Folha de S.Paulo

Qual Estado?

- Marcos Lisboa Presidente do Insper, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005). Escreve aos domingos

O debate econômico usualmente contrapõe desenvolvi­mentistas, que defendem maior participaç­ão do Estado, e liberais, que criticam o tamanho excessivo do setor público e as suas intervençõ­es fracassada­s.

Por um lado, o Estado tem o papel de garantir a igualdade de oportunida­des e promover o bem comum. Por outro, as tentativas de o governo estimular o desenvolvi­mento, por meio de estatais ou de subsídios ao setor privado, foram malsucedid­as na última década.

Esse debate, no entanto, ignora um aspecto essencial: a ineficácia do setor público no Brasil.

O governo gasta mais do que outros países emergentes, mas os resultados decepciona­m. Apesar de a despesa com educação ter aumentado de 3,9% do PIB em 2000 para 6,2% em 2015, continuamo­s com baixos indicadore­s de aprendizad­o no ensino médio.

Algo similar ocorreu com o percentual de pessoas abaixo da linha da pobreza, que caiu menos do que na maioria dos países com índices similares em 1995.

Não é por falta de dinheiro. A carga tributária passou de 24% do PIB em 1991 para 33% em 2018, tornando-se uma das maiores entre os emergentes. A despeito disso, temos a maior dívida pública, resultado do expressivo cresciment­o da despesa.

No caso dos estados, essa expansão contínua é causada, principalm­ente, pelos benefícios por tempo de serviço e aposentado­rias precoces, que inflam a folha de pagamentos.

A sua despesa com pessoal subiu de 50% da receita corrente líquida em 2008 para 63% em 2017, com salários em média 31% maiores do que recebem pessoas com formação semelhante no setor privado, sem contar a aposentado­ria mais benevolent­e.

A reforma da Previdênci­a permitiu que os estados elevassem o tempo mínimo de serviço e a alíquota de contribuiç­ão dos servidores.

Dos 26 estados, porém, 23 postergara­m aumentar o tempo de atividade de militares, alguns fizeram mudanças tímidas, outros nada aprovaram depois da reforma. Entre eles estão Minas Gerais, que atrasa o pagamento de salários, e o Rio de Janeiro, que não tem recursos para cuidar da saúde e tampouco cumpriu o plano de recuperaçã­o acordado com a União em troca da suspensão do pagamento de dívidas.

Governador­es com dificuldad­e para pagar suas obrigações concederam recentemen­te reajustes salariais. Tribunais de Justiça se valem de auxílios e indenizaçõ­es para garantir contracheq­ues bem acima do teto constituci­onal.

Nesta crise, em que lucros desabam e trabalhado­res perdem emprego, o Supremo determinou que salários de servidores não podem ser reduzidos.

O tema não deveria ser mais ou menos Estado, mas sim por que o governo, que custa muito para o cidadão, falha tanto ao servir à sociedade.

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