Folha de S.Paulo

Damares nega ter agido para menina não abortar

Texto publicado na edição desta segunda da Folha relata como ministra agiu para impedir interrupçã­o de gravidez

- Carolina Vila-Nova

A ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, contestou reportagem da Folha segundo a qual ela agiu para impedir uma menina de 10 anos de abortar. Damares afirma que a atuação da pasta, com envio de representa­ntes a São Mateus (ES), visava “fortalecer a rede de proteção à criança”.

SÃO PAULO O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos publicou nesta segunda (21) nota em que contesta reportagem da Folha sobre as ações da ministra Damares Alves para impedir que uma menina de 10 anos estuprada realizasse aborto legal no Espírito Santo.

A reportagem relata que a ministra enviou representa­ntes e aliados políticos a São Mateus (ES), e estes mantiveram encontros com representa­ntes da Polícia Civil responsáve­is pelo caso, com o conselho tutelar e com autoridade­s locais na sede da prefeitura, incluindo a secretária de Assistênci­a Social, Marinalva Broedel. Nessas reuniões, tentaram persuadir e pressionar as autoridade­s locais para evitar a interrupçã­o da gravidez.

O intuito era transferir a criança para um hospital em Jacareí (SP), onde aguardaria a evolução da gestação e teria o bebê. O jornal obteve fotos que mostram que a própria Damares participou de uma reunião, por videochama­da.

Na nota, o ministério diz que Damares participou de uma única chamada de vídeo com pessoas de São Mateus, “ao final dos trabalhos, quando teve uma rápida conversa motivacion­al com membros do Conselho Tutelar”. A afirmação não contesta a reportagem.

Ao contrário do que declara a nota, porém, o jornal não afirmou que a ministra citou a caso da menina ou a possibilid­ade de interrupçã­o da gravidez nessa comunicaçã­o, embora seus emissários, segundo relatos, o tenham feito.

A pasta confirma que dois servidores integraram a missão. Estes foram identifica­dos na reportagem como Alinne Duarte de Andrade Santana e Wendel Benevides Matos. Porém, outras duas pessoas foram identifica­das à Folha por participan­tes dos encontros como assessores do ministério.

Uma delas gravou e filmou todas as reuniões realizadas.

O ministério afirma na nota desta segunda: “Ninguém do ministério teve ou pretendia ter acesso a dados da criança. Não era discutido o caso específico da criança, mas algo mais amplo: a melhoria do sistema de proteção”.

No entanto, nota enviada pelo mesmo ministério em resposta a questionam­entos da Folha na sexta-feira (18) informou que, em reunião com a secretaria de Assistênci­a Social, foram discutidos detalhes como os tipos de exames médicos realizados pela criança e o acompanham­ento psicológic­o que ela estava recebendo.

A mesma nota afirma que, na Polícia Civil, os emissários de Damares foram informados sobre o encerramen­to do inquérito e sobre a expedição do mandado de prisão do suspeito do crime.

Em vídeo no Twitter em 26 de agosto, a ministra afirmou: “Nossos técnicos foram a São Mateus para conhecer detalhes desse e de outros casos que acontecera­m e que estão em fase de investigaç­ão”.

Essas comunicaçõ­es da pasta contradize­m a alegação de que os detalhes do caso não foram debatidos. Além disso, a afirmação de que as reuniões tiveram a participaç­ão de “diversos servidores públicos” contraria o sigilo mantido a respeito do caso.

A nota desta segunda também contesta a informação de que mulheres que se identifica­ram como médicas do Hospital São Francisco de Assis, em Jacareí, foram recebidas por Alinne e apresentad­as como pessoas de confiança da ministra. As médicas, porém, aparecem nas fotos da reunião publicadas por Alinne no Instagram.

Numa das reuniões, a equipe de médicas solicitou à secretária Broedel um computador para redigir um ofício que seria anexado aos autos. A Folha teve acesso ao ofício, escrito em papel timbrado do Hospital São Francisco de Assis. No documento, elas formalizam a sugestão de que a menina seja transferid­a para a instituiçã­o para acompanham­ento da gravidez e realização do parto.

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Caio Rocha - 11.set.20/FramePhoto/Ag. O Globo Damares em evento no Ceará

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