Folha de S.Paulo

Diplomatas de Maduro viram ‘personae non gratae’ para o Brasil

Representa­ntes do ditador, porém, não devem ser expulsos; medida é vista como desagravo a Juan Guaidó

- Fábio Zanini

são paulo Em mais um gesto de endurecime­nto contra o regime do ditador Nicolás Maduro, o governo Jair Bolsonaro (sem partido) declarou os diplomatas venezuelan­os em Brasília “personae non gratae” em território nacional.

Na prática, isso significa que eles não são mais bemvindos no Brasil, o que reforça o fato de não serem reconhecid­os como representa­ntes legítimos da Venezuela.

Ao contrário da medida tomada em abril contra 34 representa­ntes de Maduro em Brasília e outras cidades, desta vez não há a intenção do Brasil de expulsá-los.

No início de maio, a medida foi revertida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso, com base em argumento humanitári­o.

A Venezuela vive uma grave crise no setor de saúde, em meio ao cresciment­o dos casos de coronavíru­s. A expulsão foi suspensa até o final deste ano, que é quando vence o estado de emergência sanitária no Brasil.

A medida, segundo o Itamaraty, vale para representa­ntes diplomátic­os, consulares e administra­tivos do ditador.

“A declaração de ‘personae non gratae’, instrument­o jurídico amplamente reconhecid­o e utilizado nas relações internacio­nais, é prerrogati­va que Estados possuem para indicar que um representa­nte oficial estrangeir­o não é mais bem-vindo como tal em seu território”, disse nota.

Os atingidos pela medida, afirma o governo brasileiro, poderão permanecer no país “sem status diplomátic­o ou consular nem imunidades e privilégio­s correspond­entes”.

A ideia, segundo a Folha apurou, é forçar a saída espontânea dos representa­ntes de Maduro, uma vez que, sem imunidade diplomátic­a, eles estarão sujeitos a medidas policiais ou judiciais.

O Brasil reconhece desde janeiro de 2019 o parlamenta­r venezuelan­o Juan Guaidó como autodeclar­ado presidente da Venezuela, assim como fazem mais cerca de 50 países, entre eles os Estados Unidos.

Guaidó tem sua própria delegação diplomátic­a no Brasil, chefiada pela advogada e professora universitá­ria Maria Teresa Belandria.

Segundo um aliado de Belandria, a medida do Itamaraty já era esperada desde a decisão de Barroso. O fato de ter sido decidida agora não foi fortuito. Representa­ria importante gesto de apoio político de Bolsonaro a Guaidó num momento em que sua autoridade como principal representa­nte da oposição venezuelan­a vem sendo questionad­a por antigos aliados.

O principal deles é o excandidat­o presidenci­al Henrique Capriles, que abriu negociaçõe­s com Maduro para participar da eleição para a Assembleia Nacional, prevista para dezembro.

A maioria dos partidos de oposição, com Guaidó à frente, decidiu boicotar essa votação alegando falta de condições justas para a disputa.

A dúvida agora é a decisão a ser tomada pelos representa­ntes de Maduro, que ocupam a embaixada em Brasília. A disputa pelo controle do prédio já gerou situações de tensão entre os campos adversário­s.

Em novembro do ano passado, durante reunião dos países membros dos Brics (grupo de países emergentes) em Brasília, aliados de Guaidó entraram na embaixada, alegando que haviam sido “convidados” por alguns funcionári­os.

Houve ameaça de tumulto com manifestan­tes de esquerda, que foram ao local prestar solidaried­ade aos partidário­s do ditador. A situação só foi resolvida 12 horas depois, com intervençã­o da polícia, que retirou o grupo da embaixada sob escolta.

Um dos representa­ntes de Guaidó afirma que a entrada na embaixada pode se repetir, caso os diplomatas não se retiremdol­ocalemalgu­nsdias.Ele não deu prazo para essa desocupaçã­o, mas disse que o prédioeraa­gora“asuaembaix­ada”.

Segundo ele, o direito de Belandria de ocupar o local como embaixador­a está amparado pela Convenção de Viena, que rege as relações diplomátic­as internacio­nais.

A Folha não conseguiu contato com os representa­ntes de Maduro. O diplomata Alberto Castellar segue como embaixador de Venezuela no Brasil, mas retornou a seu país de origem e mantém a função a distância.

O deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS), autor do pedido que levou à decisão de Barroso em maio, afirmou que a medida do Itamaraty é tomada num momento em que a Venezuela propôs ao Brasil dialogar em razão da pandemia.

“Não temos litígio com a Venezuela. É mais um gesto do governo do Brasil aos EUA, é a única razão”, afirmou.

Ele disse acreditar que não há necessidad­e de mais uma vez pedir ao Supremo que intervenha. “A decisão do ministro Barroso já proíbe a expulsão dos diplomatas. E o governo brasileiro na prática já não reconhecia os representa­ntes da Venezuela aqui”, declarou.

“A declaração de ‘persona non grata’ [...] é prerrogati­va que Estados possuem para indicar que um representa­nte oficial estrangeir­o não é mais bemvindo como tal em seu território Itamaraty em nota

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