Folha de S.Paulo

STJ mantém Witzel afastado do governo por seis meses

Por 14 votos a 1, tribunal referenda decisão monocrátic­a; interino já planeja troca de secretário­s no Rio

- Matheus Teixeira e Julia Chaib Colaborou Isabella Macedo

O STJ (Superior Tribunal de Justiça) manteve ontem o afastament­o de Wilson Witzel do Governo do Rio de Janeiro por seis meses. O exjuiz foi denunciado por corrupção pela PGR (Procurador­ia-Geral da República).

Por 14 a 1, a corte especial do STJ referendou decisão monocrátic­a do ministro Benedito Gonçalves, que suspendeu o chefe do Executivo fluminense. Em uma rede social, Witzel afirmou respeitar o resultado.

“Mas reafirmo que jamais cometi atos ilícitos”, disse.

Com o voto do tribunal, o vice-governador Cláudio Castro (PSC), que também é investigad­o e tem se aproximado dos Bolsonaros, seguirá no comando do estado.

Castro tem sinalizado o desejo de substituir secretário­s já na semana que vem. A expectativ­a é que a mudança seja ampla para demonstrar ruptura. Em gesto para a Assembleia, pode aceitar indicações dos deputados.

A Casa analisa o impeachmen­t de seu antecessor.

O interino pretende ainda consultar o clã presidenci­al sobre a sucessão na Procurador­ia-Geral de Justiça do Rio, onde tramita o caso da “rachadinha”.

O STJ (Superior Tribunal de Justiça) decidiu nesta quarta-feira (2) manter o afastament­o de Wilson Witzel do Governo do Rio de Janeiro por seis meses.

Por 14 votos a 1, a corte especial do órgão referendou a decisão monocrátic­a do ministro Benedito Gonçalves que afastou o chefe do Executivo fluminense na sexta (28).

Antigo aliado e atual desafeto do presidente Jair Bolsonaro, Witzel foi denunciado sob acusação de corrupção pela PGR (Procurador­ia-Geral da República).

A suspeita é que ele tenha participad­o de um esquema de desvio de recursos públicos que seriam destinados ao combate à pandemia.

A corte especial do STJ é composta pelos 15 magistrado­s mais antigos do tribunal. Só o ministro Napoleão Nunes Maia divergiu e votou para manter Witzel no cargo.

Outros 14 votaram pelo afastament­o: Benedito Gonçalves, Francisco Falcão, Nancy Andrighi, Maria Thereza Moura, Laurita Vaz, Og Fernandes, Luís Felipe Salomão, Mauro Campbell, Isabel Gallotti, Raul Araújo, Antônio Carlos Ferreira, Marco Buzzi, Sérgio Kukina e o presidente da corte, Humberto Martins.

Os ministros não se aprofundar­am discutindo quantos votos seriam necessário­s para afastar o governador. O relator, porém, entendeu que deveria ser exigido o voto da maioria qualificad­a —dois terços, ou seja, ao menos 10.

O ministro Luís Felipe Salomão defendeu que a maioria simples seria suficiente para ordenar a saída de Witzel.

Com a decisão, o vice-governador Cláudio Castro (PSC), que também é investigad­o e tem se aproximado da família Bolsonaro, seguirá no comando do Rio de Janeiro.

Ele reafirmou “o seu compromiss­o de conduzir o estado” com “serenidade, diálogo e austeridad­e” e defendeu o direito de defesa de Witzel.

Em rede social, o governador afastado disse respeitar a decisão do STJ. “Compreendo a conduta dos magistrado­s diante da gravidade dos fatos apresentad­os. Mas reafirmo que jamais cometi atos ilícitos”, afirmou Witzel.

“Não recebi qualquer valor desviado dos cofres públicos, o que foi comprovado na busca e apreensão. Continuare­i trabalhand­o na minha defesa para demonstrar a verdade e tenho plena confiança em um julgamento justo”, disse Witzel, que desejou a Castro “serenidade para conduzir os trabalhos que iniciamos juntos”.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que “o Rio escolheu mal, escolheu de forma errada”, em “todo o ciclo de 1998 para frente” e disse torcer para que se consiga “um gestor com experiênci­a” para governar o estado. “Mas para isso precisa de voto”, disse.

O despacho de sexta-feira do ministro do STJ atendeu a pedido da PGR, que denunciou Witzel e outras oito pessoas, incluindo a primeira-dama, Helena Witzel. A Procurador­ia pediu a prisão do governador, mas Benedito Gonçalves negou.

O recebiment­o da denúncia e a abertura de ação penal ainda não têm data para ser discutidos.

A PGR acusa Witzel de receber R$ 554,2 mil em propina por intermédio do escritório de sua mulher. Do total, R$ 274,2 mil teriam sido repassados pelo empresário Mário Peixoto, que tem contratos com o Governo do Rio.

Os outros R$ 280 mil, segundo a Procurador­ia, foram pagos pelo Hospital Jardim Amália, da família de Gothardo Lopes Netto, médico e ex-prefeito de Volta Redonda.

Relator do caso, Benedito Gonçalves afirmou que a quebra do sigilo telemático de Witzel permitiu identifica­r dois emails enviados à mulher, Helena, com o contrato de prestação de serviços do escritório de advocacia com o hospital.

O ministro afirmou que há um grupo criminoso instalado no Governo do Rio que “continua agindo, desviando e lavando recursos em plena pandemia, sacrifican­do a saúde e mesmo a vida de milhares de pessoas”.

Além de votar pelo afastament­o de Witzel, o ministro Kukina ficou sozinho ao ir além e defender que o STJ decretasse a prisão de Witzel, que foi pedida pela PGR.

Raul Araújo também defendeu o afastament­o, mas propôs que fosse por um prazo menor do que 180 dias. Os demais colegas, porém, não concordara­m.

Napoleão Nunes Maia divergiu do afastament­o. “Vai dizer agora depois de afastado, vilipendia­do, depois de jogado na sarjeta da desgraça política?”, ponderou.

Ele defendeu que “os políticos é que devem cuidar das coisas da política” e que os magistrado­s devem “cuidar das coisas da Justiça”.

Para o ministro, a decisão equivale a uma cassação indireta. Ele criticou o fato de a defesa do governador não ter sido ouvida antes de Witzel ser retirado do cargo.

“O afastament­o de um governador deve ser pela Assembleia, porque são os deputados que têm investidur­a popular para suprimir mandato popular. Esse governador teve quase 5 milhões de votos. Aí, por decisão monocrátic­a, por ilustrado juiz, é afastado. E os deputados?”, disse.

Nancy, por sua vez, destacou que os elementos presentes nos autos demonstrar­am que está em curso uma “organizaçã­o criminosa” e evidenciar­am a “existência de relações espúrias entre o empresaria­do e o governo estadual, sobretudo na área de saúde”.

A ministra citou o fato de Witzel ter alterado o regime de bens de seu casamento, tornando o seu e o de sua esposa um patrimônio comum, em data próxima aos depósitos feitos na conta do escritório da primeira-dama.

Laurita destacou que “há fortes evidências do cometiment­o de crimes gravíssimo­s” e que em todo o esquema há indícios da “ocorrência de corrupção ativa e passiva, organizaçã­o criminosa e lavagem de capitais, com veementes indícios de autoria”.

Já Falcão ressaltou o momento delicado vivido pelo país por causa da pandemia do novo coronavíru­s.

“No momento que vivemos, numa pandemia, na qual já tivemos mais de 120 mil vítimas, é impossível que alguém que esteja sendo acusado e investigad­o possa continuar a exercer um cargo tão importante”, disse.

Maria Thereza acompanhou a maioria, mas disse que o afastament­o deveria ser tratado pelo colegiado e que “a decisão não deveria ter sido monocrátic­a” —tese também defendida por Campbell.

“Compreendo a conduta dos magistrado­s diante da gravidade dos fatos apresentad­os. Mas reafirmo que jamais cometi atos ilícitos

Wilson Witzel governador afastado do RJ

“Os políticos têm que cuidar das coisas da políticas. Nós magistrado­s devemos cuidar das coisas da Justiça. O afastament­o de um governador deve ser pela Assembleia, porque são os deputados que têm investidur­a popular para suprimir mandato popular. Esse governador teve quase 5 milhões de votos. Aí, por decisão monocrátic­a, por ilustrado juiz, é afastado. E os deputados?

Napoleão Nunes Maia único voto pela manutenção de Witzel no cargo

 ?? Gustavo Lima/Divulgação STJ ?? O presidente do STJ, Humberto Martins, no comando julgamento por videoconfe­rência
Gustavo Lima/Divulgação STJ O presidente do STJ, Humberto Martins, no comando julgamento por videoconfe­rência

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil