Selic cai a 2% ao ano, e país consolida juro real negativo
Copom indica espaço para diminuições residuais, após cortar a taxa básica em 0,25 ponto percentual
O Copom, do Banco Central, decidiu cortar ontem a taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual, a 2% ao ano. Com isso, o Brasil se consolidou entre as economias com taxa de juros real negativa.
Trata-se da nona redução seguida na Selic, que renova as mínimas históricas desde 2017.
brasília e são paulo O Copom (Comitê de Política Monetária), do Banco Central, decidiu cortar a taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual, para 2% ao ano, nesta quartafeira (5). Com isso, o Brasil se consolida entre os países com taxa de juros real negativa.
De acordo com cálculos da gestora Infinity Asset Management, antes da reunião, o juro real no Brasil estava em -0,40% ao ano, considerando a taxa básica de 2,25% ao ano vigente até esta quarta-feira, patamar próximo ao de países com Índia, Portugal e Suécia e maior que o de China, Itália e Espanha, que estão em torno de -0,30% ao ano. O corte de juros para 2% ao ano coloca a taxa em -0,71% no Brasil.
Em um ranking com 40 economias, o Brasil passou da 20ª para a 26ª posição (quanto maior, mais negativo o juro real, superando também Nova Zelândia (-0,50%) e Austrália (-0,57%). Na média desses países, o juro está negativo em -0,37%.
Uma aplicação financeira que renda 100% da Selic atual durante os próximos 12 meses terá resultado abaixo da inflação esperada pelo mercado financeiro para o mesmo período.
O BC indicou que a Selic deve continuar no mesmo patamar nas próximas reuniões, mas deixou espaço para ajustes, indicando que pode haver novos cortes em nível ainda menor.
“Devido a questões prudenciais e de estabilidade financeira, o espaço remanescente para utilização da política monetária, se houver, deve ser pequeno”, trouxe o comunicado.
“Consequentemente, eventuais ajustes futuros no atual grau de estímulo ocorreriam com gradualismo adicional e dependerão da percepção sobre a trajetória fiscal, assim como de novas informações que alterem a atual avaliação do Copom sobre a inflação prospectiva”, completou.
O colegiado descartou cortes mais incisivos, “a menos que as expectativas de inflação, assim como as projeções de inflação de seu cenário básico, estejam suficientemente próximas da meta de inflação para o horizonte relevante de política monetária”.
“O corte foi de acordo com o esperado pelo mercado e não causou surpresa. De certa forma, para as próximas reuniões, entendo que o pequeno ajuste seria um residual também na casa de 0,25 ponto”, ressaltou Gustavo Bertotti, economista da Messem Investimento.
“O Copom alegou que novos cortes, eventuais, serão pequenos, e a decisão pela alteração será muito mais criteriosa”, disse Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos.
Para ele a Selic ficará neste patamar até o fim de 2021. “A perspectiva é que o fundo do poço passou e que o ambiente de incerteza deverá se reduzir, mitigando novos sobressaltos econômicos, principalmente no que tange a revisões das projeções de inflação de 2021 para baixo.”
Esta é a nona redução seguida na Selic, que renova as mínimas históricas desde dezembro de 2017.
Na decisão passada, em junho, quando a autoridade monetária reduziu a Selic em 0,75 ponto, o comunicado sinalizou que o comitê poderia fazer “ajustes residuais” nas reuniões seguintes.
Assim, a indicação foi de manutenção da taxa, mas o BC deixou a porta aberta para um novo corte, só que de menor magnitude.
No comunicado, o Copom ressaltou que, no cenário externo, a pandemia do novo coronavírus continua provocando a maior retração global desde a Grande Depressão.
“Nesse contexto, apesar de alguns sinais promissores de retomada da atividade nas principais economias e de alguma moderação na volatilidade dos ativos financeiros, o ambiente para as economias emergentes segue desafiador”, disse.
Segundo o colegiado, em relação à atividade econômica brasileira, indicadores recentes sugerem uma recuperação parcial. “Os setores mais diretamente afetados pelo distanciamento social permanecem deprimidos, apesar da recomposição da renda gerada pelos programas de governo.”,
Além disso, o comunicado ponderou sobre a incerteza em relação ao ritmo de crescimento da economia, “sobretudo para o período a partir do final deste ano, concomitantemente ao esperado arrefecimento dos efeitos dos auxílios emergenciais”.
Apenas 12 países estão com juro positivo, entre eles, Argentina (2,53%) e México (1,20%). Na outra ponta, se destacam Estados Unidos e Reino Unido, com taxa próxima a -2,50%.
Os juros reais negativos fazem parte de um movimento internacional de corte nas taxas básicas de vários países diante de um cenário de fraco crescimento e inflação baixa em praticamente todo o mundo, algo que já se via mesmo antes da pandemia.
“O movimento global de políticas de afrouxamento monetário e de alívio quantitativo ganhou força, com o aumento expressivo no número de BCs efetuando cortes de juros”, diz a Infinity Asset Management.
Segundo a gestora, 75% dos países do ranking optaram por manter os juros em suas últimas reuniões de política monetária, 22,5% fizeram cortes e 2,5% (somente um) pela elevação. Os percentuais são praticamente os mesmos quando se considera um grupo de 167 países.
Mesmo antes do novo corte, analistas já consideravam que a taxa real de juros brasileira (descontada a inflação) estava negativa.
“O juro real já estava negativo. Existem dois métodos de cálculo, com a inflação passada e com a expectativa. Para investimentos, é mais relevante a previsão, então a gente já estaria em patamar negativo antes do novo corte”, diz Sanchez, da Ativa Investimentos.
“A [inflação] passada influencia o consumidor na tomada de decisão, o investidor reage mais ao que virá”, explicou o economista.
Para o cálculo do juro real, analistas utilizam a previsão de inflação para 2021, que está em 3%, segundo o relatório Focus do BC.
“A potência da política monetária acontece em defasagem. Elas já são exclusivamente voltadas para o ano de 2021. O foco do BC é a inflação do ano que vem”, disse.
Segundo Sanchez, a taxa real negativa estimula a economia. “Aquele investidor que postergaria uma compra um a abertura de um negócio para lucrar com o dinheiro acaba antecipando a decisão”, pontuou.
Caso a expectativa de inflação utilizada seja a de 2020, a taxa de juro real ainda estaria positiva em 0,36%.
“Mas, se considerarmos a acumulada dos últimos 12 meses, seria negativo em 0,12%”, disse Gustavo Bertotti, da Messem Investimentos. são paulo Para que o dinheiro não perca valor, é preciso buscar investimentos que rendam acima dos 2,97% de inflação esperada pelo mercado para os próximos 12 meses.
Nesse cálculo, a rentabilidade teria que superar os 156% do CDI (Certificado de Depósito Interbancário), taxa que acompanha a Selic.
Segundo levantamento do buscador de investimentos Yubb, atualmente os produtos de renda fixa com maior rentabilidade são CDBs de bancos pequenos no mercado secundário, que chegam a render 155% do CDI.
Eles são títulos de dívidas de BMG, Fibra, NBC Bank e PAN, que estão sendo revendidos pela corretora após o credor primário fazer o resgate antes do vencimento.
Como são instituições financeiras de menor porte, o risco de calote é maior, por isso o retorno mais expressivo. Apesar de o CDB ter cobertura do FGC (Fundo Garantidor de Créditos), a garantia é limitada a R$ 250 mil por CPF e por instituição financeira.
O CDB, porém, tem incidência do Imposto de Renda, o que reduz a rentabilidade líquida. A poupança, mesmo isenta, tem retorno abaixo da inflação por render só 70% da Selic ao ano para depósitos posteriores a maio de 2012, ou seja 1,4%. O rendimento da poupança antiga é de 0,5% ao mês.
Já os títulos do Tesouro prefixados e atrelados ao IPCA, inflação oficial, têm rendimentos mais expressivos, que variam de 3,9% a 6,7% ao ano.
Segundo especialistas, para proteger o capital da inflação, é preciso diversificar a carteira, combinando ativos de renda fixa e variável, com foco no longo prazo.
“O investidor conservador vai ter de tomar mais risco, até na renda fixa, com título do governo mais longo, CDB de banco menor ou debênture”, diz Rodrigo Moliterno, diretor de renda variável da Veedha.
Para identificar o seu perfil de risco (agressivo, arrojado, moderado ou conservador), é preciso fazer testes disponíveis em corretoras e bancos, que levam em conta patrimônio, idade, objetivo, tolerância ao risco, entre outros.
De acordo com Moliterno, o investimento em imóveis também ganha atratividade com o juro baixo. “Comprar ou alugar um apartamento vai ser mais vantajoso do que deixar o dinheiro no banco por menos de 2% ao ano.”
“O investidor não precisa necessariamente ser mais arrojado, mas pensar mais a longo prazo. É preciso combinar o perfil de risco com o objetivo do investimento para encontrar a melhor composição da carteira”, afirma Jayme Carvalho, planejador financeiro CFP pela Planejar.
Ele também recomenda atenção a taxas cobradas pelo banco ou corretora em cada produto, que podem reduzir os rendimentos. “As pessoas precisam parar de pensar em investimentos como algo para ficar ricas, e sim algo para preservar patrimônio.”
Antes de investir, é preciso garantir a reserva emergencial de, no mínimo, seis meses de gastos mensais alocados em renda fixa que possa ser resgatado no mesmo dia sem perda de valor, como o Tesouro Selic, fundos DI e CDBs.
“O espaço remanescente para utilização da política monetária [redução nas taxas de juros], se houver, deve ser pequeno Copom em comunicado, nesta quarta Para manter patrimônio, será preciso arriscar mais FOLHAINVEST Júlia Moura