Folha de S.Paulo

Corregedor­ia mira SP em apuração sobre forças-tarefas

Sindicânci­a avalia se elas seguiram regras ao distribuir inquéritos e delações

- Marcelo Rocha e José Marques

brasília e são paulo A Corregedor­ia-Geral do MPF (Ministério Público Federal) determinou a abertura de sindicânci­a para apurar se houve irregulari­dade na distribuiç­ão de investigaç­ões conduzidas pelos integrante­s das forças-tarefas da Lava Jato.

De acordo com a portaria assinada na quinta-feira (30) pela corregedor­a-geral do MPF, Elizeta Ramos, a apuração pretende averiguar se as forças-tarefas cumpriram regras internas para a escolha dos responsáve­is pela condução de inquéritos e outros procedimen­tos, como delações premiadas.

Embora a Corregedor­ia mencione na portaria da sindicânci­a “forças-tarefas da Operação Lava Jato”, a PGR (Procurador­ia-Geral da República) afirmou à Folha que a apuração tem foco na atuação em São Paulo.

A cúpula da PGR levanta suspeitas sobre a regularida­de nesta distribuiç­ão.

A Lava Jato tem três frentes de trabalho na primeira instância da Justiça Federal: no Paraná, no Rio de Janeiro e em São Paulo. E um braço na PGR, encarregad­o de tocar o caso nos tribunais superiores.

No braço paulista, há investigaç­ões ou ações já apresentad­as sobre grandes obras tocadas no estado em gestões de José Serra e Geraldo Alckmin, ambos do PSDB, como o Rodoanel e o Metrô, e sobre familiares dos ex-presidente­s Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Michel Temer (MDB).

Desde o começo deste ano, no entanto, alguns procurador­es do próprio Ministério Público Federal em São Paulo passaram a questionar internamen­te a distribuiç­ão das investigaç­ões da operação aos colegas.

Em março, o procurador Thiago Lemos de Andrade acionou o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) sob o argumento de que as investigaç­ões ligadas à operação não estavam sendo distribuíd­as da forma correta no órgão.

Ele questionou o motivo de materiais desmembrad­os da Lava Jato em outras unidades ou instâncias do Ministério Público Federal serem remetidos diretament­e à forçataref­a, em vez de sorteados.

Na prática, o que acontece é que procurador­es da Lava Jato analisam se esses materiais têm conexão com as investigaç­ões que conduzem. Se não houver, liberam para sorteio.

Em maio, depois do ofício de Andrade, a procurador­a Viviane de Oliveira Martinez também reclamou do tamanho do acervo da força-tarefa à PGR. Ela assumiu o setor onde ocorrem as investigaç­ões da Lava Jato de São Paulo, o 5º Ofício Criminal.

“A FTLJ-SP [força-tarefa da Lava Jato], se continuar vinculada ao 5º Ofício Criminal da PRSP [Procurador­ia da República], fará com que o acervo cresça em progressão geométrica e, consideran­do-se que ele também cumula o recebiment­o normal da distribuiç­ão da PRSP, daqui a pouco minha atuação estará inviabiliz­ada”, disse a procurador­a.

“Estou me responsabi­lizando pessoalmen­te pela atuação de mais oito colegas, cujo ritmo de trabalho é difícil acompanhar, dificuldad­e essa que é agravada pelo nível de sigilo que se impõe à atuação deles”, afirmou Viviane. Na ocasião, ela pediu providênci­as à PGR.

A força-tarefa da Lava Jato tem apontado que suas atribuiçõe­s foram designadas pela própria PGR, que segue “estritos termos” de uma portaria da Procurador­ia e do Código de Processo Penal e que não há irregulari­dades em sua atuação.

Antes da instauraçã­o dessa nova sindicânci­a, a Corregedor­ia já havia solicitado informaçõe­s da força-tarefa, que foram encaminhad­as tanto pelo grupo como pelo procurador-chefe do Ministério Público Federal em São Paulo.

Em relação à decisão da Corregedor­ia na última quinta, a apuração terá prazo de 30 dias, podendo ser prorrogada. Foi designada a subprocura­dora-geral Raquel Branquinho para conduzir os trabalhos.

Uma das auxiliares mais próximas de Raquel Dodge, antecessor­a de Augusto Aras no comando da PGR, Branquinho coordenou o grupo de trabalho da Lava Jato na gestão Dodge e retornou no início deste ano a convite de Aras.

A Corregedor­ia tem outra sindicânci­a relacionad­a à Lava Jato em curso, aberta após integrante­s da força-tarefa em Curitiba acusarem a subprocura­dora Lindora Araújo de “manobra ilegal” ao tentar ter acesso a dados armazenado­s pela operação.

A apuração determinad­a pela corregedor­a Elizeta Ramos ocorre após o vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques, enviar à Corregedor­ia-Geral do MPF pedido de investigaç­ão interna para rastrear a existência de 50 mil procedimen­tos considerad­os invisíveis pela atual gestão da PGR.

São, segundo Jacques, investigaç­ões, negociaçõe­s de delação premiada e outros procedimen­tos cadastrado­s no Único, o sistema eletrônico do MPF, mas que apresentar­am restrições de visibilida­de.

Em portaria publicada em julho, Aras acabou com a figura do controlado­r, uma ferramenta do Único que possibilit­ava restringir a um número reduzido de pessoas o acesso a informaçõe­s confidenci­ais —por exemplo, delações premiadas em negociação.

De acordo com o procurador-geral, o controlado­r tinha poder para barrar no sistema “autoridade­s que, por força legal e normativa, devem poder acessar qualquer expediente dentro de sua esfera de atribuição, quando houver justificat­iva legal”.

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Agência Senado O procurador-geral da República, Augusto Aras

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