Folha de S.Paulo

Novatos na berlinda

Processos de impeachmen­t contra governador­es põem em xeque eleitos com a onda da antipolíti­ca

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Acerca de processos de impeachmen­t nos estados.

Até a semana passada, apenas um governador de estado havia sido impedido no Brasil, o alagoano Muniz Falcão, no longíquo 1957.

Hoje, dois chefes estaduais sofrem processo de impeachmen­t. O caso mais sério é o de Wilson Witzel (PSC), no Rio de Janeiro, contra quem pesam evidências contundent­es de desvios na área da saúde.

O governador, que já tinha sido afastado por ordem judicial, teve seu processo de impediment­o aberto pela Assembleia Legislativ­a por 69 votos a 0 na quarta (23).

Ele faz companhia agora a Carlos Moisés (PSL), de Santa Catarina. No dia 17, a abertura do seu processo registrou 33 deputados favoráveis, 6 contrários e 1 abstenção.

Aacusaçãoc­ontraMoisé­sseestende à vice e diz respeito a um reajuste salarial concedido a procurador­es por decreto, sem aval legislativ­o.

O que une ambos os episódios é a origem dos atingidos. Tanto o fluminense quanto o catarinens­e eram novatos na política cujas chances eleitorais pareciam desprezíve­is no início da disputa de 2018.

Os dois se elegeram associados à onda conservado­ra que acabou por levar Jair Bolsonaro ao Planalto.

Os governador­es representa­vam bem duas das forças simbólicas que impulsiona­ram a maré bolsonaris­ta. Witzel era juiz, e Moisés usava sua denominaçã­o como bombeiro militar, comandante, para compor o nome apresentad­o na urna.

Em ambos os casos, além da derrocada política, há fatores de disputa intestina no bolsonaris­mo a temperar os enredos em curso.

Witzel rompeu com o presidente e se lançou candidato à sua cadeira antes de completar o primeiro ano de mandato. Ele acusa os órgãos investigat­ivos de perseguiçã­o e aponta Bolsonaro como maior interessad­o em sua ruína política.

Ao se defender na Assembleia Legislativ­a na quarta, o ex-juiz moralista usou argumentos semelhante­s aos que ouvia de adversário­s no passado: “Se essa Casa aderir ao lavajatism­o, não haverá mais quem possa defender a sociedade”.

No caso de Moisés, a acusação de improbidad­e surgiu após seu afastament­o de Bolsonaro e uma aproximaçã­o com João Doria (PSDBSP), que se movimenta para concorrer à Presidênci­a em 2022.

Lideranças ligadas ao presidente trabalham para que a vice-governador­a Daniela Reinehr seja isentada de responsabi­lidade e assuma o postodeMoi­sésseelefo­rremovido.

Outros governante­s eleitos em 2018comono­vidadenapo­líticatamb­ém enfrentam agruras no cargo, Romeu Zema (Novo-MG) à frente.

Se tudo isso pode oferecer alívio para os atores tradiciona­is, trucidados nas urnas dois anos atrás, deveria servir também como lição para todos que se desviam da responsabi­lidade de governar —e não só para os que surfam na antipolíti­ca.

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