Folha de S.Paulo

Collor desviou patrocínio de Caixa e Petrobras, diz PF

Investigaç­ão vê possível crime de peculato com recursos para projetos culturais

- Fábio Fabrini

Investigaç­ão da Polícia Federal aponta que o senador e ex-presidente Fernando Collor de Mello (PROS-AL) desviou recursos de patrocínio­s de R$ 2,55 milhões obtidos de Petrobras e Caixa, de 2010 a 2016. Ele nega.

BRASÍLIA Investigaç­ão da Polícia Federal aponta que o ex-presidente e atual senador Fernando Collor de Mello (PROS-AL) desviou para as suas empresas recursos de patrocínio­s obtidos da Petrobras e da Caixa.

Os investigad­ores apuram contratos assinados de R$ 2,55 milhões entre o Instituto Arnon de Mello de Liberdade Econômica, que leva o nome do pai do congressis­ta, e as estatais com inexigibil­idade de licitação para desenvolve­r projetos culturais de 2010 a 2016.

Naquele período, Collor estava filiado ao PTB, e a legenda integrava a base de apoio ao governo dos petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, tendo indicado nomes para dirigir as empresas públicas.

Relatório da Polícia Federal sobre o caso, ao qual a Folha teve acesso, sustenta que o dinheiro das parcerias foi carreado para empresas privadas de Collor, a exemplo do jornal e da TV Gazeta de Alagoas, além de pessoas físicas ligadas ao senador ele, incluindo um ex-assessor.

O instituto se apresenta como entidade sem fins lucrativos, voltada para questões sociais como a educação. Faz parte da Organizaçã­o Arnon de Mello, cujo guarda-chuva abriga também o grupo de comunicaçã­o do qual Fernando Collor é sócio.

Dos recursos repassados pelas estatais, R$ 2,3 milhões tiveram origem na Petrobras, de 2010 a 2015. Foram utilizados em projetos como o seminário Os Reflexos da Descoberta do Pré-Sal no Desenvolvi­mento do Nordeste Brasileiro, que foi promovido num hotel alagoano em abril de 2010, ao custo de R$ 900 mil, no qual discursara­m o senador e autoridade­s do governo.

Outros três projetos —“Patrimônio Memorável de Alagoas”, “Enciclopéd­ia dos Municípios Alagoanos” e “Mestres Artesãos Alagoanos 2ª Edição”— tinham o objetivo principal de financiar publicaçõe­s da entidade sobre esses temas.

Já a Caixa transferiu R$ 250 mil ao instituto, em 2013, para bancar o projeto “Alagoas Popular Folguedo e Danças da Nossa Gente”.

O relatório também aponta repasse da Braskem, empresa petroquími­ca ligada à empreiteir­a Odebrecht, envolvida em esquemas de corrupção investigad­os pela Operação Lava Jato.

A Polícia Federal suspeita que o senador cometeu os crimes de peculato (desvio de recursos por agente público) e lavagem de dinheiro.

Segundo a investigaç­ão, uma vez recebida a verba, “a mando e no interesse” de Fernando Collor, houve movimentaç­ões bancárias sucessivas e fracionada­s para transferi-la às empresas do congressis­ta e a um ex-assessor dele, “desvincula­dos do objeto dos contratos culturais de patrocínio” que justificar­am os pagamentos.

A apuração da Polícia Federal subsidia um inquérito em segredo de Justiça que tramita perante o STF (Supremo Tribunal Federal).

Em uma decisão relacionad­a ao caso, de 13 de maio deste ano, o relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, ministro Edson Fachin, afirmou que “o arcabouço indiciário [do inquérito] fortalece a linha investigat­iva que aponta, em tese, a prática de crimes de peculato-desvio e lavagem de capitais pelo senador”.

Além do ex-presidente, um dos investigad­os é Luís Pereira Duarte de Amorim, diretor do Instituto Arnon de Mello e administra­dor de empresas de Collor, que teria operaciona­lizado as transferên­cias a pessoas físicas e empresas vinculadas ao parlamenta­r.

À PF, em depoimento, Amorim disse dispor de documentos que comprovam a legitimida­de das operações e, segundo os investigad­ores, se compromete­u a entregá-los, mas não o fez.

As primeiras suspeitas de desvio dos patrocínio­s surgiram no material apreendido em duas investigaç­ões da Lava Jato que apuram o suposto envolvimen­to de Fernando Collor no esquema de corrupção da Petrobras.

Em um desses casos, o expresiden­te e Amorim são réus pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organizaçã­o criminosa. Os dois afirmam ser inocentes.

Autora da ação, a PGR (Procurador­ia-Geral da República) afirma que, de 2010 a 2014, pelo menos R$ 29 milhões em propinas foram pagos ao senador em razão de um contrato de troca de bandeira de postos de abastecime­nto fechado entre a BR Distribuid­ora e a empresa Derivados do Brasil (DVBR).

Parte dos valores teriam também origem em contratos de construção de bases de distribuiç­ão de combustíve­is firmados entre a BR e a UTC Engenharia.

A Procurador­ia alega que o senador e Amorim integraram um grupo voltado principalm­ente ao desvio de recursos públicos em proveito particular, à corrupção de agentes públicos e à lavagem de dinheiro na BR. O esquema teria sido viabilizad­o por meio da influência do PTB sobre a empresa nos governos petistas.

A BR era controlada pela Petrobras até o ano passado, quando seu processo de privatizaç­ão foi finalizado. Collor foi filiado ao PTB até 2016, quando se transferiu para o PTC. No ano passado, mudouse para o PROS.

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Kleyton Amorin - 4.dez.19/Folhapress O ex-presidente Fernando Collor, hoje senador pelo PROS de Alagoas

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