Com aval de Bolsonaro, Guedes lança ofensiva pública pela nova CPMF
Ministro fala em ‘tributos alternativos’ como solução para garantir a desoneração da folha e liga proposta a programa de renda mínima
brasília Com aval do presidente Jair Bolsonaro, o governo anunciou nesta quarta-feira (23) uma ofensiva para emplacar a criação de um imposto a ser cobrado amplamente nas operações de pagamento no país. A iniciativa coube ao ministro Paulo Guedes (Economia), ao lado de líderes do governo no Congresso.
Guedes falou na criação de “tributos alternativos” —eufemismo que o governo usa para a criação de uma nova CPMF— como solução para garantir a desoneração da folha de pagamento.
Ele também ligou o imposto ao financiamento do novo programa de renda mínima que será criado na PEC (proposta de emenda à Constituição) do pacto federativo, embora tal instrumento não garantiria o programa, visto que depende de corte de despesas por causa do teto de gastos.
“Queremos desonerar, queremos ajudar a buscar emprego, facilitar a criação de empregos, então vamos fazer um programa de substituição tributária”, disse Guedes.
“Temos que desonerar folha, por isso a gente precisa de tributos alternativos, para desonerar folha e ajudar a criar empregos e renda a mesma coisa. Vimos a importância do auxílio emergencial, como isso ajudou a manter o Brasil respirando e atravessando essa onda da crise. Temos que também fazer uma aterrissagem suave do programa de auxílio emergencial”, afirmou o ministro, sem responder a perguntas.
Desde o fim de semana, os líderes partidários vinham articulando com o Congresso uma proposta de reforma tributária que contenha uma desoneração ampla das folhas de salários. Guedes planeja compensar a perda de receitas com a criação do novo imposto.
“Queremos criar renda? Sim. Então, vamos ter que fazer”, disse, no Planalto, após reunião com o presidente.
A iniciativa também é peça da negociação com parlamentares em torno do veto de Bolsonaro à desoneração de 17 setores. O governo já dá como certa a derrota, deverá liberar as bancadas para derrubar a medida e, em troca, espera apoio na negociação de uma CPMF para compensar uma desoneração ampla da folha de pagamentos. A análise está prevista para o dia 30.
Nos bastidores, Guedes também pretende usar a CPMF como moeda de troca para a desoneração de igrejas (também alvo de veto do presidente).
Segundo Guedes, a proposta será debatida com os líderes e com os presidentes de Câmara e Senado. “Os textos estão sendo submetidos, vão passar para apreciação dos líderes e vamos encaminhar também para a comissão mista.”
O ministro disse ainda que a proposta do pacto federativo também será encaminhada após alinhamento com líderes partidários e Bolsonaro.
A proposta está nas mãos do senador Márcio Bittar (MDBAC), relator do texto, que pretende eliminar pisos de saúde e educação. Guedes apoia a medida e usa como argumento a devolução do Orçamento público às mãos dos políticos.
“O pacto federativo é a devolução do Orçamento público à classe politica, a classe política que decide”, afirmou.
A equipe de Guedes já tinha formulado uma versão inicial do pacto federativo. Em novembro de 2019, o texto foi apresentado ao Congresso no Plano Mais Brasil.
“Eram três versões, elas estão sendo consolidadas agora. E o relator está fazendo um excelente trabalho, submetendo à aprovação do presidente, vendo onde há acordo, onde não há, e isso vai ser encaminhado”, disse Guedes.
Relator da PEC do Pacto Federativo, Bittar foi um passo além nos objetivos do texto de desobrigar, desvincular e desindexar diferentes despesas.
Seu relatório sobre a PEC está praticamente pronto. No fim de semana, em um dos trechos mais importantes, Bittar elimina o piso de recursos para saúde e educação no país (a proposta do governo apenas somava os dois pisos, permitindo ao governante mover recursos entre uma e outra área).
Hoje, a Constituição obriga a União a destinar às duas áreas o montante aplicado no ano anterior mais a inflação. Estados e municípios também têm pisos, ligados à receita arrecadada.
Guedes defende a medida dizendo que o aumento pela inflação não protege a população. “A ação política é muito mais importante do que um dinheiro carimbado que corrige 1,6% [o mínimo para a saúde]. Da mesma forma a educação brasileira”, afirmou.
Guedes aproveitou para reafirmar sua tese de que a atividade do Brasil está voltando em V. “O Congresso é reformista, o presidente está dando apoio às reformas, já mandamos a administrativa e vamos mandar a tributária. E o pacto federativo está entrando”, disse. “Estamos costurando esses acordos, construindo a solução”, afirmou.
Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, pretende testar as propostas do pacto e da reforma tributária até a próxima semana e avaliar a viabilidade das propostas do governo em conversas com líderes e com Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidentes da Câmara e do Senado, respectivamente.
Barros disse que o governo não abrirá mão da responsabilidade fiscal. “Reafirmamos nosso compromisso com o teto de gastos e o rigor fiscal. Nenhuma proposta que será encaminhada vai tratar dessa questão. Estamos buscando dentro do Orçamento recursos para poder avançar nos programas e, se houver a necessidade, faremos uma substituição de tributação”, disse.
“Não tem aumento de carga tributária, tem compromisso com o teto de gastos e com o rigor fiscal”, afirmou Barros.
O líder disse que a ideia do governo é que as propostas para serem inseridas nas PECs da reforma tributária e do pacto federativo sejam apresentadas na semana que vem.
A assessora especial do Ministério da Economia Vanessa Canado afirmou no mês passado que o novo imposto sobre pagamentos sendo desenhado pelo governo taxaria não apenas operações digitais mas todas as transações da economia.
Apesar de rechaçar a comparação com a CPMF, o Ministério da Economia ainda não apresentou formalmente os detalhes da nova cobrança para mostrar quais exatamente seriam as diferenças em relação à antiga CPMF.
Até hoje, o momento em que a ideia do novo imposto foi comentada com mais detalhes publicamente foi em setembro de 2019, durante apresentação da Receita Federal em seminário sobre o tema.
Ali, foi revelado que o governo planejava taxar até saques e depósitos em dinheiro com alíquota inicial de 0,4%. Já para pagamentos no débito e no crédito, a alíquota seria de 0,2% (para cada lado da operação, pagador e recebedor).
Na ocasião, a própria Receita Federal fez uma análise do comportamento do novo tributo tendo como base a antiga CPMF, o que comprovou a semelhança. Após a repercussão da apresentação, o então secretário especial da Receita (Marcos Cintra) foi demitido.
Agora, os cálculos da Economia apontam para uma alíquota de 0,2%, dos dois lados da operação, e uma arrecadação potencial de R$ 120 bilhões.
O montante arrecadado seria usado para cobrir a desoneração da folha para quem ganha até um salário mínimo (R$ 1.045). Acima desse patamar, haveria descontos. A contribuição previdenciária paga pelas empresas para esses funcionários, que hoje é de 20%, passaria a 10%. A diferença seria coberta pela receita gerada pelo novo tributo.
Não há ambiente para discutir tributo, diz presidente de comissão
brasília A despeito do esforço do governo para buscar apoio do centrão para um imposto sobre transações digitais, o presidente da comissão da reforma tributária no Congresso, senador Roberto Rocha (PSDB-MA), disse nesta quarta-feira (23) que a criação da nova CPMF é um assunto delicado e que pode contaminar toda a discussão.
Ao chegar para uma reunião no Palácio do Planalto, Rocha disse aos jornalistas que um imposto nos moldes da CPMF é um assunto que não está em discussão no Legislativo e que, apesar de estar sendo priorizado pelo governo, não deve sequer chegar aos parlamentares.
“É muito delicado esse assunto. Pode, de algum modo, contaminar a reforma. Não há ambiente político para discutir esse assunto.”
Para o senador, é mais viável seguir com a proposta que está em curso no Parlamento. Em linhas gerais, ela prevê a fusão de cinco impostos (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) em um só, chamado de IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).
A criação da nova CPMF conta com a antipatia do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que comanda a pauta da Casa até fevereiro de 2021.
“Na realidade, não é criar um imposto o que o governo quer, o governo quer é desonerar a folha. A maneira que encontra para desonerar a folha é criando essa movimentação financeira. Ou faz assim ou aumenta no IVA, aumentando a carga tributária. Mas esse é um assunto delicado, que não me parece oportuno discutir agora, neste momento”, afirmou Roberto Rocha.
“Temos que desonerar folha, por isso a gente precisa de tributos alternativos, para desonerar folha e ajudar a criar empregos e renda a mesma coisa. Vimos a importância do auxílio emergencial, como isso ajudou a manter o Brasil respirando e atravessando essa onda da crise. Temos que também fazer uma aterrissagem suave do programa de auxílio emergencial Paulo Guedes ministro da Fazenda
“É muito delicado esse assunto [nova CPMF]. Pode, de algum modo, contaminar a reforma [tributária]. Não há ambiente político para discutir esse assunto Roberto Rocha (PSDB-MA) senador, presidente da comissão da reforma tributária no Congresso