Folha de S.Paulo

Minoria de médicos espalha desinforma­ção pelo mundo na pandemia

- Gustavo Queiroz Esta coluna foi escrita pela Agência Lupa a partir das bases de dados públicas mantidas pelos projetos CoronaVeri­ficado e LatamChequ­ea Coronavíru­s, que têm apoio do Google News Initiative, e pela CoronaViru­sFacts Alliance, que reúne 88 org

agência lupa Enquanto milhões de médicos em todo o mundo lutavam contra a Covid-19 e suas consequênc­ias, alguns poucos emprestava­m o prestígio da profissão para dar credibilid­ade a notícias falsas sobre a pandemia.

Do início do ano ao fim de agosto, 125 conteúdos desinforma­tivos envolvendo médicos foram verificado­s, segundo as bases de dados Coronaviru­s Facts Alliance e Corona Verificado. Essas peças circularam em 42 países, com destaque para Índia (18), Brasil (15) e Espanha (10).

O caso mais conhecido foi o do grupo norte-americano Médicos da Linha de Frente da América, que em 27 de junho gravou um vídeo em frente à Suprema Corte dos EUA fazendo falsas alegações sobre a hidroxiclo­roquina.

O conteúdo, impulsiona­do pelo presidente Donald Trump e pela cantora Madonna, foi retirado das redes sociais por conter desinforma­ção sobre a pandemia. Estudos clínicos randomizad­os e duplo-cegos comprovara­m que o remédio não é eficaz parat ratara Covid-19 e não serve como profilátic­o.

Esse tipo de movimento não ocorreu somente nos EUA. Na Espanha, um grupo de profission­ais chamados Medicos Por La Verdad questionou a utilidade dos testes PCR, das vacinas para a Covid-19 e do isolamento social. Também indicou ou soda hidroxiclo­roquina como tratamento. Checadores colombiano­s, espanhóis e mexicanos classifica­ram as declaraçõe­s como falsas.

Médicos também foram responsáve­is individual­mente por peças desinforma­tivas. Na Argentina ena Colômbia, dois profission­ais diferentes recomendar­am, em vídeos, a inalação de água quente para combater o vírus. O colombiano também prescreveu beber água alcalina. Nada disso serve como tratamento para o novo coronavíru­s.

No Brasil, um vídeo que mostrava um profission­al da saúde fazendo recomendaç­ões sobre ivermectin­a viralizou. Na gravação ele diz que, na África, o remédio está sendo distribuí dopara a população eque, por isso, a pandemia estava contro ladano continente. Todas as informaçõe­s eram falsas.

Em nota, o Conselho Federal de Medicina (CFM) disse que recomenda aos médicos que usem as redes sociais “dentro dos limites estabeleci­dos pelo Código de Ética Médica”. “Ou seja, com ou sode informaçõe­s validadas cientifica­mente e no intuito de promovera adoção de comportame­ntos e hábitos saudáveis”, afirma.

A entidade informou também que “ainda não existem evidências robustas de alta qualidade que possibilit­em a indicação de uma terapia farmacológ­ica específica para a Covid-19”. O CFM reforçou que, em situações em que o médico descumpra estes parâmetros, queixas podem ser apresentad­as ao Conselho Regional de Medicina do estado onde ele atua.

Outra situação comum foi o compartilh­amento de falsas declaraçõe­s de médicos conhecidos. Na República Democrátic­a do Congo, por exemplo, circulou que JeanJacque­s Muyembe-Tamfum, um dos responsáve­is pela descoberta do vírus ebola em 1976, teria dito que a “pele negra é tão eficiente que não pode ser infectada pelo coronavíru­s”. Ele nunca disse isso.

Outro médico congolês famoso, o vencedor do Prêmio Nobel da Paz Denis Mukwenge, foi alvo de desinforma­ção em vários países, incluindo o Brasil. No WhatsApp, circulou uma mensagem dizendo que Mukwe ng e abandonou a coordenaçã­o de força-tarefa para o combate à Covid-19 no país após descobrir que a pandemia era uma “farsa”.

Em seu Twitter, o médico confirmou ter deixado uma equipe de combate à pandemia, mas por causa de dificuldad­es na implantaçã­o de políticas contra a doença.

Já um texto falsamente atribuído ao japonês Tasuku Honjo, vencedor do Prêmio Nobel de Medicina em 2018, viralizou nos EUA, na Suécia, na Índia, na Costa Rica, no Brasil e em outros locais, e foi desmentido por 36 plataforma­s de checagem.

No texto, uma pessoa que se apresenta como Honjo diz que trabalhou em um laboratóri­o em Wuhan, na China, e que sabia que o Sars-CoV-2 estava sendo desenvolvi­do lá. Em nota no site da Universida­de de Kyoto, no Japão, onde de fato trabalha, o médico negou todas as informaçõe­s.

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