Entenda o atrito entre a força-tarefa da Lava Jato e a PGR
O que motivou o atrito entre a força-tarefa de Curitiba e o procuradorgeral Augusto Aras?
O estopim foi a visita a Curitiba entre 23 e 25 de junho da subprocuradora Lindôra Araújo, uma das auxiliares mais próximas de Aras e coordenadora do grupo de trabalho da Lava Jato na PGR. A força-tarefa no Paraná entendeu que Lindôra na ocasião realizou manobra ilegal para copiar bancos de dados sigilosos e decidiu fazer uma reclamação na corregedoria do Ministério Público Federal. Na sequência, integrantes do grupo de trabalho em Brasília pediram para sair dessa equipe por discordância com a subprocuradora. Segundo a força-tarefa, não houve comunicação de qual seria a pauta da reunião. Os procuradores afirmaram que “não foi formalizado nenhum ofício solicitando informações ou diligências, ou informando procedimento correlato, ou mesmo o propósito e o objetivo do encontro”.
Além disso, disse ainda a Lava-Jato em Curitiba, não se soube se ida da subprocuradora a Curitiba foi de natureza “administrativa, correicional ou finalística”.
O que diz a PGR sobre o assunto?
Nega que tenha ocorrido qualquer iniciativa ilegal. Em nota divulgada em 1º de julho, a Procuradoria-Geral listou decisões da Justiça de
2015 que mencionavam o compartilhamento de dados da operação com outras esferas do Ministério Público. Também disse que, em maio deste ano, Aras formalizou em ofício “o procedimento de compartilhamento de todos os dados com a PGR, por meio da Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise”.
Qual foi a resposta da força-tarefa?
Disse que as decisões da Justiça não autorizam o “acesso indiscriminado” às informações guardadas, que incluem documentos apreendidos, relatórios de inteligência e informações fiscais. Afirma que é preciso haver uma indicação de provas ou um objeto específico para que o pedido se concretize.
“Jamais qualquer órgão público buscou compartilhamento ou acesso indiscriminado, sem indicar o objeto ou a razão de fato”, diz nota da equipe divulgada na quarta. Também afirmou que o ofício de maio de Aras já era “objeto de tratativas”.
O que decidiu o Supremo?
O presidente da corte, ministro Dias Toffoli, determinou no dia 9 de julho que a equipe da Lava Jato enviasse à PGR todos os dados de investigações já colhidos pela operação pelas forças-tarefas de Curitiba, do Rio e de São Paulo. Ao expedir a ordem, o ministro afirmou que a postura da Lava Jato viola o princípio da unidade do Ministério Público. No mesmo pedido ao Supremo, a PGR havia afirmado que há “elementos de informação em trânsito” na Lava Jato relativos aos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado,
Davi Alcolumbre (DEMAP), “cujos nomes foram artificialmente reduzidos em tabelas” anexadas a uma das denúncias da operação no Paraná.
Para Toffoli, é necessário impedir essa investigação
“no seu nascedouro”.
Nesta segunda-feira
(3), outro ministro do Supremo, Edson Fachin, decidiu revogar a ordem do presidente da corte.
Toffoli havia despachado a respeito do caso somente porque estava à frente do plantão no recesso do Judiciário, agora encerrado. Fachin, que relata casos da Lava Jato na corte, considerou que o princípio da unidade do Ministério Público, alegado pela PGR e reforçado por Toffoli, não permite o intercâmbio de provas entre os membros da carreira.
Essa decisão não é definitiva —pode ser revista por um conjunto de ministros.
A PGR afirma que houve medidas ilegais da forçatarefa?
Em comunicado no dia 29 de junho, a Procuradoria-Geral disse que a mesma sindicância que tratará da visita da subprocuradora a Curitiba vai averiguar um outro ponto. “Também servirá para que seja esclarecida a existência de equipamentos utilizados para gravação de chamadas telefônicas recebidas por integrantes da equipe da força-tarefa, incluindo membros e servidores.” Segundo a PGR, o objetivo é apurar “a regularidade de sua utilização, bem como os cuidados e cautela necessários para o manuseio desse tipo de equipamento pelos respectivos responsáveis”. A equipe de Curitiba diz que todas as interceptações telefônicas realizadas na operação foram autorizadas por decisão judicial e “efetivadas exclusivamente pela Polícia Federal”.
Quais os outros fatores de atrito entre os procuradores no Paraná e a PGR?
Além do compartilhamento de dados, outro ponto de divergência com Curitiba é a proposta de criação de um órgão na estrutura da Procuradoria-Geral batizada de Unac (Unidade Nacional de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado), ao qual as forças-tarefas de casos de corrupção trabalhariam vinculadas. O objetivo é promover racionalização dos trabalhos, “a economia de recursos, a acumulação contínua e a preservação da experiência e do conhecimento adquiridos, a unificação de rotinas, base de dados, sistemas”.
Quais as críticas a esse novo modelo?
Procuradores falam em risco de excessiva centralização de poder. Outro ponto seria a concentração de informações de inteligência em um órgão. O coordenador dessa unidade seria escolhido por Aras, a partir de uma lista tríplice elaborada pelo conselho do Ministério Público.
O pano de fundo é a desconfiança com que procuradores em geral veem Aras. Ele assumiu o comando da Procuradoria por indicação direta de Jair Bolsonaro, sem ter disputado eleição interna da categoria.