O que é ESG e como ele está se tornando pré-requisito no mercado
são paulo As melhores práticas ambientais, sociais e de governança (ou ESG, como são conhecidas pelo mercado) já são um assunto antigo das salas de reuniões de gestores e empresários, mas foi só há pouco mais de um ano que o tema virou parte do cotidiano no ambiente corporativo e de investimentos do Brasil.
O termo se refere à avaliação de como companhias e investimentos impactam o meio ambiente e a sociedade, e como esse impacto pode conduzir a riscos de negócio ou de investimentos.
Segundo o co-fundador e gerente de portfólio da Fama Investimentos, Fabio Alperowitch, parte do atraso das discussões sobre o tema no Brasil está relacionado à polarização das discussões sobre direitos humanos e o meio ambiente.
“Durante muitos anos o mercado financeiro não tratou desses assuntos apropriadamente, muito porque acabaram sendo ideologizadas.
Isso nos deixou em um campo razoavelmente virgem de debates aprofundados e com um mercado que acaba adotando práticas apenas superficiais. O ESG é mais complexo do que apenas trazer um produto sustentável, é como a empresa se porta”, disse o executivo, que também é conselheiro da WWF Brasil e do GRI.
Na prática, a constatação de que o ESG começa a fazer parte do “novo normal” das companhias ganhou um apelo mais forte em janeiro.
Naquele mês, Larry Fink, presidente da BlackRock —maior gestora de investimentos do mundo, com US$ 7 trilhões em ativos (cerca de R$ 36,5 trilhões)— anunciou em sua carta anual ao mercado que deixaria de investir em setores intensivos em carbono, como a indústria de carvão, realocando recursos para segmentos mais sustentáveis.
Segundo Carlos Takahashi, presidente da BlackRock Brasil, a primeira polêmica que o ESG trouxe aos investimentos foi sobre até que ponto as companhias conseguiriam gerar retornos compatíveis às necessidades de seus investidores sem aderir às práticas ambientais, sociais e de governança. Foi só de uns tempos para cá que houve a migração dessa discussão para uma perspectiva de risco.
“Os riscos antecedem os retornos, porque no final das contas são eles que têm o impacto mais direto nos investimentos. Outro ponto que é importante ressaltar é que as vozes voltadas ao assunto deixaram de ser isoladas para criar uma conversa mais conectada entre todos o ecossistema do mundo de investimentos, que abrange o mercado financeiro, o mercado corporativo e a sociedade. Isso também traz relevância ao assunto”, disse.
Na prática, isso significa que a demanda dos chamados stakeholders —as partes interessadas de um negócio, que são impactadas pelas ações da companhia, como acionistas, clientes, fornecedores, entre outros— é por posicionamentos mais assertivos do lado das empresas.
A onda de protestos contra o racismo que aconteceu nos EUA no segundo trimestre deste ano, é o exemplo prático de como “escolher um lado da força” pode cativar ou enfurecer stakeholders: quando Facebook e Twitter demoraram a tomar atitudes para lidar com conteúdo de ódio em suas plataformas, grandes empresas se uniram a uma campanha de boicote à publicidade nessas companhias.
“Estamos em uma transição geracional. E o poder que essa nova geração tem como consumidora é muito importante, principalmente quando solicitam que as empresas sejam transparentes e se posicionem. Quando elas não se manifestam, são consideradas coniventes”, diz Alperowitch.
No ambiente doméstico, o exemplo mais recente foi a carta assinada por 40 empresários enviada ao vice-presidente, Hamilton Mourão, pedindo o combate inflexível e abrangente ao desmatamento ilegal da Amazônia e demais biomas. No documento, as empresas demonstraram preocupação com a percepção negativa da imagem do Brasil no exterior, devido às questões socioambientais.
“A política, os governos e a agenda macroeconômica e socioeconômica estão inextricavelmente entrelaçados ao ESG. Muitos governos estão percebendo que seus sistemas e negócios financeiros serão cortados dos fluxos globais de capital se não construírem e investirem em suas economias de maneira mais sustentável”, disse a vice-presidente sênior de estratégia de engajamento em ESG da Moody’s Corporation, Martina Macpherson.
Segundo a executiva, a crise do coronavírus também acabou ampliando a urgência da necessidade de maiores investimentos globais em desenvolvimento sustentável, principalmente em inovação, tecnologia e infraestrutura de assistência social e de saúde —o que também acaba destacando o papel que os governo e as parcerias público-privadas podem ter nesse contexto.
Ela afirma que muitos governos já começam a trazer estruturas de regulamentação para os relatórios de ESG e que já existe um maior foco em inteligência artificial e inovações voltadas ao assunto, de maneira a melhor identificar e avaliar os problemas de ESG.
No sistema financeiro, além do discurso voltado à adoção de melhores práticas, o ESG também já começa a fazer parte da análise de risco de créditos entre os bancos.
Segundo o gerente de relações com investidores do Banco do Brasil, Daniel Alvez Maria, cerca de 30% do crédito cedido pelo banco é considerado “verde”, voltado para boas práticas ambientais e sociais.
“São créditos para agricultura de baixo carbono, por exemplo, ou operações que destinamos para eficiência energética”, afirmou.