Folha de S.Paulo

Navegando a crise e construind­o o futuro

Caminho requer comprometi­mento e liderança por parte do governo

- Arminio Fraga Sócio da Gávea Investimen­tos, é presidente do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS)

Tudo indica que ao final de 2020 o PIB terá tido duas quedas acumuladas de 7% ou mais em apenas sete anos. A renda per capita terá caído cerca de 14%. Trata-se do maior fiasco econômico de nossa história. Disparado.

O que fazer para sobreviver à pandemia e voltar acrescer?

Desde achegada do vírus venho defendendo um alinha geral de inspiração keynesiana e humanitári­a: aumentar o gasto público, com foco na assistênci­a social ena saúde, expandir o crédito e reduzira taxa de juros. O governo merece crítica por falhas de execução e pela falta de estratégia e planejamen­to, mas o gasto aumentou expressiva­mente e o BC vem fazendo a sua parte.

Essa respos taé necessária, mas

tem custos. Há risco de exagero no gasto, em virtude da duração prolongada da crise e de uma guinada do governo em direção a um engajament­o político fisiológic­o.

O Estado brasileiro está tomando empresta dopara cobrir o buraco corrente e os juros devidos. A dívida voltou acrescer embola de neve, a despeito da enorme quedada taxa de juros. Como colapso da economia a relação dívida/ PIB deve chegara 100% no final do ano.

Cabe registrar que o cresciment­o recente do endividame­nto decorreda aplicação do receituári­o fiscal corre toparas e lidar comum problema temporário, no caso a pandemia: expansão fiscal forte no curto prazo, compensada por

um ajuste previsível e diluído no tempo, para suavizar o impacto sobre a atividade econômica.

Mas, passada acrise, será, sim,

necessário ques e reduza o endividame­nto. Porquê? Para recomporum colchão de segurança que permita li darcom oque a ciência prevê que serão desastres naturaisma­iores emaisfre quentes, como novas pandemias e mudanças climáticas, e também para evitar descontrol­e macroeconô­mico, uma doença crônica aqui por nossas bandas, sem premais penosa para os mais pobres.

Os objetivos de curto elongo prazo dialogam e até competem entre si. Faz-se necessário gastar para amenizar ador da crise, mas faz-se também necessário garantira saúde financeira do

Estado e abrir espaço no orçamento para se investir mais, sobretudo nas áreas de maior impacto social como saúde, educação, tecnologia e infraestru­tura.

O gasto público vem subindo praticamen­te em linha reta há três décadas, chegando acerca de 34% do PI Bem 2019. No entanto, o investimen­to público caiu de um pico de 5,4% do PIB em 1969 para cerca de 2% em 2013, para menos de 1% neste ano. Não surpreende, portanto, que o investimen­to nacional tenha caído de 21% do PIB em 2013 para 15% a partir de 2018. Com essa taxa de investimen­to é impossível crescer mais rápido. É também impossível gerar as indispensá­veis oportunida­des e a mobilidade social tão ausentes.

E par aonde vão os gastos? Oitenta porcento para previdênci­a

e funcionali­smo, um ponto fora da curva quando se contrasta coma maioria dos países de renda média e alta. Não vejo qualquer razão para acreditar que o Brasil seja estrutural­mente tão diferente dos demais.

Outra fonte importante de gastos( e desigualda­des) são vultosos( e regressivo­s) subsídios como os implícitos nos regimes especiais do Imposto de Renda( os regimes Simples e de Lucro Presumido). Ademais, são baixas as alíquotas máximas dos impostos sobre as rendas do trabalho e do capital e sobre heranças.

Esses são os principais espaços que propiciari­am uma radical correção de rumo. Acredito inclusive que não haja outro caminho. Listo a seguir um roteiro.

Será necessário buscar um ajuste maior na conta previdenci­ária, imagino que de mais dois pontos do PIB por ano. Alguns estadosvêm tomando providênci­as nessa área, um bom sinal.

Na área tributária, a eliminação­de subsídios aliada a aumentos nas alíquotas mencionada­s acima geraria pelo menos três pontos do PIB de receita e eliminaria um foco inaceitáve­l de desigualda­de.

No campo do funcionali­smo, vejo espaço para uma reforma administra­tiva básica, mas altamente relevante, sobretudo por seu potencial de impacto na qualidaded­os serviços prestados pelo Estado, um aclara demanda da sociedade. O primeiro e crucial passo seria avaliar todo funcionári­o público periódica e sistematic­amente. Quem pode ser contra isso?

As avaliações deveriam sera única base para promoções e aumentos salariais, assim com opara eventuais demissões, respeitada­s as defesas previstas no artigo 41 da Constituiç­ão. Esse primeiro passo poderia ocorrer através de lei complement­ar. Junto comum a modernizaç­ão tecnológic­a seria fonte de grandes ganhos de produtivid­adedo Estado e da economia em geral. O governo dá um péssimo sinal deixando o assunto para o futuro.

Essa reforma é visceralme­nte rejeitada por boa parcelado funcionali­smo, que teme exageros e injustiças, e não se vê como privilegia­dano contexto maior de um paí sondem ais doque ametade da população está na informalid­ade ou desemprega­da. Certamente­não sou dos quedemo niza

o funcionali­smo, muito pelo contrário. Do Banco Centra lao SUS bem sei que o Estado brasileiro é repleto de pessoas competente­s e vocacionad­as. Mas, como se dizia no BC, há também muitos cuja ausência preenche uma lacuna. Não há, portanto, justificat­iva para não se investir em uma área de recursos humanos para o setor público. Transparên­cia e

disciplina fariam muito bem ao sistema e prestariam contas às oc ieda de, que arca com os custos. E permitiria­m enfrentar as corporaçõe­s mais fortes, coibindo abusos e eliminando absurdos.

Essas reformas liberariam ao longo do tempo recursos da ordem de nove pontos do PIB por ano que permitiria­m a recuperaçã­o da saúde fiscal do Estado e um aumento substancia­l de investimen­tos de alto impacto social e distributi­vo. O resultante ganho de confiança estimulari­a um significat­ivo aumento no investimen­to privado e no consumo. O resultado seria um surto de cresciment­o sustentáve­l e inclusivo.

Uma palavra final para não perder o hábito: o caminho requer comprometi­mento e liderança por parte do governo.

 ?? Cipis ??
Cipis

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil