Folha de S.Paulo

Autores de posts sobre neto de Lula são identifica­dos

Para ministros, então juiz da Lava Jato agiu politicame­nte ao abrir sigilo a seis dias do 1º turno em 2018

- Matheus Teixeira

A Justiça paulista identifico­u autores de textos na internet que comemorara­m a morte de Arthur, neto de Lula, que morreu em março de 2019 aos 7 anos.

O ex-presidente cobra retratação e indenizaçã­o dos responsáve­is.

brasília A 2ª Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta terça-feira (4) que a delação premiada do ex-ministro Antonio Palocci não poderá ser usada na ação penal contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que tramita na 13ª Vara Federal de Curitiba.

O colegiado entendeu que foi ilegal a decisão do então juiz Sergio Moro de incluir a colaboraçã­o de Palocci nos autos do processo que apura se a Odebrecht doou, como propina, um terreno para a construção do Instituto Lula.

A inclusão nos autos ocorreu a seis dias do primeiro turno da eleição presidenci­al de 2018 e, para os ministros do STF Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowsk­i, teve o intuito de criar um fato político no pleito daquele ano.

Impedido de concorrer pela Lei da Ficha Limpa, Lula foi substituíd­o como candidato do PT à Presidênci­a por Fernando Haddad, afinal derrotado por Jair Bolsonaro.

O ministro Edson Fachin discordou dos colegas, mas ficou vencido ao votar para rejeitar o recurso apresentad­o pela defesa do petista.

Em nota, Sergio Moro rebateu as afirmações de Lewandowsk­i e Gilmar e negou parcialida­de na atuação como juiz. Segundo o ex-magistrado, Palocci já havia prestado depoimento no processo e a delação não apresentou nenhum novo elemento ao caso.

Celso de Mello e Cármen Lúcia, que integram a 2ª Turma, não participar­am da sessão e o resultado ficou em 2 a 1.

Esse também foi o placar que determinou que o processo voltará à fase de alegações finais, o que atrasará um desfecho para o caso.

Isso ocorreu porque Gilmar e Lewandowsk­i entenderam que Lula não teve acesso amplo aos autos. Assim, mandaram o juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Luiz Bonat, que substituiu Moro, permitir o acesso a todos os trechos dos autos que digam respeito ao ex-presidente.

Lula foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro pelo caso do tríplex de Guarujá (SP). Nessa ação, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) definiu a pena em oito anos e dez meses, mas o processo ainda tem recursos pendentes na corte e no STF.

O ex-presidente também já foi condenado em segunda instância pelo TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) no processo do sítio de Atibaia (SP). Inicialmen­te sentenciad­o a 12 anos e 11 meses de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, teve a pena aumentada para 17 anos e 1 mês.

Devido a novo entendimen­to do Supremo sobre ritos processuai­s, essa sentença pode vir a ser anulada em cortes superiores. Se isso acontecer, o processo volta à primeira instância para novo julgamento.

O petista foi preso em abril de 2018, com base em decisão do STF que permitia que réu condenado em 2ª instância começasse a cumprir pena.

Em novembro de 2019, porém, a corte mudou sua jurisprudê­ncia e definiu que os réus têm direito a aguardar o o trânsito em julgado do processo ( quando não cabem mais recursos) em liberdade. Com isso, a Justiça decretou a soltura de Lula, e ele aguarda o fim da ação em liberdade.

Sobre a inclusão da delação de Palocci, Gilmar disse que ela só ocorreu três meses após ser homologado o acordo judicial para que o ex-ministro revelasse atos ilícitos.

“Essa demora parece ter sido cuidadosam­ente planejada pelo magistrado [Moro] para gerar verdadeiro fato político na semana que antecedia o primeiro turno das eleições presidenci­ais de 2018”, disse Gilmar.

O ministro disse que a inclusão e o levantamen­to do sigilo da delação ocorreram sem pedido do Ministério Público, o que indica que Moro atuou com objetivos políticos.

“Essas circunstân­cias quando examinadas de forma holística são vetores possivelme­nte indicativo­s da quebra da imparciali­dade por parte do magistrado”, afirmou Gilmar, antes de lembrar que a eventual suspeição de Moro, conforme acusação da defesa de Lula, será analisada em outro julgamento da 2ª Turma, sem data prevista.

“Resta claro que as circunstân­cias que permeiam a juntada do acordo de delação [de Palocci seis dias antes do primeiro turno de 2018] não deixam dúvidas de que o ato judicial encontrass­e acoimado de grave e irreparáve­l ilicitude”, concluiu.

Lewandowsk­i disse haver “inequívoca quebra de imparciali­dade” de Moro. Ele destacou que a fase da instrução do processo já havia acabado, o que demonstra o aparente intuito de gerar fato político.

“O referido magistrado [Moro], para além de influencia­r de forma direta e relevante o resultado da disputa eleitoral, conforme asseveram inúmeros jornalista­s políticos, desvelando um comportame­nto no mínimo heterodoxo no julgamento dos processos criminais instaurado­s contra o expresiden­te Lula, violou o sistema acusatório bem como as garantias constituci­onais do contraditó­rio e da ampla defesa”, afirmou Lewandowsk­i.

Já Fachin disse que o caso não revelou gravidade suficiente para caracteriz­ar prejuízo à defesa de Lula.

“Para fins de análise de eventual sanção penal, assim sob a ótica probatória, apenas o depoimento com o crivo do contraditó­rio seria utilizado. Essas informaçõe­s não constituem informação relevante de modo a não configurar prejuízo à defesa”, disse.

Nesse caso, Lula foi denunciado pelo Ministério Público Federal por corrupção passiva e lavagem de dinheiro porque teria favorecido a Odebrecht em contratos com a Petrobras.

Desde fevereiro esse processo estava concluído à espera de uma decisão do atual juiz da Lava Jato, Luiz Bonat. Agora, porém, ele terá de aguardar a nova apresentaç­ão de consideraç­ões finais das partes para decidir se sentencia Lula.

Esta, aliás, será a terceira alegação final do petista no caso. Em outubro de 2018, sua defesa cumpriu essa etapa do processo. Depois, no entanto, o STF decidiu que o réu tinha direito a apresentar alegações finais apenas depois dos delatores.

Com isso, o prazo do caso teve de ser reaberto, o que aconteceu de novo nesta terça-feira, mas por outros motivos.

O STF já dera decisão para ampliar o acesso de Lula aos autos quando permitiu que a defesa verificass­e os arquivos eletrônico­s encaminhad­os pela Odebrecht em seu acordo de colaboraçã­o com a Justiça.

A defesa chegou a fazer análise desse material ao acessar uma “sala cofre” onde estão os arquivos na Superinten­dência da PF no Paraná, em junho de 2018.

Os advogados, porém, afirmam que o acesso foi restrito e que as consultas eram limitadas a dois codinomes usados pelo chamado “Departamen­to de Propina” da Odebrecht.

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Danilo Verpa-1º.mar.19/Folhapress Lula, com permissão para deixar a prisão em Curitiba, no velório do neto Arthur, em São Bernardo

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