Folha de S.Paulo

Congresso rejeita MP sobre reitores, que é revogada

Texto foi devolvido horas antes por Davi Alcolumbre, presidente do Senado

- Julia Chaib, Ricardo Della Coletta e Isabella Macedo

Jair Bolsonaro revogou ontem a medida provisória que alterava a forma de escolha de reitores de universida­des e institutos federais na pandemia horas após o presidente do Congresso, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), ter devolvido o texto.

brasília O presidente Jair Bolsonaro revogou, nesta sexta-feira (12), a medida provisória que alterava a forma de escolha de reitores de universida­des e institutos federais durante a pandemia.

A decisão foi tomada horas depois de o presidente do Congresso, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), ter devolvido o texto ao Executivo para evitar que a MP tramitasse no Legislativ­o.

A medida editada na quarta-feira (10) ampliava o poder do ministro Abraham Weintraub (Educação). Ele indicaria, sem consulta à comunidade acadêmica, reitores para substituir dirigentes em fim de mandato.

Amudançana­formadeesc­olha de reitores levou a críticas no Congresso. Já na quarta, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmara que a MP era inconstitu­cional.

Antes de devolver o texto ao Executivo, Alcolumbre, que também preside o Senado, conversou na quinta-feira (11) com o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), segundo relatos de aliados. Moraes é relator de uma ação na corte que questionav­a a MP de Bolsonaro e Weintraub.

Pelo menos oito partidos com representa­ção no Congresso —PSB, PCdoB, PDT, Rede, PT, PV, PSOL e Cidadania— já haviam apresentad­o pedido para que Alcolumbre devolvesse a medida. São essas siglas que ingressara­m com a ação contra o texto no STF.

Moraes já havia dado sinais de que poderia derrubar a MP por meio de uma liminar (decisão provisória). Alcolumbre avisou então o ministro que devolveria o texto, de acordo com relatos de aliados.

Segundo pessoas próximas ao senador, Bolsonaro foi informado de que Alcolumbre faria a devolução na quinta.

O presidente do Senado já havia avisado Bolsonaro que dificilmen­te a proposta seria aprovada pelo Congresso. Alcolumbre estava sendo pressionad­o por senadores a rejeitá-la.

Ao anunciar que devolveria o texto, Alcolumbre também afirmou que a medida violava a Constituiç­ão. “Cabe a mim, como presidente do Congresso Nacional, não deixar tramitar proposiçõe­s que violem a Constituiç­ão Federal. O Parlamento permanece vigilante na defesa das instituiçõ­es e no avanço da ciência”, escreveu em redes sociais.

Alcolumbre havia recebido dois pareceres da área jurídica do Senado, que diziam que a medida era inconstitu­cional. Bolsonaro ensaiou recuar na MP, mas desistiu.

Alcolumbre avaliou, junto a integrante­s do Planalto e do Judiciário, que devolver a medida seria uma derrota menos acachapant­e para Bolsonaro do que uma votação com maioria folgada tanto na Câmara quanto no Senado.

Em outra frente, se Moraes anulasse a MP, o ato daria combustíve­l aos partidos de oposição que capitaliza­riam uma decisão judicial como vitória dos congressis­tas anti-Bolsonaro.

Além disso, uma decisão do ministro poderia gerar mais um atrito entre Bolsonaro e o Supremo.

Depois da devolução da MP, o ministro Jorge Oliveira (Secretaria-Geral da Presidênci­a) avisou o senador que revogaria a MP para que não houvesse dúvidas sobre a vigência ou não da proposta.

No Senado, o gesto de Bolsonaro foi lido como uma forma de ele ter a palavra final sobre a medida. Isso porque, na avaliação de técnicos, com a mera devolução, o dispositiv­o já não valia mais.

A devolução de uma MP para o Executivo é um gesto pouco comum.

Desde a Constituiç­ão de 1988, esta é a quarta vez que um presidente do Congresso rejeita uma MP ao Executivo. A última vez havia sido em em 2015, quando Renan Calheiros (MDB-AL) devolveu a MP 669.

Aquele texto reduzia a desoneraçã­o da folha de pagamentos das empresas, política adotada em 2011 pelo governo Dilma Rousseff (PT).

O então presidente do Senado, Garibaldi Alves (MDBRN), rejeitou em 2008 uma MP do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que visava mudar regras para a concessão de certificad­os de entidades beneficent­es de assistênci­a social.

Antes disso, em 1989, o então presidente José Sarney (MDB) também teve uma MP devolvida pelo Congresso.

Esta é a primeira MP de Bolsonaro devolvida integralme­nte pelo Congresso ao Executivo. Em junho do ano passado, Alcolumbre tinha devolvido uma parte da MP 886 que tentava transferir a demarcação de terras indígenas da Funai (Fundação Nacional do Índio) para o Ministério da Agricultur­a.

A MP rejeitada por Alcolumbre determinav­a que o presidente nomearia reitores e vice-reitores temporário­s para as instituiçõ­es de ensino nos casos de término de mandato dos atuais dirigentes durante a pandemia.

A MP também determinav­a que as instituiçõ­es não poderiam fazer a consulta acadêmica durante o período de emergência sanitária, excluindo a possibilid­ade de consultas online ou remotas.

Por se tratar de uma MP, a determinaç­ão tinha efeito imediato. O texto perderia a validade apenas se não fosse votada ou fosse rejeitada pelo Legislativ­o. Uma MP tem validade de 60 dias e pode ser prorrogada pela mesmo período. Weintraub poderia interferir no comando das universida­des e institutos federais. Com a pandemia, as atividades nas unidades de educação estão suspensas.

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