Indicado a órgão ambiental culpa ganância por desmatamento
Subprocurador-geral da República, produtor rural, ex-soldado da Polícia do Exército, girista e mangalarguista (raças bovina e equina, respectivamente). É assim que se autodescreve Juliano Baiocchi Villa-Verde de Carvalho, 59. Na semana que vem, ele assume a coordenação da 4ª Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do Ministério Público Federal (MPF).
A indicação do procuradorgeral da República, Augusto Aras, tem provocado temores de que a 4ª Câmara se aproxime do presidente Jair Bolsonaro, defensor da expansão do agronegócio e crítico da legislação brasileira sobre preservação ambiental.
Em março, Baiocchi se disse favorável à MP (Medida Provisória) 910, que flexibilizava a regularização de terras públicas griladas. A proposta, criticada por nota técnica da 4ª Câmara, saiu de pauta.
Nesta entrevista à Folha por escrito, Baiocchi diz não ver antagonismo entre meio ambiente e produtor rural e que já atuou em processos envolvendo crimes ambientais.
Questionado sobre o desmatamento na Amazônia, citou problemas como “ganância de criminosos”, “fenômenos da natureza” e “diminuta capacidade dos órgãos de controle e fiscalização frente à escassez mundial de recursos naturais”, mas não mencionou as políticas de Bolsonaro.
O sr. é mais ligado ao agronegócio do que a questões ambientais. Considera que isso pesou na sua escolha para a 4ª Câmara?
Sou subprocurador geral da República. Não sou ligado ao agronegócio mais nem menos do que o brasileiro médio, que descende no mínimo de uma segunda geração de produtores rurais..
Na área ambiental no MPF, atuei como procurador regional da República, em muitos processos por crimes ambientais. Dei início, nos anos 1990, às investigações que resultaram na vitória do MPF na ação civil pública do carvão.
No STF, tenho atuado em processos sobre meio ambiente e nunca me deparei com esse antagonismo que sua pergunta encerra, entre o meio ambiente e o produtor rural.
Uma das atuações mais marcantes da Quarta Câmara no ano passado foi de oposição ao desmonte dos órgãos ambientais federais, incluindo o Ibama. O sr. vai manter essa posição?
Como membro de um colegiado de por três membros, não possuo esse protagonismo que você me atribui.
Outra atuação da Quarta Câmara é no projeto Amazônia Protege, que gerou centenas de ações civis públicas e multas a partir de imagens satelitais do Inpe. O sr. pretende manter?
Nem a Quarta Câmara e muito menos eu temos autoridade para suprimir ou manter ações civis públicas em curso, pois estão a cargo do Poder Judiciário.
Sob Bolsonaro, houve uma explosão no desmatamento na Amazônia. A que o sr. atribui isso?
À ganância de criminosos, ao clima, à sazonalidade, aos fenômenos da natureza, à diminuta capacidade dos órgãos de controle e fiscalização frente à escassez mundial de recursos naturais.
O sr. defendeu a MP 910, que propunha legalizar terras públicas invadidas até dezembro de 2018. Ela não beneficiaria grileiros, já que o Brasil já fez diversas regularizações fundiárias?
Eu defendi a regularização proposta na MP, que não era de invasões. Defendi o direito constitucional outorgado ao produtor rural ao título de propriedade da terra cuja posse foi concedida pelo Estado há meio século, em todo o Brasil e não só na Amazônia. Não vi na MP 910 nenhuma disciplina sobre direito ambiental, que não fosse reafirmar o cumprimento das normas em vigor pelo colono.
No ano passado, usou a expressão “no cangote do produtor rural”, em artigo, para criticar a Terracap. É a mesma expressão usada por Bolsonaro contra a fiscalização ambiental. O sr. compartilha da visão de que as regras atuais atrapalham o agronegócio?
No âmbito do tema do artigo que publiquei no Correio Braziliense, sim. Em Brasília temos mais de 9.000 famílias assentadas em terras rurais há 60 anos, sem o título de propriedade correspondente, prometido por JK na década de 1950.
O presidente Bolsonaro ignorou a lista tríplice ao nomear Aras para a PGR. O sr. está entre os procuradores que consideram isso uma ameaça à independência do MPF?
Não, isso não é uma ameaça à independência dos procuradores. Cada um de nós temos um ofício de atuação determinado por lei. Nem o Bolsonaro nem o STF nem o príncipe de Orleans e Bragança podem interferir nisso.