Folha de S.Paulo

Fui vítima de patriotism­o reverso

Que país esse tal ‘Magazine’ quer construir?

- Renato Terra Roteirista e autor de ‘Diário da Dilma’. Dirigiu o documentár­io ‘Uma Noite em 67’

Patriotas, prestem atenção!

Tem uma loja aí com nome de “Magazine” querendo contratar pessoas negras. A empresa ainda teve a cara de pau de publicar um manifesto que diz o seguinte: “Todos sabemos sobre o passado ancestral da população negra no Brasil, a escravidão por décadas foi uma história que deixou reflexos sociais que excluem pessoas negras. Precisamos caminhar juntos nesse processo histórico que só pode ser reparado quando entendemos o impacto do que é estrutural e hoje queremos derrubar essa barreira através da oportunida­de repaginand­o essa história”.

Em primeiro lugar, “Magazine” é uma palavra francesa. “Luiza” tem origem germânica. Nem sequer são patriotas a ponto de botar uma Estátua da Liberdade na frente das lojas.

Ou seja: não entendem nada de Brasil.

Eu, que sou homem branco conservado­r, que ando vestido de verde e amarelo e sonego meus impostos em dia, eu sou o VERDADEIRO PATRIOTA.

E me senti excluído pela primeira vez na vida. Então o verdadeiro patriota não pode virar trainee numa loja de departamen­tos? Pela primeira vez me senti como um negro ou (pior) como um travesti, que são excluídos dos processos seletivos desde sempre. E o verdadeiro patriota não pode se sentir como um negro ou um travesti.

Por isso, cidadãos de bem, prestem atenção! O que essa loja comunista de departamen­tos quer, na verdade, é o patriotism­o reverso.

Que país esse “Magazine” quer construir? Um país onde negros, mulheres, travestis tenham igualdade de condições para competir com os VERDADEIRO­S PATRIOTAS?

Só pode ser piada. Eles não conhecem o Brasil! Não estudaram a nossa história! Desde o descobrime­nto, passando pelas capitanias hereditári­as, pela Independên­cia, pela política do café com leite, pela eleição do Bolsonaro, os VERDADEIRO­S PATRIOTAS sempre lutaram como verdadeiro­s bandeirant­es para impedir que isso acontecess­e. E vamos continuar lutando.

O Brasil nunca chegará nem perto da igualdade social, racial ou sexual. Nem da liberdade! Nem dessa frescura de fraternida­de! Isso é coisa de maconheiro comunista que importa essas ideias da França e vem chamar loja de “Magazine” e roubar nossos empregos.

Patriotas! Vamos defender a nossa Pátria! Eles não amam o Brasil como nós! Anauê!

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Débora Gonzales

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