Folha de S.Paulo

Gigante britânico do varejo ataca carne do Brasil

Tesco quer que governo obrigue empresas a rastrear cadeia de suprimento­s para garantir que não causam dano ambiental

- Ana Estela de Sousa Pinto

bruxelas Sob pressão para que deixe de vender produtos ligados ao desmatamen­to da Amazônia e do cerrado, a maior rede de supermerca­dos do Reino Unido quer que o governo britânico obrigue as empresas a rastrear suas cadeias de suprimento­s para garantir que elas não provocam danos.

“Fazer queimadas para limpar a terra para plantio ou pastagem está destruindo habitats preciosos como a floresta tropical brasileira. É por isso que não compramos carne do Brasil”, afirmou Dave Lewis, principal executivo da Tesco, que tem 27% do mercado varejista britânico e faturou £ 56,5 bilhões (R$ 389,71 bilhões)no último ano (2019/2020).

A declaração veio em resposta a uma campanha da ONG ambiental Greenpeace para que a Tesco suspenda as vendas de produtos da Moy Park (produtora de frango sediada na Irlanda) e da Tulip (produtora de carne sediada na Inglaterra), empresas controlada­s pela brasileira JBS.

Nos dois casos, os animais são alimentado­s com soja, cuja produção também é apontada pela Greenpeace como ligada a desmatamen­to. O escritório da JBS em Londres afirmou que a empresa “está comprometi­da com o fim do desmatamen­to em toda a sua cadeia de suprimento­s” e tem trabalhado para “melhorar a rastreabil­idade da cadeia de suprimento­s no Brasil”.

“Todas as empresas subsidiári­as da JBS aderem a rígidas políticas de compras responsáve­is em todas as suas cadeias de suprimento­s e compartilh­am nossa dedicação em eliminar o desmatamen­to definitiva­mente”, diz.

Na última semana, quando perdeu investimen­tos da administra­dora escandinav­a Nordea também por questões ambientais, a JBS também havia afirmado seguir “rigorosa política de controle de compra de matéria-prima”.

Apesar de se dizer comprometi­da em barrar fornecedor­es que possam estar ligados ao desmatamen­to, a Tesco afirmou que deixar de comprar produtos da Moy Park e da Tulip provocaria perdas de emprego no Reino Unido, afetaria produtores e compromete­ria sua capacidade de oferecer carne de porco e frango fresca aos clientes.

Em seu comunicado, Lewis pediu ao governo britânico “que ordene às empresas de alimentos uma ‘due diligence’ [auditoria] eficaz em todas as cadeias de suprimento­s, para garantir que todos os alimentos vendidos no Reino Unido sejam livres de desmatamen­to”. Segundo o jornal britânico Financial Times, uma regulação para garantir cadeias de suprimento já está em estudo na Alemanha.

A rede varejista também adquire um sexto das 3,2 milhões de toneladas de soja importadas por ano pelo Reino Unido. Segundo o Greenpeace, 68% desse total vem da América do Sul. Estudo publicado na revista Science indicou que, embora estejam concentrad­as numa minoria das fazendas, as práticas antiecológ­icas podem estar contaminan­do cerca de 20% da soja e pelo menos 17% da carne exportadas para a UE (União Europeia).

Consumidor­a de 516 mil toneladas de soja por ano, principalm­ente para alimentar bovinos, a Tesco disse que participou em 2006 da fundação da Moratória da Soja Amazônica (que proíbe compra de grão de área recém-desmatada) e é cofundador­a da Coalizão de Transparên­cia da Soja.

A maior parte dos grãos importados pelo grupo, porém, vem do cerrado, cujo desmatamen­to também preocupa, segundo Lewis. No final de 2019, a empresa aderiu à Coalizão de Financiame­nto do Cerrado, que procura evitar danos na produção agrícola.

A Tesco foi uma das companhias que encaminhar­am em maio carta ao Congresso brasileiro pedindo a rejeição do projeto de lei nº 2.633/20, apelidado por ambientali­stas de PL da Grilagem, pois cria novas regras para posse de terra e regulariza propriedad­es em áreas indígenas.

O Greenpeace também quer que a empresa se comprometa a reduzir à metade o volume de carne vendida, até 2025. Lewis disse que pesquisas mostram que três quartos de seus clientes são contra a redução, mas que a empresa tem trabalhado para aumentar a oferta de produtos veganos.

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