Folha de S.Paulo

Rambo sem faca

- Alvaro Costa e Silva

rio de janeiro Dois bicudos que hoje não se beijam, Jair Bolsonaro e Wilson Witzel têm mais coisas em comum do que imaginam. Ambos adotaram o militarism­o como estratégia para alcançar o poder, mas suas trajetória­s nas Forças Armadas estão longe de servir como modelo. De Bolsonaro, ficou o registro definitivo do general Ernesto Geisel: “Mau militar”.

Na revista Piauí de julho, o repórter Allan de Abreu, ao traçar o perfil do governador do Rio, revela o ponto alto de sua passagem pela Marinha. De apelido Rambo, pelo hábito de sempre levar uma faca presa na panturrilh­a, o tenente Witzel, liderando um grupo de fuzileiros, viuse numa encruzilha­da durante um exercício na zona da mata de Minas Gerais: “Vocês todos vão para aquele lado, e eu vou sozinho por esse aqui”, decidiu. Só reapareceu dali a dois dias, assustado, envergonha­do, coberto de lama e morto de fome: “Escorregue­i num barranco e me perdi”.

Depois de escorregar e enlamearse com denúncias de desvio de dinheiro na Saúde, num esquema que segundo os investigad­ores já existia antes da Covid-19, mas que se intensific­ou durante a pandemia, o “naval” —como o chamava Bolsonaro no início do namoro político— está de novo perdido, enfrentand­o um processo de impeachmen­t.

Perdido e sozinho na selva escura. Será que ele ainda tem a faca do Rambo? Quase todos os que estiveram ao seu lado na surpreende­nte vitória eleitoral —dois meses antes do primeiro turno, o desconheci­do candidato tinha 1% das intenções de voto— o abandonara­m. O empresário Mário Peixoto, dono de contratos suspeitos com o governo estadual desde a época da quadrilha do Cabral, está preso. Bolsonaro usa a máquina para derrubá-lo. A Igreja Universal e a milícia, antigos aliados, hoje lhe mostram a língua.

O seu vice, Cláudio Castro, é um novo Temer: trabalha em silêncio. Ex-cantor gospel, já foi mordido pela mosca azul.

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