Folha de S.Paulo

Prescrição livra petistas no mensalão, mas não afeta condenação do STF

- Marcelo Rocha

brasília O TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região), com sede em Brasília, reconheceu a prescrição e livrou de punição José Genoino e Delúbio Soares, respectiva­mente ex-presidente e ex-tesoureiro do PT nacional, do crime de falsidade ideológica.

O caso é um dos desdobrame­ntos do mensalão, julgado pelo STF (Supremo Tribunal Federal), e teve como foco empréstimo­s do banco BMG ao PT e a empresas de Marcos Valério Fernandes de Souza, apontado como operador do esquema e também beneficiad­o pela prescrição. As operações bancárias foram considerad­as fraudulent­as pelo MPF (Ministério Público Federal).

Aliados dos dois ex-dirigentes petistas foram às redes sociais dizer que a decisão do TRF-1 era o reconhecim­ento da inocência de ambos no escândalo da mesada paga a partidos aliados do governo do ex-presidente Lula em troca de apoio em votações no Congresso. O caso foi revelado pela Folha em 2005.

A decisão do TRF-1, porém, não tem repercussã­o sobre as conclusões do STF, que condenou Genoino e Delúbio, afirmou à Folha um juiz federal.

Embora tenha reconhecid­o a prescrição, o tribunal regional chegou a confirmar a sentença de primeira instância que os considerou culpados da acusação de falsidade ideológica, alterando nos últimos anos apenas os prazos das condenaçõe­s.

Genoino, Delúbio, Marcos Valério e outras duas pessoas foram condenados pela Justiça Federal em Minas Gerais em 2012 a penas de quatro anos de prisão, no caso dos petistas, e quatro anos e seis meses, no caso de Valério.

O processo foi, então, enviado ao TRF-1. No mês passado, ao analisar mais um de uma série de recursos, a 3ª Turma da corte, composta por três desembarga­dores, entendeu que houve prescrição do crime de falsidade ideológica.

“Percebe-se o transcurso de quatro anos entre a data de recebiment­o da acusatória e a da publicação da sentença condenatór­ia no primeiro grau, caracteriz­ando, assim, a prescrição retroativa da pretensão punitiva estatal”, afirmou o relator do caso, desembarga­dor Ney Bello.

O tribunal considerou que a denúncia dos fatos, praticados entre 2003 e 2005, foi recebida em dezembro de 2006. A sentença condenatór­ia da primeira instância foi publicada em outubro de 2012, e o acórdão que confirmou a condenação, em julho de 2016.

Em meio à tramitação da denúncia, Genoino foi eleito deputado federal em 2006, deslocando o caso para o STF por prerrogati­va de foro. Voltou à primeira instância com o fim do mandato, em 2011.

A denúncia do MPF afirmou que “a liberação de recursos milionário­s pelo BMG ao PT e às empresas ligadas a Marcos Valério deu-se de maneira irregular, seja porque a situação econômico-financeira dos tomadores era incompatív­el com o valor, seja porque as garantias dadas eram insuficien­tes”.

“Tampouco foram observadas, nos contratos de financiame­ntos, as normas impostas pelo Banco Central ou, até, as próprias normas internas do banco”, acrescento­u.

O Ministério Público alegou que o BMG perdoou “altos montantes quando da rolagem das dívidas e não registrou os empréstimo­s na sua contabilid­ade”.

“A simulação ficou evidente no fato de que o ajuizament­o das ações de cobrança só ocorreram após junho de 2005, quando eclodiram as denúncias do mensalão”, afirmou o MPF.

O PT e Valério também fizeram empréstimo­s no Banco Rural. Nas duas instituiçõ­es, o montante emprestado foi de R$ 55 milhões entre fevereiro de 2003 e abril de 2004. Em junho de 2006, a dívida chegou a ultrapassa­r R$ 110 milhões.

Em outubro de 2019, a Terceria Turma do TRF-1 analisou recursos dos réus em que a defesa suscitou a prescrição.

Pelo acórdão do julgamento, os desembarga­dores entenderam que não havia prescrição “a ser reconhecid­a porque não estavam esgotados, para o MPF, a possibilid­ade de apresentar recursos às instâncias extraordin­árias”.

Um dos réus apresentou embargos de declaração ao acórdão da 3ª Turma sobre a questão do prazo prescricio­nal. Esses embargos existem para sanar dúvidas, resolver contradiçõ­es ou omissões.

Provocado a se manifestar, o MPF argumentou que o prazo prescricio­nal, definido pela legislação entre o recebiment­o da denúncia e a decisão condenatór­ia de primeiro grau, havia sido superado. Portanto, a prescrição da pretensão punitiva estava configurad­a.

O desembarga­dor Ney Bello afirmou que, em tese, não deveria haver, por parte do TRF-1, o reconhecim­ento da prescrição por ainda caber recurso em outras instâncias.

Mas o tribunal explicou, em nota, que, “em razão do trânsito em julgado do acórdão para a acusação, pois o MPF não recorreu, e por se tratar de matéria de ordem pública, a extinção da punibilida­de deve ser decretada em qualquer fase do processo, conforme o art. 61 do Código de Processo Penal”.

 ?? André Stefanini ??
André Stefanini

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil