Folha de S.Paulo

Mulheres não chegam a 5% nos conselhos dos grandes clubes de SP

Com baixa presença feminina na política, Corinthian­s, Santos e São Paulo têm eleições programada­s para 2020

- Carlos Petrocilo e João Gabriel

são paulo O número de mulheres que integram conselhos deliberati­vos e participam das tomadas de decisões políticas dos grandes clubes de futebol de São Paulo escancara quão pouco inclusivo é o ambiente da administra­ção esportiva.

Em um país no qual 51,8% da população é do sexo feminino, os 15% de deputadas e senadoras no Congresso já são discrepant­es em termos de representa­tividade. No futebol, a presença das conselheir­as não chega a 5% nos quatro principais clubes paulistas.

Segundo levantamen­to da Folha, só 4 das atuais 222 cadeiras do principal órgão tomador de decisões do São Paulo são ocupadas por sócias (1,8%). No Santos, há seis mulheres (pouco mais de 2%) dentre os seus quase 300 conselheir­os. O Corinthian­s é quem mais tem conselheir­as: 16 entre 333 (4,8%).

Esses três clubes terão eleições para presidente e conselho neste ano. Já no Palmeiras, cuja próxima votação está marcada para 2021, são 6 mulheres (2,1%). No Santos e no Corinthian­s, sócios podem votar diretament­e para a presidênci­a (desde que cumpram requisitos de adimplênci­a e tempo de associação). No São Paulo, eles elegem os conselheir­os, que por sua vez decidem o mandatário.

O levantamen­to foi feito com base nas listas de integrante­s do Conselho Deliberati­vo divulgada pelas entidades em seus sites.

Até hoje, o cargo de presidente só foi ocupado em uma única oportunida­de por uma mulher nessas instituiçõ­es — Marlene Matheus (1936-2019), no Parque São Jorge. Eleita em 1991 —ficou no posto até 1993.

No Palmeiras, a conselheir­a Leila Pereira, que está à frente da Crefisa e da FAM, principais patrocinad­oras do clube, deve confirmar a sua candidatur­a para o pleito do ano que vem. Em 2017, ela foi eleita para o conselho com 248 votos, um recorde na história do Palmeiras. Suas empresas pagam anualmente R$ 81 milhões ao clube e investiram, desde o começo da parceria, em janeiro de 2015, aproximada­mente R$ 130 milhões para contrataçã­o de atletas.

O mandato do atual presidente do clube, Maurício Galiotte, passou de dois para três anos, e agora vai até dezembro de 2021. “Em fevereiro de 2021, sou candidata à reeleição ao conselho deliberati­vo. Os associados elegeram uma mulher com o maior número de votos e fiquei muito honrada. Depois de fevereiro é outra história, a gente volta a conversar”, diz a empresária.

Leila é uma das poucas mulheres que ocupam espaços de poder dentro dos quatro clubes paulistas. Para outras, o caminho é árduo e, segundo relatos ouvidos pela reportagem, repleto de preconceit­os.

Sócia do São Paulo desde 1989, Soraia Guadalupe tentou uma vaga no conselho vitalício (que integra o deliberati­vo). Seu nome nem sequer foi aprovado no conselho consultivo, que fez a triagem dos que concorrerã­o a uma das novas 10 cadeiras.

Guadalupe, uma entre as quatro conselheir­as do São Paulo, diz que em quatro anos no órgão conseguiu se pronunciar apenas em duas reuniões ordinárias. “O clube é machista. Quando tem reunião, eu sou a última a falar”, disse a são-paulina.

Hoje integrante da ala de oposição ao presidente Leco, ela entrou com um pedido no Tribunal de Justiça de São Paulo para a anulação das escolhas do conselho consultivo. O pedido foi inicialmen­te aceito pelo desembarga­dor Piva Rodrigues na segunda (31), mas o mesmo revogou sua decisão nesta quarta-feira (2).

Para Débora Barga Vaz, conselheir­a do Santos, há um aspecto cultural de a mulher, desde o nascimento ou durante o matrimônio, ser inserida como sócia dependente do pai ou do cônjuge. Isso tira a possibilid­ade de participar dos pleitos e elimina qualquer aspiração política.

Débora entrou para o quadro de associados em 1974, como dependente do pai. Passou a ser a titular a partir de 2001 e está em seu segundo mandato como conselheir­a.

“Nós, mulheres, lutamos no Santos para melhorias como espaço para troca de fraldas das crianças. A Vila [Belmiro] ainda não tem”, relata.

A Folha questionou os clubes sobre o número total de mulheres, associadas e conselheir­as, aptas a votarem na eleição para presidente.

O São Paulo confirmou as quatro conselheir­as. Nos demais, em que os sócios votam, o Santos não informou os números, o Palmeiras não respondeu e o Corinthian­s, que confirmou as 16 conselheir­as, afirmou ainda não saber quantas sócias estarão aptas.

Diana Mendes Machado da Silva, historiado­ra que pesquisa o futebol, entende que a pouca presença feminina mostra que o futebol reproduz nossa sociedade.

“São anos de uma política informal de exclusão das mulheres em relação ao futebol. Começa no ‘menina não joga futebol’, que depois só é alicerçado e mantido quando você vai para uma arquibanca­da, para um jogo, ou quando você tenta participar de um conselho”, afirma a historiado­ra.

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