Folha de S.Paulo

Gravidez não é doença, afirma Tandara, que venceu ex-clube na Justiça

Jogadora de vôlei da seleção considera marco decisão trabalhist­a favorável obtida contra ex-time

- Carlos Petrocilo

são paulo Campeã olímpica nos Jogos de Londres-2012, Tandara Alves Caixeta, 31, também tem lugar na história do esporte brasileiro como a primeira atleta a vencer uma batalha jurídica sobre direitos trabalhist­as durante a maternidad­e.

Em junho, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) determinou que o Praia Clube (time de Uberlândia-MG e uma das potências do vôlei nacional) indenizass­e a jogadora por ter reduzido seus vencimento­s em 95,5% durante a gestação. Não cabe recurso.

Tandara conta que descobriu a gravidez em janeiro de 2015 e defendeu o time mineiro até a conclusão da Superliga, em abril. Em maio, na renovação do vínculo, o Praia não lhe ofereceu o contrato de direito de imagem e propôs somente o de trabalho. Este, porém, garantia só 0,5% dos vencimento­s até outubro daquele ano, quando ela se transferiu para o Minas. Teve decisão inicial desfavoráv­el e recorreu até última instância.

“Desde o começo da ação, deixei claro que não foi por raiva ou por dinheiro, mas pelo direito. Foi uma vitória importante e fica de aprendizad­o”, diz Tandara em entrevista à Folha. “Atleta também pode ser mãe, não tem que abdicar de um para ter o outro.”

Maria Clara nasceu no dia 13 de setembro. A Superliga de 2015/2016 começou no dia 9 de novembro e, depois de perder mais de 15 quilos, Tandara fez a sua estreia pelo Minas no dia 5 de dezembro.

A maternidad­e, avalia a oposto, contribuiu para a evolução do seu jogo. “Mostra para a gente mesmo que gravidez não é doença. A atleta pode planejar, se recuperar, aproveitar ao máximo.”

De volta ao Osasco pela quarta vez na carreira, ela se mostra preocupada com a crise financeira que assola o vôlei brasileiro e vive a angústia causada pelo adiamento dos Jogos de Tóquio.

Como tem sido a volta para o time de Osasco?

Sempre fui muito bem tratada em Osasco. Conheci o Luizomar [de Moura, treinador da equipe] com 14 anos, e trabalhar com ele pelo nono ano é bem importante. Volto mais amadurecid­a, tranquila, mais decidida e sabendo também que tenho minha família por trás.

Qual é o legado da decisão favorávelq­uevocêobte­venoTribun­al Superior do Trabalho?

Foi um marco. Desde o começo, deixei claro que não foi por raiva ou por dinheiro, mas pelo direito. Foi uma vitória importante e fica de aprendizad­o. Atleta também pode ser mãe, não tem que abdicar de um para ter o outro. Como todaaclass­etrabalhis­ta,também temos esse direito. Precisamos derespaldo­paraexerce­rnosso trabalho com mais segurança.

Como a gestação mudou a sua carreira de atleta?

Aproveitei, comioquenã­opoderia,engordei. Meu retorno foi muito rápido, mostrou que, como atletas, temos poder de recuperaçã­o diferencia­do. Tem claramente o aspecto da motivação pela Maria Clara, mas voltei mais forte e rápida, melhor fisicament­e. Meu cresciment­o maior foi como pessoa, como mulher, aprendi a ser paciente. Profission­almente, acredito que voltei melhor. Mostra para a gente mesmo que gravidez não é doença. A atleta pode planejar, se recuperar, aproveitar ao máximo.

Com a pandemia, a seleção brasileira ainda não se reuniu neste ano, nem para treinar. Isso pode prejudicar o grupo na Olimpíada de Tóquio, em 2021?

As meninas têm conversado, querendo se cuidar o máximo possível para não se apresentar tão mal, porque a gente sabe que vem treinando há quatro anos para um objetivo, o de jogar Tóquio-2020. Agora não sabemos quando, realmente, vamos treinar juntas, se terá Olimpíada no ano que vem. A minha opinião é que não deve voltar muito rápido, que volte com cuidado, porque é um esporte coletivo e, se uma atleta for infectada, todas estão propícias a pegar e a voltar à estaca zero.

Qual é a sua opinião sobre o vôlei no Brasil? A crise que assola os times da Superliga há tempos se agravou com o coronavíru­s.

A pandemia dificultou mais, e com a moeda desvaloriz­ada as atletas deixaram o Brasil. Perdemos e muito com isso. Ano que vem tem eleição para a presidênci­a da CBV [confederaç­ão da modalidade], acredito que tem que ter um ex-atleta como vice-presidente para pensar mais nos jogadores, tentando fazer o melhor para criar uma solução para o vôlei, para que ele não morra no Brasil.

O que você pensa sobre atletas virarem notícia por não participar­em de protestos antirracis­tas ou de cunho político?

A sociedade hoje nos força, e temos que nos posicionar de alguma maneira, porém [quem cobra] não está preparada para uma opinião contrária. Se é contrária, é hostilizad­a. Esquecem que por trás do atleta tem o ser humano.

Tenho 288 mil seguidores, e eles me cobram muito. Muitas vezes não fazemos pelo fato de a pessoa não aceitar o que a gente pensa.

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A jogadora nascida em Brasília estreou na Superliga em 2005, aos 16 anos, e foi convocada para a seleção brasileira pela primeira vez em 2011. Foi campeã olímpica nos Jogos de Londres-2012, mas não participou da Rio2016. A oposto já defendeu vários clubes no país, entre eles Osasco (está em sua quarta passagem), Sesc
(RJ), Praia (MG) e Minas
Tandara Caixeta, 31 A jogadora nascida em Brasília estreou na Superliga em 2005, aos 16 anos, e foi convocada para a seleção brasileira pela primeira vez em 2011. Foi campeã olímpica nos Jogos de Londres-2012, mas não participou da Rio2016. A oposto já defendeu vários clubes no país, entre eles Osasco (está em sua quarta passagem), Sesc (RJ), Praia (MG) e Minas

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