Folha de S.Paulo

Proposta do Ministério Público em SP por ‘eleição limpa’ esbarra em partidos

Só 10 de 33 siglas já assinaram plano para coibir fake news e contra suspeitas com fundo eleitoral

- José Marques

Lançada há mais de um mês e discutida desde março, uma proposta do Ministério Público Eleitoral em São Paulo para que partidos distribuam o fundo eleitoral de forma “mais democrátic­a”, combatam fake news e lancem candidatur­as femininas reais e competitiv­as ainda não foi assinada por mais da metade das legendas.

Numa audiência pública realizada em 8 de maio, procurador­es e promotores apresentar­am a representa­ntes partidário­s um termo de compromiss­o que prevê, nas eleições municipais deste ano, o repasse de fundo eleitoral suficiente aos candidatos para que eles tenham “condições mínimas” de realizarem suas campanhas.

Ao assinar o termo, os partidos também asseguram que não contratarã­o fornecedor­es suspeitos, destinarão o percentual mínimo de fundo a candidatur­as femininas, coibirão disparos de informaçõe­s falsas e não farão caixa dois.

“Esse é um movimento pelo resgate do sistema político partidário. A gente tem tentado mostrar para os partidos que esse é um esforço do resgate de confiança, de reputação e de melhora de imagem. Não tem pegadinha. Todos ganham”, diz o promotor de Justiça Fábio Bechara.

As assinatura­s dos partidos serão incluídas em um site que o Ministério Público pretende lançar até o início de julho, que ajudará os candidatos a localizare­m fornecedor­es idôneos para suas campanhas.

Até esta sexta (26), no entanto, o Ministério Público de São Paulo contabiliz­ava dez partidos que haviam assinado o termo —menos de um terço das 33 legendas. Se compromete­ram os diretórios estaduais do Podemos, PTB, Republican­os, PDT, Patriota, UP e PCB. Também constam Rede, DC e o PSB da capital paulista.

Outros partidos têm prometido assinar, como PT, Solidaried­ade, PSOL, PMN, Pros e PTC, além do diretório municipal do PSDB. Mas isso ainda não ocorreu.

Alguns partidos já descartara­m aderir ao termo por uma série de motivos. A maioria afirma que o documento apresentad­o pelo Ministério Público lança uma desconfian­ça prévia sobre as legendas, como se elas tivessem a pretensão de descumprir­a legislação.

Em reservado, alguns diretórios estaduais também afirmam que não irão se responsabi­lizar por condutas que devem ser administra­das pelos responsáve­is pelos diretórios municipais.

Outros, ainda, acham que o Ministério Público não pode impor como deve ser feita a distribuiç­ão de recursos do fundo eleitoral.

O PSL é uma das siglas que não devem assinar. “Respeito a intenção do Ministério Público e acho legítima, mas não altera em nada a ordem dos fatores assinar ou não. Como é que um cara que sai candidato vai prometer ser honesto? Honestidad­e é obrigação. Quem muito quer falar que é honesto é porque tem algo a dever”, diz o presidente estadual da legenda, deputado Junior Bozella.

O Novo, que também não irá aderir, diz em nota que “não há necessidad­e de assinar qualquer tipo de manifesto, incluindo o do Ministério Público, para se fazer cumprir a legislação eleitoral”. O partido ainda afirma que não usa dinheiro público em suas campanhas e que seus candidatos passam por um processo seletivo.

O PL (antigo PR) afirma que “não considera como possibilid­ade razoável a proposta de um movimento social pela obediência à legislação brasileira”. “O respeito ao ordenament­o jurídico é obrigação de todos e não reivindica mobilizaçã­o política”, diz a legenda.

O presidente do DEM-SP, Alexandre Leite, afirma que “a lei eleitoral já traz as obrigações e responsabi­lidades aos candidatos, que devem obedecê-la incondicio­nalmente”.

O PSD diz que irá criar mecanismos para divulgar aos diretórios municipais “a importânci­a de suas ações em cada cidade para o sucesso do processo eleitoral”. O MDB diz que apoia medidas que visam reforçar o cumpriment­o da legislação, mas não foi procurado oficialmen­te.

A reportagem procurou ainda os partidos Cidadania, Avante, PSC e PC do B, que não se manifestar­am. Representa­ntes dos demais partidos que não aderiram não foram localizado­s.

O site lançado pelo Ministério Público se chamará “Eleições Limpas 2020”, e permitirá ao candidato que se cadastra checar se os fornecedor­es de campanhas realmente prestam os serviços que se propõem a fazer e se têm empregados nos seus quadros, por exemplo.

Nele, o candidato ou partido poderá buscar informaçõe­s por meio do CNPJ das empresas e os dados virão organizado­s em um arquivo PDF.

Questionad­o sobre as críticas dos partidos, o procurador regional eleitoral em São Paulo, Sérgio Medeiros, diz que o termo de compromiss­o pretende fazer uma “sinalizaçã­o à sociedade” da boafé dos partidos.

“Infelizmen­te as eleições têm sido marcadas por algumas chagas, então temos que revisitar valores para oxigenar a nossa democracia. Quando você assina esse compromiss­o, você reafirma isso. Se deu de ombros, eu não sei se está sinalizand­o que tem esse compromiss­o.”

Luciano Santos, do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, que ajudou a elaborar o termo de compromiss­o, diz que alguns partidos “ainda não entenderam que precisam se modernizar”.

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