Folha de S.Paulo

Tucano busca sexto mandato em Barueri

Grupo de Rubens Furlan se reveza no comando da cidade desde 1983; moradores veem avanços, mas pouca transparên­cia

- ELEIÇÃO NAS PERIFERIAS Ana Beatriz Felicio e Paulo Talarico

Durante os 30 anos que viveu em Barueri, o mecânico Bruno Costa Brasileiro, nascido em 1984, viu apenas um grupo político no comando da cidade: o do prefeito Rubens Furlan (PSDB).

O tucano pode chegar ao sexto mandato, caso seja reeleito em novembro um dos municípios mais ricos de São Paulo. Quando não estava no cargo, ele mesmo seguida dando as cartas na cidade em meio a um revezament­o de aliados na prefeitura.

“A gente fica preocupado com a monopoliza­ção. Não tendo com quem competir, ele acaba não tendo as prioridade­s que deveria ter, poderia ter investido melhor”, diz Brasileiro, morador do Parque Viana, na periferia de Barueri.

Apesar dessa crítica, ele diz ter votado em Furlan em 2016, afirma que Barueri cresceu nesse período e considera que a cidade evoluiu na comparação com a gestão anterior, do ex-prefeito Gil Arantes (DEM), também aliado do tucano.

O domínio do grupo de Furlan coincide com o cresciment­o do bairro de Alphaville nos anos 1980. A região empresaria­l e com imóveis residencia­is de luxo traz uma fatia alta de recursos para o município, sobretudo via ISS (Imposto Sobre Serviços).

Barueri, na Grande São Paulo, tem cerca de R$ 3 bilhões para a administra­ção de 274 mil moradores (arrecada R$ 10,9 mil para cada habitante). Na vizinha Carapicuíb­a, são 400 mil moradores e cerca de R$ 509 milhões de orçamento (R$ 1.200 por pessoa).

Nesse cenário, ser oposição ao grupo de Furlan tem sido difícil. Em 2016, ao menos três políticos desistiram de confrontar Furlan nas urnas antes do início da campanha.

Neste ano, a situação não é diferente. O radialista cristão Fábio Teruel (Podemos), que despontava como possível rival, se retirou da disputa. Procurado, ele não retornou à reportagem sobre os motivos de não concorrer. Na semana passada, o partido lançou Capitão Ataliba como candidato.

Dois nomes que seguem como oposição são Mari Tavelli (PSB) e Baltazar Rosa (PT).

Mari, 32, tem apoio do exgovernad­or Márcio França (PSB), candidato à Prefeitura de São Paulo, e diz que conseguirá levar a disputa para o segundo turno —o que nunca aconteceu na cidade.

“Será que Barueri merece ser cabide de emprego para ex-prefeitos do PSDB? Vários secretário­s da gestão são prefeitos aposentado­s, que não têm ligação com Barueri e acabam vindo para a nossa cidade contribuir com esse projeto de poder”, afirma Mari.

Ela se refere aos secretário­s de Suprimento­s, Geraldo Vinholi, e de Governo, Milton Monti, que no passado já governaram, respectiva­mente, os municípios de Catanduva e São Manuel, ambos no interior do estado.

“O mundo é outro desde 1983, e o prefeito continua o mesmo. Precisamos renovar os nomes, as ideias e os caminhos”, diz Mari, citando o ano de início do primeiro mandato de Furlan na prefeitura.

O petista Baltazar Rosa critica a desigualda­de na cidade, citando dados do IBGE.

“A renda per capita média está em torno de 4,5 salários, ao passo que 35% da população recebe menos de meio salário. A cidade tem uma distribuiç­ão de renda, a nosso ver, muito ruim. Uns com muito e outros praticamen­te sem nada.”

Rosa já disputou a prefeitura e cita a dificuldad­e de se obter financiame­nto para campanha na cidade, quando empresas ainda podiam fazer doações —a prática foi proibida pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em 2015.

Segundo ele, empresário­s eram desestimul­ados a investir em nomes da oposição.

“A gente virava uma formiguinh­a frente a um elefante, porque o poder era muito grande”, diz o petista. “Não há de se falar em democracia em um lugar no qual o poder econômico consegue definir quem vai ser o representa­nte daquela sociedade.”

A proibição de doações empresaria­is pouco mudou o cenário na eleição de 2016.

Rosa foi vice de Saulo Góes (PSOL), que teve R$ 27 mil em despesas na disputa. A campanha de Furlan gastou 92 vezes mais: R$ 2,5 milhões, sendo R$ 1,6 milhão do próprio Furlan e R$ 517 mil do vice, Roberto Piteri (Cidadania).

Furlan teve 84% dos votos, e nenhum vereador de oposição foi eleito. Com isso, polêmicas ficaram de lado.

Em 2018, a gestão Furlan foi citada na Operação Prato Feito, da Polícia Civil, que investiga o desvio de recursos da merenda em várias cidades do estado. Apesar de negar envolvimen­to em irregulari­dades, Furlan demitiu dois secretário­s na época, ambos irmãos dele —Celso Furlan, da Educação, e Toninho Furlan, de Suprimento­s.

Outro problema que desafiou sua candidatur­a foi um processo na Justiça Eleitoral referente às eleições de 2012 que aponta abuso de poder econômico na disputa. De acordo com a denúncia, foram feitos convites de inauguraçõ­es com a presença de candidatos durante o período eleitoral, o que é proibido.

Após idas e vindas de recursos, o processo teve decisão favorável à candidatur­a do tucano no TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de São Paulo.

Procurado, Furlan não respondeu sobre esses processos. Na convenção que confirmou sua candidatur­a, o tucano disse que nunca cometeu irregulari­dades.

“A oposição vasculha minha vida, inventam, denunciam coisas que não existem e não conseguem pegar nada. Não pega porque não tem e gostaria que nenhum político desse país tivesse o rabo preso.”

No evento, também disse que as três décadas no comando da cidade não são motivo para buscar novos nomes.

“‘Não deu conta durante todo esse tempo’? Se não tivesse dado conta teria de estar fora há muito tempo, e se está é porque tem cumprido seu dever para a população mudar de vida”, disse.

Eleitor em Barueri, o analista de recursos humanos Jefferson Portela de Sousa, 29, morador do Parque Imperial, também na periferia, pensa de forma diferente e afirma que a continuida­de atrapalha a transparên­cia.

Sousa diz gostar do bairro onde mora e acha que Barueri é uma cidade de oportunida­des, mas aponta possíveis melhorias. “A mesma gestão não trará as mudanças necessária­s nos temas de saúde e educação. Poderia ter mais qualidade nos serviços ofertados à população e também poderiam melhorar a questão da mobilidade.”

Em Barueri, uma pessoa leva, em média, 39 minutos para se deslocar de casa para o trabalho. Dessas viagens, 19% duram mais de uma hora. Os dados são do último Censo do IBGE, realizado em 2010.

Já o auxiliar administra­tivo Igor Alves, 23, que vive no bairro há 17 anos, elogia o mandato de Furlan, inclusive para a população de baixa renda.

“Barueri cresceu muito. É notório o cresciment­o que tivemos nos últimos anos. Tanto alunos mais pobres quantos os de uma classe mais alta têm o mesmo ensino em uma escola pública. A saúde também é muito acessível.”

Em 2016, a principal promessa da campanha era melhorar a área da saúde. As duas principais obras foram entregues: um centro de diagnóstic­o e um centro de especialid­ade. Furlan gosta de dizer que entrega “saúde de rico para pobre”.

Durante a pandemia de Covid-19, a cidade não precisou construir um hospital de campanha. Por outro lado, o município é o que tem mais mortes proporcion­ais na Grande São Paulo. A taxa chega a 124 mortes por 100 mil habitantes —na capital são 103.

Bairros da periferia, a exemplo do Parque Imperial, foram os mais atingidos. A prefeitura afirmou no começo da pandemia que o fato de a cidade ter uma circulação grande de moradores de municípios vizinhos ajudou a propagar o contágio.

Essa relação com as cidades próximas alimenta algumas tensões. Em 2018, Furlan ameaçou fechar as portas da cidade, caso os prefeitos vizinhos não melhorasse­m os próprios serviços.

Já na convenção partidária deste ano, amenizou o tom, afirma que as cidades melhoraram e que um hospital regional, promessa do governador João Doria (PSDB), aliviará o setor.

Ainda no evento, repetiu que entregará uma cidade “infinitame­nte melhor” daqui a quatro anos. Ao mesmo tempo, deixou em aberto se poderia deixar o mandato para disputar o governo do estado. Também disse desejar o surgimento de uma nova liderança local.

Mas quem é de Barueri sabe que essa fila já tem a filha, a deputada federal Bruna Furlan (PSDB), o filho Rubinho, atual vice-presidente municipal do PSDB, além do irmão e vereador Toninho Furlan (PDT).

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