Folha de S.Paulo

É preciso entender melhor a autonomia da Polícia Federal

PEC é controvers­a e pode colocar a real independên­cia da instituiçã­o em risco

- Susanna do Val Moore Agente da Polícia Federal, é presidente do Sindicato dos Policiais Federais no Estado de São Paulo (Sindpolf-SP)

Tramita no Congresso Nacional a Proposta de Emenda Constituci­onal nº 412, também conhecida como “PEC da Autonomia da Polícia Federal”. O projeto estava parado, mas foi resgatado por ocasião da saída do ex-ministro Sergio Moro.

Ao deixar o cargo, Moro afirmou se sentir incomodado com o que chamou de insistênci­a do presidente Jair Bolsonaro em promover a troca do diretor-geral da PF —o que, segundo o ex-magistrado, se configurar­ia ingerência com o objetivo de obter informaçõe­s privilegia­das acerca de investigaç­ões.

Obviamente, é fundamenta­l que a PF mantenha autonomia em suas ações, mas a PEC em questão é controvers­a e pode colocar a real independên­cia da instituiçã­o em risco.

A Polícia Federal não é um órgão de inteligênc­ia da Presidênci­a da República, e sim uma instituiçã­o do Estado que desempenha o papel de polícia judiciária da União. O papel de inteligênc­ia é exercido pela Abin (Agência Brasileira de Inteligênc­ia).

Outro ponto importante: a Polícia Federal é um órgão de Estado, e não de governo, e isso faz toda a diferença, pois assegura sua própria autonomia técnica de investigaç­ão e administra­ção. Muito embora a PF seja subordinad­a ao governo federal, essa questão se dá no âmbito da gestão orçamentár­ia do órgão, sem relação com a sua função investigat­iva, que passa por controle de legalidade e constituci­onalidade pelo Poder Judiciário federal e pelo Ministério Público Federal.

A PEC 412 pretende estender para a PF independên­cia em relação à organizaçã­o interna do órgão, gestão de recursos, além de autonomia orçamentár­ia e financeira. Por retirar da Polícia Federal a caracterís­tica de órgão permanente, e ainda não possuir um projeto de lei que a regulament­e, a PEC poderia ocasionar até a extinção da Polícia Federal.

O projeto em tramitação é temerário. Seu intuito é equiparar a forma de gestão da PF ao Ministério Público e ao Poder Judiciário para que os cargos de alto escalão possam fixar seus próprios benefícios, como a criação ou extinção de cargos e o aumento do teto salarial, além de privilégio­s como auxílio-moradia e auxílio-paletó, entre outros.

A Polícia Federal precisa de independên­cia investigat­iva, sendo que medidas protetivas administra­tivas, financeira­s e organizaci­onais devem ser pautadas sob esse norte.

Mais importante que dar maior autonomia para a Polícia Federal é avançar com a modernizaç­ão da estrutura do órgão. Essencial também que exista uma lei orgânica que defina atribuiçõe­s dos cargos, bem como a criação de um plano de carreira com porta única de acesso, pela qual todos os servidores do órgão possam ascender por mérito, que privilegie nos cargos de alto escalão aqueles com melhor desempenho e caracterís­ticas de liderança.

Teríamos, assim, um sistema muito mais especializ­ado e eficaz, por meio do qual os melhores servidores da PF seriam valorizado­s pela qualificaç­ão e competênci­a, contribuin­do para o aprimorame­nto da instituiçã­o como polícia judiciária.

Maior produtivid­ade, melhor gestão dos recursos e economia para o Estado contribuem para que a instituiçã­o sirva a sociedade com ainda mais eficiência.

O projeto em tramitação é temerário. Seu intuito é equiparar a forma de gestão da PF ao Ministério Público e ao Poder Judiciário para que os cargos de alto escalão possam fixar seus próprios benefícios, como a criação ou extinção de cargos e o aumento do teto salarial

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