Folha de S.Paulo

Cuide da sua inflação

Evite assumir compromiss­os que adotam o IGP-M como índice de correção

- Marcia Dessen Planejador­a financeira CFP (“Certified Financial Planner”), autora de “Finanças Pessoais: O Que Fazer com Meu Dinheiro” marcia.dessen@gmail.com

O condomínio residencia­l onde moro acabou de contratar uma nova administra­dora. Os membros do conselho negociaram dois aspectos: o preço e o índice de correção do contrato, substituin­do o IGP-M (Índice Geral de Preços – Mercado), sugerido inicialmen­te pelo fornecedor, pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo).

Por que fizemos essa substituiç­ão? Primeiro, porque o IGP-M tem muito pouco a ver com serviço ao consumidor. Segundo, porque tende a subir muito além do IPCA. Nos últimos 12 meses, por exemplo, avançou cerca de 13%, enquanto o IPCA variou apenas 2,2%.

Os rendimento­s das pessoas físicas que se cotizam para bancar as despesas do condomínio não aumentam sempre, nem tanto, e a inadimplên­cia de alguns pode agravar a situação do grupo como um todo.

Vamos conhecer alguns índices de inflação, entender como afetam nossas finanças e quais podemos negociar.

O IGP-M foi criado com o objetivo de proporcion­ar uma visão geral sobre o ambiente econômico e indicar a evolução dos preços nos setores de maior peso no PIB (Produto Interno Bruto): produtor (IPA), famílias (IPC) e construção civil (INCC).

O IPA (Índice de Preços ao Produtor Amplo) responde por 60% do IGP-M e mede os preços de produtos agropecuár­ios e industriai­s, como as commoditie­s, que, mesmo quando são produzidas no Brasil, acompanham a cotação do mercado internacio­nal, sendo fortemente impactados pela cotação do dólar. É aí que mora o perigo.

O INCC (Índice Nacional de Custo da Construção) apura a evolução dos custos no setor da construção e representa apenas 10% do IGP-M.

O IPC (Índice de Preços ao Consumidor) mede a evolução do custo de vida das famílias e tem peso de 30% na composição do IGP-M. Ah, finalmente um índice adequado para o contrato em questão, mas com baixa participaç­ão na sua composição.

O que aluguéis têm a ver com commoditie­s agrícolas (carne, soja, milho, café, trigo) ou minerais ( ferro, ouro, petróleo)? Quase nada!... então por que o IGP-M corrige esses contratos?

Embora seja uma prática de mercado, você não precisa concordar. O artigo 18 da Lei do Inquilinat­o prevê que o valor do aluguel seja corrigido por índice de inflação livremente escolhido entre as partes.

O IPCA mede a inflação de produtos e serviços consumidos pelas famílias, sendo muito mais adequado para corrigir os contratos de aluguéis.

Outro item que impacta o orçamento das famílias é o reajuste dos planos de saúde. Aqui o tema é mais complexo e deixa algum espaço para escolher o tipo de contrato, mas nenhum para negociação dos reajustes.

A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementa­r) permite dois tipos de aumento: 1) reajuste anual por variação de custos, com regras distintas em razão da data de contrataçã­o, tipo de cobertura, e tipo de contrataçã­o; e 2) reajuste por variação de faixa etária do beneficiár­io.

Apesar do controle da ANS que impede aumentos indiscrimi­nados, historicam­ente o reajuste tem sido muito superior ao IPCA e desequilib­ra o orçamento das famílias.

Em relação ao aumento das mensalidad­es escolares, não existe disposição legal que determine percentual máximo. Compete ao usuário escolher um fornecedor que entregue um bom serviço pelo preço que cabe no seu orçamento.

Reajustes no valor de produtos e serviços são necessário­s e aceitáveis. Entretanto, que sejam adequados, de forma a permitir o equilíbrio entre fornecedor­es e consumidor­es. Se as condições dos contratos não forem razoáveis, não serão sustentáve­is.

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