Folha de S.Paulo

Golpes usando compra online e redes sociais crescem na pandemia

Criminosos então se passam por vítima e pedem dinheiro a seus contatos

- Thiago Amâncio

são paulo Com viagem marcada, a bancária Mayra Carvalho, 29, publicou, em março, quando o país começou a se fechar contra o novo coronavíru­s, um comentário na página do Instagram da agência de viagens online Decolar questionan­do se conseguiri­a remarcar uma passagem aérea.

“Um perfil veio falar comigo como se fosse o original”, diz ela. Era, na verdade, uma conta falsa, passando-se pelo suporte da empresa.

“Eles me abordaram de maneira bem tranquila, falando que queriam me ajudar, que me mandariam um código por SMS e eu precisaria informá-lo para validar o atendiment­o. Queria resolver isso rápido e passei. Na hora, meu WhatsApp caiu”, conta ela.

“Aí eles usaram toda a história que eu tinha contado, que tinha um filho pequeno, para pedir dinheiro no WhatsApp. Depois você fica se perguntand­o como caiu nessa. Eles pegam justamente no momento de fragilidad­e”, afirma.

Relatos como esse se tornaram ainda mais comuns durante a pandemia: com o aumento do comércio online durante a quarentena, cresceu também o número de reclamaçõe­s nas redes sociais, e os golpistas viram um prato cheio.

Fingindo ser o suporte de uma empresa, eles abordam vítimas e afirmam que podem resolver o problema. O código que enviam por SMS, na verdade, serve para validar o WhatsApp em outro aparelho. Usando a conta da vítima, começam a pedir dinheiro a seus contatos se passando por ela.

Foi o que aconteceu com a professora Renata Guerra, depois de reclamar na página do Instagram do aplicativo Rappi. Com a conta clonada, o golpista pediu dinheiro a amigos de Guerra, afirmando que precisaria pagar uma taxa do mestrado, mas que devolveria no dia seguinte. Uma amiga perdeu R$ 1.550.

Ela conseguiu recuperar a conta só após 12 horas. Nesse meio tempo, alertou que fora vítima do golpe nas redes sociais —três amigos disseram que quase acreditara­m.

O advogado Renato Pontes, 29, recebeu, no dia 27, mensagens pedindo dinheiro e fez “o que qualquer pessoa sensata faria: golpe no golpista!”, em suas palavras. “Fui técnico de informátic­a, trabalhei com segurança digital, tenho um pouco de conhecimen­to.”

“O golpista começou a pedir dinheiro, falar que precisava de ajuda. É uma coisa até comum no meu grupo, mas me chamou a atenção a forma como ele escreveu. Esse meu amigo é professor, e a mensagem não separava o vocativo com vírgula”, conta. O colega havia caído no golpe de uma falsa conta de suporte do Magazine Luiza no Instagram.

Pontes fingiu que caía no golpe e disse que, para que pudesse transferir os R$ 980 pedidos, precisaria do CPF e do nome completo do dono da conta corrente para a qual mandaria o dinheiro. Para pressionar o golpista, disse a ele que precisava desses dados com urgência.

Com o CPF, o advogado conseguiu o nome, endereço, telefone e outros detalhes da dona da conta-corrente. Ele mandou para o celular original da mulher a mesma mensagem que recebeu pedindo dinheiro, e foi bloqueado na hora.

Na conta falsa do Instagram, o amigo que foi vítima mandou o CPF e o endereço da casa da dona da conta. A resposta foi instantâne­a: “Certo, eu já saí do seu Whats. Deixa a laranja de boa”.

Não satisfeito, Pontes ligou para a mãe da dona da conta-corrente para avisar do golpe que sua filha estava aplicando na internet.

“Ela ficou muito nervosa, negou”. No meio das conversas, os criminosos ainda deixaram escapar que estavam falando do Centro de Detenção Provisória de Pinheiros, em São Paulo. Pontes registrou boletins de ocorrência.

Já a arquiteta Paula Mouzinho, 36, perdeu R$ 3.000 em janeiro para um golpista que se passou por sua amiga.

“Recebi uma mensagem de uma amiga que disse que precisava pagar um fornecedor com urgência. Ela trabalha com turismo, organiza eventos em que as coisas precisam ser resolvidas para ontem. A história parecia plausível. Na hora que eu transferi, por uma palavra que o golpista usou, pensei: não é ela”, conta.

Mouzinho foi direto a uma agência bancária relatar o golpe, mas os criminosos já tinham levado o dinheiro.

Victoria Siqueira, 34, coordena as redes sociais de uma grande marca de cosméticos e diz que já pediu para suspender 22 perfis falsos desde abril, quando foi surpreendi­da por uma cliente relatando o golpe.

Para ela, isso tem acontecido porque, com a pandemia, as plataforma­s de comércio na internet tiveram uma sobrecarga de pedidos e, muitas vezes sem conseguir dar conta de atender a demanda, viram aumentar também o número de reclamaçõe­s.

Quando identifica um perfil falso, ela alerta ao Facebook (dono do Instagram), que costuma retira-lo do ar em até dois dias.

O WhatsApp, por sua vez afirma que alerta seus usuários para não compartilh­arem o código de autenticaç­ão recebido por mensagem.

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Reprodução Perfil falso tenta se passar por suporte de loja e pede nome completo e número de celular com DDD para clonar WhatsApp de cliente

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