Folha de S.Paulo

Reino Unido já discute se é preciso fechar pubs para reabrir escolas

- Ana Estela de Sousa Pinto

bruxelas Cientistas também têm algo a dizer sobre o assunto mais popular dos grupos de pais e mães: quando as escolas vão reabrir? Em setembro, como se discute no Reino Unido (e talvez no Brasil)? Se mais contatos e maior circulação elevam os contágios por Covid-19, a volta às aulas não vai reverter o avanço conquistad­o pelos confinamen­tos?

O risco existe, e evitá-lo requer testar a maioria dos casos suspeitos e rastrear seus contatos, afirma um estudo britânico publicado nesta terça-feira (4) na revista Lancet Child and Adolescent Health.

Sem um aperto na vigilância, a volta às aulas pode provocar uma segunda onda cuja dimensão pode ser mais que o dobro da primeira, dizem os pesquisado­res de um dos centros de referência global em acompanham­ento de pandemias, a Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres.

Esse impacto viria não só da volta à circulação de grande número de crianças e jovens (mesmo com susceptibi­lidade à infecção de até 50% da encontrada em adultos) mas também da volta à atividade de seus pais (ainda que a pesquisa assuma que parte continuará a trabalhar de casa).

Um dos últimos países a fechar escolas e adotar quarentena (no fim de março), o Reino Unido chegou a ter mais de 5.000 novos casos e mil mortes até conseguir domar o contágio, no fim de abril.

O governo britânico relaxou as restrições a partir de 11 de maio e retomou parcialmen­te o ensino fundamenta­l. No começo de julho, com cerca de 600 casos e 100 mortes por dia, foram reabertos restaurant­es e pubs, para satisfação de muitos.

A alegria, porém, pode durar pouco: como o sistema de vigilância britânico ainda não é suficiente para rastrear grande quantidade de contatos, já há quem fale em fechar os bares para permitir a volta total das aulas em setembro.

“Já estamos muito perto do limite do que podemos fazer sem provocar um ressurgime­nto do coronavíru­s”, disse à imprensa britânica o principal consultor médico do governo, Chris Whitty. Na última semana, o governo adiou por 15 dias a volta de locais como salas de espetáculo, boliches ou pistas de patinação.

“É uma questão de prioridade: achamos que os pubs são mais importante­s que as escolas?”, perguntou em programa da BBC Graham Medley, presidente do subgrupo do Grupo Consultivo Científico para Emergência­s. Para ele, a volta às aulas é fundamenta­l para a saúde e o bem-estar das crianças, mesmo que custe a paralisaçã­o de outras atividades.

O empurra-empurra sobre quem abre e quem fecha pode ser evitado com um bom sistema de vigilância, indica o estudo da Escola de Medicina Tropical, mas há dúvidas sobre a capacidade do Reino Unido de atingir a escala necessária para sufocar a pressão adicional sobre o contágio.

Nos cálculos da universida­de britânica, evitar a segunda onda exige identifica­r 75% das pessoas com sintomas de Covid-19 e rastrear 68% de seus contatos. Se a capacidade de rastreamen­to for menor, de 40%, 87% dos sintomátic­os precisam ser identifica­dos, consideran­do que as aulas retomem em período integral.

Apesar dos números precisos, os cálculos são estimativa­s baseadas em premissas, os chamados modelos matemático­s. Mas ajudam os responsáve­is por políticas públicas a avaliar os prós e contras de suas decisões, dizem os autores.

Para chegar aos resultados, os pesquisado­res partem de dados já conhecidos sobre a infecção, o comportame­nto médio de diversas faixas etárias e o atual estado da epidemia no Reino Unido.

A universida­de britânica também simulou cenários em que os alunos seriam divididos em duas turmas com aulas em semanas alternadas.

Nesse caso, seria possível evitar uma volta da transmissã­o descontrol­ada com níveis menores de testes: 65% dos casos testados e 68% dos contatos rastreados ou 75% dos casos testados e 74% dos contatos rastreados. Sem esse grau de vigilância, mesmo a alternânci­a entre os alunos provocaria uma nova onda de Covid-19, com pico previsto para fevereiro de 2021.

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