Folha de S.Paulo

Jogo com cabeça de Bolsonaro em SP traz ameaças a coletivo de arte

Os americanos do Indecline também organizara­m peladas pelo mundo com figuras de líderes como Trump e Putin

- João Perassolo

Um adolescent­e vê vídeos do presidente Jair Bolsonaro sentado numa escadaria estampada com um grafite da vereadora assassinad­a Marielle Franco. Em seguida, guarda o celular e sai andando de skate pelas ruas de São Paulo, passando pelo Minhocão. Ele chega a um cemitério e retira de um túmulo a cabeça de Bolsonaro enrolada num saco de lixo e então usa essa parte do corpo como bola numa partida de futebol num campo do bairro.

A pelada com a cabeça do presidente é o mais novo capítulo do projeto “Freedom Kick”, ou chute da liberdade, uma ação do coletivo americano de arte de rua Indecline com o artista plástico espanhol Eugenio Merino. A iniciativa promove partidas de futebol amador em que as bolas são réplicas de silicone de cabeças de líderes que o gupo define como populistas —além do brasileiro, já entraram em campo o russo Vladimir Putin e o americano Donald Trump.

Segundo um representa­nte anônimo do Indecline —o coletivo não revela a identidade de seus integrante­s—, o futebol tem peso maior do que a religião, globalment­e, mesmo fora da época da Copa do Mundo. Além disso, é uma forma de reunir as pessoas, muito importante para famílias inteiras na Europa e nas Américas Central e do Sul. Por isso o esporte foi escolhido para criticar líderes que o grupo define como ousados.

A pelada em São Paulo aconteceu no bairro do Bom Retiro, com operários e pessoas que discordam do atual governo, afirma a fonte anônima. No final da partida, um dos membros do time entregou a cabeça destruída de Bolsonaro para um cachorro labrador, que se refestelou com seu novo brinquedo.

As cabeças foram criadas com silicone, um material que possibilit­a simular a pele humana com feições bastante realistas, afirma Merino, o artista responsáve­l pela produção das peças.

“O silicone não engrandece o personagem; o bronze converte o personagem em algo que se tem que respeitar”, diz, lembrando que o metal é com frequência empregado na produção de estátuas. Foram necessário­s dois meses para fazer a cabeça de Bolsonaro.

Depois da divulgação do vídeo brasileiro no Instagram do coletivo, seus integrante­s passaram a receber ameaças de morte, uma resposta que já era esperada, dado o histórico de ações controvers­as do grupo, segundo o informante. Formado em 2001 por grafiteiro­s, skatistas, fotógrafos e ativistas, o Indecline realiza projetos com o objetivo de chocar, como quando instalou um boneco de Trump atrás das grades dentro de uma suíte luxuosa da Trump Tower, em Nova York.

Há cerca de 3.000 comentário­s no post do vídeo da pelada no Instagram do Indecline —muitos afirmam que o coletivo desrespeit­ou Bolsonaro e ameaçam seus integrante­s de prisão. “Ele [Bolsonaro] se ofende com homossexua­lidade, feminismo e socialismo, mas fica excitado com toda fantasia de violência contra seus oponentes políticos.”

Também foi gravada uma partida com um réplica da cabeça de Putin no gramado em frente ao Congresso americano, em Washington, e outra com a cabeça de Trump na fronteira do México com os Estados Unidos —esta foi jogada por mexicanos junto à grade que separa Tijuana de San Diego. Viktor Orbán, premiê da Hungria, e Rodrigo Duterte, presidente das Filipinas, devem ser os próximos.

As cabeças destruídas pelos chutes serão exibidas em galerias de arte da Holanda e da Espanha, ainda neste ano, junto com vídeos e fotos das partidas. A ideia é também promover uma partida de futebol em que os visitantes das mostras joguem com as cabeças. Não há uma data nem local de exibição definidos para o Brasil, tanto pela logística do transporte de obras durante a pandemia quanto pela segurança dos envolvidos.

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 ?? Jason Goodrich / Indecline ?? De cima para baixo, peladas com as cabeças dos presidente­s Donald Trump, dos EUA, Jair Bolsonaro, do Brasil, e Vladimir Putin, da Rússia, feitas por Eugenio Merino
Jason Goodrich / Indecline De cima para baixo, peladas com as cabeças dos presidente­s Donald Trump, dos EUA, Jair Bolsonaro, do Brasil, e Vladimir Putin, da Rússia, feitas por Eugenio Merino
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