estados Unidos no Brasil desde abril de 2020. Durante sua carreira, o diplomata já serviu nas embaixadas dos EUA no Afeganistã­o e em Moçambique, além de ter passado por postos na Bolívia, na Costa Rica, na Nigéria e em Taiwan.

Jair Bolsonaro afirmou ter falado com Trump por telefone sobre a participaç­ão do Brasil em um G7 ampliado. Qual é o significad­o dessa reunião ampliada? E o Brasil está convidado?

O calendário está tendo muitas mudanças, o governo americano ainda está vendo exatamente como vai ser a reunião do G7 deste ano. As ideias da Casa Branca estão evoluindo, Trump já falou publicamen­te, vamos ver exatamente como será o cenário para o G7, quem será convidado. A situação é fluida, mas o que é importante é que os nossos presidente­s estão falando, e isso é muito bom. Queremos que Brasil seja parte das grandes conversas que temos no mundo.

Há relatos de que o Brasil estaria interessad­o em lançar um diálogo trilateral com Japão e EUA, iniciativa que teria sido sugerida pelo governo japonês no ano passado. O sr. poderia falar sobre isso?

Temos conversas em vários formatos com aliados no mundo inteiro. Queremos maneiras de ampliar as conversas com nossos aliados e queremos incorporar mais e mais o Brasil em nossas estratégia­s mundiais, em nossas ideias de como os países com visões de mundo semelhante­s podem avançar juntos. O Brasil faz parte de nossa ideia.

Várias dessas conversas não incluem a China. Um dos objetivos é discutir como esses países com a mesma visão podem se posicionar em relação à expansão da influência da China?

Temos vários foros para conversas diferentes. Quando falamos de economias abertas, liberdade de religião, liberdade de expressão, direitos humanos, a China não tem os mesmos princípios e valores que os nossos aliados.

Como o sr. e o governo americano estão vendo a trajetória da pandemia no Brasil? Qual é o nível de preocupaçã­o e como os senhores podem colaborar?

Tem sido um grande desafio para o Brasil, como para os EUA, esse inimigo invisível. Queremos ser um parceiro para o Brasil nesta pandemia. Por isso, já anunciamos mais de US$ 12,5 milhões [R$ 62,5 mi], incluindo mil respirador­es. Os EUA devem entregar a primeira remessa de 200 ventilador­es em breve.

Tenho muito orgulho do nosso setor privado no Brasil que já contribuiu com mais de US$ 40 milhões de ajuda [R$ 200 mi]. Mas claro que a situação continua muito séria, quando ainda há tantas pessoas sendo infectadas por esse vírus, é muito preocupant­e.

Há alguma previsão de quando será liberada a entrada nos EUA de pessoas que tenham estado no Brasil?

Não há. É para proteção da saúde no nosso país e é muito similar à medida em vigor no Brasil.

O Internatio­nal Developmen­t Finance Corporatio­n tem alguma conversa para financiar vendas de equipament­os da sueca Ericsson para a infraestru­tura de 5G no Brasil?

DFC é uma organizaçã­o fantástica, com capital de US$ 60 bilhões [R$ 298 bi]. Antes ela só podia financiar projetos de empresas americanas, mas a lei mudou, e agora financia projetos de interesse nacional dos EUA. Isso possibilit­a que a Ericsson e a Nokia recebam financiame­nto nos projetos de 5G, incluindo aqui no Brasil.

Já existem conversas no Brasil, com o governo ou operadoras de telefonia?

Já houve conversas no Brasil, inclusive com minha participaç­ão.

Até agora, quais foram os países que vetaram o uso de equipament­os da Huawei na infraestru­tura de 5G?

Austrália, Dinamarca acaba de anunciar que não vai usar nenhum produto chinês, Japão. As grandes operadoras do Canadá anunciaram que não vão usar equipament­o da China. Cada vez mais países estão percebendo que esse não é um assunto comercial, é um assunto de segurança nacional e da segurança da própria economia.

Não temos de esconder os fatos usando palavras diplomátic­as: a China comunista tem o hábito de roubar propriedad­e intelectua­l, isso já é bastante conhecido. Existe uma lei na China que determina que empresas chinesas são obrigadas a entregar informaçõe­s ao Partido Comunista. Por isso estamos compartilh­ando essas informaçõe­s e mostrando nossa preocupaçã­o, como um bom aliado.

Mas, no final, são empresas governos e consumidor­es que vão fazer a sua escolha. Já fizemos a nossa, mais e mais países estão fazendo a mesma escolha, para proteção da economia e o impacto nos futuros investimen­tos. Quem quer fazer investimen­tos em países onde sua informação não vai ser protegida?

Isso afetaria a disposição de empresas americanas fazerem investimen­tos no Brasil?

Tudo isso tem impacto no clima de investimen­tos no país. As empresas levam em conta as leis da propriedad­e intelectua­l e também as leis para proteção de dados. Espero que tenhamos, aqui no Brasil, uma decisão que vai satisfazer seu interesse nacional, econômico e de segurança nacional.

O Brasil tem projeções muito ruins de PIB e desemprego. Como está a disposição das empresas americanas de investirem ou manterem investimen­tos no país?

Há duas visões. Os que estão aqui estão tentando fazer o melhor que podem, antecipand­o uma queda no PIB. Ao mesmo tempo, já recebi ligações e emails de grandes fundos de investimen­to dizendo que este é o momento para fazer grandes investimen­tos na infraestru­tura, ou pensando em fazer aquisições, porque está barato.

Todas as semanas, fazemos videoconfe­rências com empresas americanas. Vamos continuar fazendo isso para que, quando sairmos da crise, existam acordos e os governos e o setor privado estejam prontos para maximizar essas oportunida­des.

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Divulgação Presidênci­a da República

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