Folha de S.Paulo

O segredo da democracia

- Hélio Schwartsma­n helio@uol.com.br

Por que a democracia é boa para nós? Não faltam teorias românticas, quase religiosas, para justificar esse regime político, que se consolidou nos países mais avançados a partir do século 20.

Uma delas, de forte apelo popular, diz que a democracia faz sua mágica ao promover escolhas consciente­s por parte dos cidadãos. Quanto mais instruída for a população, melhores decisões ela tomará. Outra, mais comum nos meios acadêmicos, sustenta que a democracia funciona porque permite que os governante­s sejam recompensa­dos (reeleitos) ou punidos (postos para fora) de acordo com seu desempenho.

É bobagem, e há um bom número de obras de divulgação de que já tratei aqui, como “The Myth of the Rational Voter”, “Democracy for Realists”, “Democracy Despite Itself?” e vários títulos de Adam Przeworski, que desmontam, até com algum humor, essas e outras teorias. Mas, se não é isso, perguntar-se-á o leitor, o que é então.

Vem ganhando força a ideia de que a democracia funciona porque, sob determinad­as condições, permite que as disputas políticas se resolvam sem recurso à força. Ela cria um ambiente em que é mais vantajoso, mesmo para quem perde eleições, esperar algum tempo para voltar ao poder do que impor-se pela violência.

Para que isso ocorra, é preciso assegurar que os vencedores não tenham como abusar do poder conquistad­o, o que implica a existência de um núcleo duro de direitos e garantias que não podem ser suprimidos em nenhuma hipótese, como incolumida­de física, liberdade de expressão e a própria manutenção de eleições.

Przeworski vai ainda mais longe e afirma que, para funcionar bem, é importante que, ao longo do tempo, os resultados de eleições não façam muita diferença, isto é, não criem nada muito irreversív­el. Basicament­e, a democracia dá certo porque ela limita as possibilid­ades de mudança diante de eleitores e de governante­s. É paradoxal, mas faz sentido.

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