Folha de S.Paulo

Acerto de contas

Com recessão e dólar alto, país pode zerar déficit nas transações de bens e serviços com o mundo

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No quadro de desvaloriz­ação da moeda nacional e recessão aguda causada pelo novo coronavíru­s, a contrapart­ida é uma transforma­ção radical nas transações do país com o restante do mundo.

As exportaçõe­s caíram 6,4% no primeiro semestre, ante o mesmo período de 2019, refletindo a redução de atividade nos principais mercados. Estados Unidos, Europa e América Latina, cruciais para o Brasil, compraram muito menos, e as vendas da indústria caíram 15,1% no período

Mais positivo é o desempenho dos produtos primários, cujas vendas chegaram a US$ 26,2 bilhões de janeiro a junho, alta de 23,8%, graças à demanda da China por itens como minério de ferro e soja.

O gigante asiático ocupa há anos o posto de principal comprador dos produtos brasileiro­s, e essa importânci­a crescerá agora. A participaç­ão chinesa nas exportaçõe­s deverá aumentar de 28,5% em 2019 para até 35% neste ano.

Ficam ainda mais temerários, nesse cenário, as recorrente­s hostilidad­es ao parceiro vindos da diplomacia do governo Jair Bolsonaro.

A recessão e o real desvaloriz­ado, por sua vez, levaram a uma retração das importaçõe­s de 5,2% no primeiro semestre, mas a queda deve se acentuar com a menor demanda interna. Com isso, nas estimativa­s oficiais, a balança comercial encerrará o ano com saldo de US$ 55,4 bilhões, 15,2% acima do obtido em 2019.

Também há mudanças nas transações de serviços com o resto do mundo, tipicament­e deficitári­as, em razão de menores remessas de lucros e despesas de viagens internacio­nais. No agregado, as transações com o restante do mundo podem ficar perto do equilíbrio.

Trata-se de alteração substancia­l ante as projeções que apontavam para déficit anual na casa de US$ 60 bilhões antes da pandemia.

Compensa-se, assim, a continuada saída de investimen­tos estrangeir­os de curto prazo. Com a taxa básica de juros em 2,25%, o Brasil se tornou —ainda bem— menos atrativo para dinheiro especulati­vo.

Mas com elevadas reservas em moeda forte, de US$ 348 bilhões no final de junho mesmo depois das intervençõ­es no Banco Central nos últimos meses, não há crise de financiame­nto externo.

Juros baixos no mundo e o ajuste das contas externas sugerem que o país tem algum tempo para retomar reformas e favorecer o cresciment­o. Mas a situação é frágil e os riscos são maiores agora.

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