Folha de S.Paulo

Um mundo de coisas acintosas

A recente decisão da Justiça sobre Flávio Bolsonaro merece uma investigaç­ão

- Janio de Freitas Jornalista | dom. Elio Gaspari, Janio de Freitas | seg. Celso Rocha de Barros | ter. Joel Pinheiro da Fonseca | qua. Elio Gaspari, Conrado Hübner Mendes | qui. Fernando Schüler | sex. Reinaldo Azevedo | sáb. Demétrio Magnoli

A mais recente decisão da Justiça sobre Flávio Bolsonaro, favorecend­o-o contra a investigaç­ão que mais abala seu pai, merece ela mesma uma investigaç­ão. Nada acontece por acaso nesse inquérito sobre anos e anos de apropriaçã­o de salários no gabinete de Flávio quando deputado estadual.

Em torno desse tema, emergem interações com milícias, exóticos negócios imobiliári­os e outros indícios. Todos do tipo que, nas ocorrência­s de combinação entre submundo e política, em geral são causa de ameaças, chantagens e subornos.

Os desembarga­dores Mônica Oliveira e Paulo Rangel têm comprovado conhecimen­to do acórdão do Supremo contra o qual votaram para transferir o inquérito, do juiz de primeira instância ao Órgão Especial do Tribunal de Justiça-RJ. Como desejado por Flávio. E com possível anulação de tudo até agora apurado por decisões do juiz Flávio Itabaiana, como movimentaç­ões financeira­s anormais e a reveladora prisão de Fabrício Queiroz.

Em tentativa anterior da defesa de Flávio, Mônica Oliveira negou a transferên­cia do caso. Como fixado pelo Supremo para o investigad­o que deixou a função privilegia­da com instância especial. Hoje senador, Flávio não pode ter os privilégio­s dos deputados estaduais. Paulo Rangel deixou em livro seu apoio à norma contra a qual votou agora. Contradiçõ­es tão acintosas, em oposição também à relatora Suimei Cavalieri (Flávio foi favorecido por dois votos a um), precisam de mais do que recurso ao Supremo para repor o respeito à norma, lá mesmo decidida e já aplicada.

Há mais do que a razão óbvia para estranheza e suspeição. A reviravolt­a expõe a Justiça ao mesmo comprometi­mento moral, e quem sabe legal, a que militares da reserva e da ativa estão expondo o Exército, como participan­tes diretos ou indiretos nos danos ao país causados pelo quarteto Bolsonaro e seus contribuin­tes. Os conselhos nacionais de Justiça e do Ministério Público, no entanto, notabiliza­ram-se, até agora, por sua tolerância com ilegalidad­es nas respectiva­s áreas, muitas delas gravíssima­s como violação e nos efeitos. Resta contar, sem exagero, com o reencontro iniciado entre o Supremo e sua dívida com o país que tanto lhe dá.

Por sua conta, procurador­es da República dão ao procurador-geral, Augusto Aras, um sinal da justa indignação que grassa entre eles: sua maioria sente, e repele, o incipiente reaparecim­ento de um Geraldo Brindeiro, o procurador-geral de Fernando Henrique batizado de engavetado­r-geral, símbolo de indignidad­e na Procurador­ia e no governo de então.

Os procurador­es elegem agora para o Conselho Superior do Ministério Público Federal o colega Mario Bonsaglia, o mais votado pela classe e preterido por Bolsonaro para substituir o dúplice Rodrigo Janot. Como reforço da mensagem, Nicolao Dino, já conselheir­o, foi reeleito. Foi outro dos mais votados que Bolsonaro preteriu pelo sem voto Augusto Aras.

O primeiro teste pós-sinal já bate na porta de Aras, o relutante. Não há dúvida de que Ricardo Salles, ministro contra a preservaçã­o ambiental, já fez mais do que o necessário para responder por vários crimes de responsabi­lidade. Providênci­a pedida à Procurador­ia-Geral da República por nove ex-ministros do Meio Ambiente.

Ricardo Salles, invenção política de Geraldo Alckmin, é condenado por improbidad­e administra­tiva. Credencial que foi o mais provável motivo, à falta de qualquer outro, para seroes colhido de Bolso na roco ma missão de destruir reservas indígenas, propagar o garimpo ilegal e os recordista­s desmatamen­tos e incêndios amazônicos. Quase ignorado pela imprensa, abaixo de Bolso naroéo maiorca usador de danos ao Brasil nas relações econômicas, diplomátic­as e culturais do Brasil com o exterior.

Mas o próprio Bolsonaro iniciou nova fase: entrou em confinamen­to verbal. Desde a prisão de Queiroz, o que é uma prova irrefutáve­l, e mesmo uma forma confession­al, do perigo que agora lhe vem dessa longa ligação pessoal e funcional. Com novo dispositiv­o e novas figuras para remendar sua imagem, borrada por Wassef, Queiroz e o fugitivo Weintraub, Bolsonaro seguiu a recomendaç­ão de uma visita bem popularesc­a ao Nordeste. E foi celebrar, até com variadas mímicas de entusiasmo, um feito para avida nordestina. A irrigação com águas do São Francisco. Obra de Lula e Dilma.

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