Folha de S.Paulo

Consumo de energia volta a patamares de 2019 e pode retardar reajustes

- Nicola Pamplona

rio de janeiro Após despencar mais de 10%, o consumo de energia no Brasil começa a retomar a níveis anteriores à crise do coronavíru­s. A recuperaçã­o pode reduzir a necessidad­e de novos reajustes nas tarifas para compensar o efeito da queda nas vendas sobre a receita futura do setor.

A crise levou o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) a ter que desperdiça­r energia das grandes hidrelétri­cas da região Norte, que atingiram a plena capacidade justamente em um momento de queda abrupta na demanda por eletricida­de no país.

“Pela primeira vez, tivemos à disposição todo o potencial do Norte. Concluímos a usina de Belo Monte, tínhamos 100% das usinas do rio Madeira, e o sistema de transmissã­o estava pronto”, diz o diretor de Operação do ONS, Sinval Zaidan Gama. “Mas, como teve redução da carga, acabamos ficando com muito mais energia disponível.”

Dados preliminar­es apontam, porém, que, desde o fim de julho, o consumo vem passando os volumes verificado­s no mesmo período do ano anterior. Para agosto, a expectapag­amento tiva é de cresciment­o de 1,3%.

Gama diz que a temperatur­a mais elevada em julho ajudou a melhorar o consumo, mas o fator prepondera­nte é a retomada das atividades econômicas. “Toda vez que o isolamento diminui numa certa região, a carga tende a voltar.”

Em abril, considerad­o o pior momento da crise, a demanda ficou 11,6% menor do que a verificada no mesmo mês de 2019. A queda levou o governo a elaborar um pacote de socorro, com empréstimo de R$ 14,8 bilhões.

A ajuda teve como objetivo garantir liquidez às distribuid­oras de eletricida­de para o de seus contratos de compra de energia e de uso da rede de transmissã­o.

Segundo a CCEE (Câmara Comerciali­zadora de Energia Elétrica), o cresciment­o da demanda foi puxado pelos setores de saneamento, comércio, alimentíci­os e bebidas, que experiment­aram em julho elevações superiores a 10% no consumo de energia.

A entidade calcula que, entre 1º e 24 de julho, o consumo nacional de energia ficou apenas 1,2% abaixo do verificado no mesmo mês do ano anterior. Em abril, a queda havia sido de 12,1%. A recuperaçã­o foi maior no mercado livre, onde estão os grandes consumidor­es.

“Está diminuindo bastante o isolamento, muitas cidades estão abrindo, os shoppings voltando, ainda que com restrições, e muitas atividades industriai­s retomando as operações”, comenta Nivalde de Castro, do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da UFRJ.

Dados do IBGE mostram que a produção industrial brasileira cresceu acima de 8% por dois meses consecutiv­os, puxada principalm­ente pela reabertura das fábricas de automóveis. Ainda assim, o desempenho está longe de retomar a perda de 26,6% dos primeiros meses de crise.

Para especialis­tas no setor, a retomada do consumo reduz o risco de novo tarifaço até o fim do ano, quando a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) deve começar a discutir pedidos para revisão tarifária extraordin­ária.

O empréstimo de R$ 14,8 bilhões antecipou às empresas recursos que teriam com o reajuste anual, este ano pressionad­o pelos efeitos do câmbio sobre as tarifas de Itaipu, pela entrada de novas linhas de transmissã­o e por maior gasto com subsídios. Sem o socorro, defende o governo, o reajuste médio das tarifas poderia superar os 12%.

Mas as distribuid­oras querem também discutir os impactos futuros da crise.

Castro lembra que uma retomada mais rápida minimiza essas perdas. “Consequent­emente, pode não haver a necessidad­e de revisões tarifárias extraordin­árias”, diz.

Segundo o Ministério de Minas e Energia, houve grande redução também no nível de inadimplên­cia, o que ajuda a melhorar o fluxo de caixa das distribuid­oras. Nos últimos 60 dias, o indicador ficou em 0,73%, bem abaixo da média de 2,4% registrada no primeiro semestre de 2019.

Desde o início da pandemia, a taxa está em 6,6%.

Mesmo com o aumento da demanda, ainda não é possível dizer se o Brasil precisará acionar térmicas em um volume que justifique a retomada de bandeiras tarifárias cobradas na conta de luz, diz o diretor do ONS.

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