Folha de S.Paulo

Pelo saneamento

A melhor versão da nova lei para o setor é a atual, com veto de Bolsonaro a artigo que atrasa reforma

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Em defesa da atual versão da nova lei para o setor.

Não resta dúvida de que o presidente Jair Bolsonaro agiu de modo politicame­nte desastrado ao vetar, sem diálogo prévio com o Congresso, 11 dispositiv­os do novo marco do saneamento básico.

Afinal, a legislação aprovada em julho foi obra de uma ampla articulaçã­o parlamenta­r, incluindo partidos governista­s e independen­tes, para superar resistênci­as corporativ­istas e ideológica­s à abertura do setor a empresas privadas.

Na derradeira votação, o Senado aprovou o projeto de lei por 65 votos a 13, e apenas três vetos presidenci­ais eram esperados.

A decisão de maior impacto de Bolsonaro foi derrubar o artigo que permitia às prefeitura­s renovar, por 30 anos e sem licitação, os contratos hoje vigentes com empresas estatais estaduais para a prestação dos serviços de água e esgoto.

O trecho atendia a pressões de governador­es, que temem a desvaloriz­ação das companhias estaduais de saneamento, e ajudara a vencer resistênci­as de deputados e senadores. Não por acaso, lideranças do Congresso mobilizara­mse pela derrubada do veto.

Esse seria um desfecho ruim para a celeuma, porém —se levado em conta o interesse da sociedade.

O grande mérito da nova lei, que dependerá de execução correta, é estabelece­r parâmetros de qualidade e metas de expansão do saneamento, além de concorrênc­ia para que se apontem as empresas mais aptas a prestar os serviços.

O artigo vetado claramente destoava do objetivo maior de superar os atrasos vergonhoso­s do país —conforme os dados mais atualizado­s do IBGE, 49,2% dos domicílios brasileiro­s não tinham acesso a rede de esgoto em 2017.

A recusa em submeter as estatais à competição, que também motivou a oposição dos partidos de esquerda ao novo marco, equivale a uma admissão da ineficiênc­ia do modelo atual, que não merece ser preservado por questiúncu­las da conveniênc­ia provincian­a.

Uma nova construção política se faz desejável, portanto, para que se garanta a melhor versão da lei. O governo, felizmente, parece disposto ao diálogo. Já se aventa negociar, por exemplo, um projeto que reduza para 20 anos o prazo para a prorrogaçã­o dos atuais contratos.

Tal hipótese, cogitada no Palácio do Planalto, pode ser encarada como um ponto de partida para um entendimen­to, mas Executivo e Legislativ­o precisam buscar um arranjo mais ambicioso.

O melhor é manter o texto em vigor, dando início o quanto antes às providênci­as necessária­s para que se materializ­em de fato os bons propósitos da nova legislação.

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