Rede de fake news expõe avanço sobre liberdade de expressão na Bolívia
buenos aires A revelação de que o governo interino da Bolívia, de Jeanine Añez, havia contratado uma empresa americana acusada de difundir fake news mostra mais um avanço da gestão sobre a liberdade de expressão.
A notícia surge a pouco mais de um mês da eleição presidencial, em 18 de outubro, na qual Añez é candidata.
Após investigação do FBI, o Facebook decidiu eliminar uma lista de contas vinculadas à empresa CLS Strategies, que atuariam na distribuição de fake news por encomenda do governo interino da Bolívia, do grupo opositor comandado por Juan Guaidó na Venezuela e da oposição a Andrés Manuel López Obrador, no México.
Segundo Nathaniel Gleicher, chefe de política de segurança do Facebook, foram eliminadas 55 contas falsas e 42 páginas na rede, além de 36 contas do Instagram.
“A atividade da CLS continua sendo uma tendência vista em empresas que prestam serviços de relações-públicas em todo o mundo e que fazem negócios por meio da desinformação”, disse.
O governo boliviano admitiu ter contratado a empresa, mas afirmou que era para realização de outro serviço, o de “relações-públicas” e de “o respaldo à democracia e o apoio às novas eleições”.
“A notícia impactou muito a opinião pública e está aumentando o grau de insultos e da violência verbal na campanha”, conta à Folha Raúl Peñaranda, jornalista e analista político boliviano.
A nova eleição está marcada para ocorrer quase um ano depois da data original. Duas novas datas haviam sido anunciadas (em maio e em setembro), mas foram adiadas devido à pandemia.
O Facebook informou que as contas violaram sua política de não intervenção em países estrangeiros. A CLS negou a ação, afirmando que o trabalho havia sido pago por clientes nos países, e que nenhum pagamento havia sido feito por governo ou partido.
De Buenos Aires, onde vive como refugiado político, o ex-presidente Evo Morales afirmou que esse é mais um capítulo da “guerra suja” que Añez move contra seu grupo. A maioria das postagens é crítica a ele e acusa partidários do MAS (sigla de Evo) de incentivar atos “terroristas”.
Em março, a presidente interina já havia publicado um polêmico decreto que impunha até dez anos de prisão a quem publicasse dados sobre a pandemia que o governo não considerasse corretos.
A lei valia para jornais, TVs, sites, rádios e manifestações artísticas. Dois jornalistas foram presos com base nela.
Após pressão de associações de imprensa, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e do Alto Comissariado para os Direitos Humanos da ONU, em maio Añez revogou o decreto, e os jornalistas foram liberados.
Durante o governo Evo (2006-2019), houve pressão sobre meios de comunicação, por meio de intimidação de anunciantes e de empresários —e a gestão interina tem sido criticada por fazer o mesmo.