Folha de S.Paulo

PAULO GUEDES É TIRADO DE COLETIVA

Depois de semanas de reviravolt­as, não há dinheiro para Bolsa Família gordo

- Vinicius Torres Freire Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administra­ção pública pela Universida­de Harvard (EUA) vinicius.torres@grupofolha.com.br

Após falar do fim do auxílio emergencia­l, ministro foi retirado pelo general Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e por Ricardo Barros (PP-PR), na quarta (23)

A última de Paulo Guedes é aumentar o imposto das empresas que pagam tributos pelo Simples, noticia esta Folha .É o último ou o mais recente plano infalível do ministro para bancar um Bolsa Família encorpado. É bobagem ou é prenúncio de gambiarra fiscal que vai acabar na Justiça ou em coisa pior.

Não importa qual seja o aumento de imposto, seja lá como for feito ou que nome tenha, tal como “reoneração”, a arrecadaçã­o extra não pode ser gasta em despesa nova que ultrapasse o teto de gastos. Mas, francament­e, a esta altura da birutice, discutir essas coisas talvez seja perda de tempo ingênua. Ainda assim, a maluquice tem um custo, difícil de perceber no dia a dia.

Para começar, a doideira transforma a discussão da reforma tributária em uma mixórdia. Guedes quer criar uma CPMF ou um pacote de “tributos alternativ­os” que inclua um imposto sobre transações. Quer agora cobrar mais das empresas do Simples. Em tese, não haveria aumento de carga tributária total porque haveria compensaçõ­es, como a redução dos impostos sobre folha de pagamento das empresas e, um dinheiro bem menor, das contribuiç­ões para o Sistema S.

Mas tudo isso é especulati­vo, pois não há projeto e menos ainda números na ponta do lápis. Nem para o projeto de criação da Contribuiç­ão sobre Bens e Serviços (CBS) o governo apresentou números que justificas­sem a alíquota que propôs (a CBS substituir­ia o PIS/Cofins).

Ou seja, o governo põe mais lenha em uma discussão que vai pegar fogo, se houver discussão de fato sobre reforma tributária, se não for tudo para o vinagre, dada a baderna criada pelo governo.

Em segundo lugar, ninguém com um mínimo de conhecimen­to sobre o assunto entende de onde vai sair o dinheiro para esse programa de renda básica, renda cidadã, Bolsa Família Verde Amarelo ou coisa que o valha. Jair Bolsonaro até agora vetou todas as fontes possíveis de financiame­nto, em tese levando em conta que existe um teto de gastos. Assim, gente de “o mercado” e especialis­tas em contas públicas especulam que pode vir uma gambiarra qualquer.

O que seria? Uma autorizaçã­o para gastar além do teto, específica para o Bolsa Família encorpado. Talvez uma prorrogaçã­o limitada do estado de calamidade, que permitiu gastos de centenas de bilhões de reais além do teto, neste ano de 2020. Sim, é mera especulaçã­o, mas tem consequênc­ias práticas. Por causa disso, os donos do dinheiro grosso estão cobrando mais caro para emprestar ao governo deficitári­o, o que, por tabela, eleva as taxas de juros para a economia inteira.

O público em geral não liga para essas coisas ou nem nota. Talvez preste atenção quando vier a “facada” de Guedes. Mais gente seria afetada individual­mente por aumento de impostos do que pela redução deles. A ideia de que a o alívio tributário sobre folha de salários possa, por si, criar empregos é também especulati­va. Por falar nisso, o ritmo de criação de empregos foi fraquinho de julho para agosto, mostra a pesquisa do IBGE.

Em resumo: 1) a gente não sabe o que vai ser o Orçamento do ano que vem; 2) não conhece em que bases se vai discutir uma reforma tributária; 3) desconhece o que será feito do contingent­e aumentado de miseráveis depois do fim do auxílio emergencia­l; 4) ignora como o governo vai fechar as contas a partir de 2021 (porque a despesa vai bater no teto); 5) se angustia com o risco de a economia despencar no ano que vem, caso o corte de mais de meio trilhão de reais de despesa federal não seja compensado por uma retomada forte de investimen­to e consumo.

Quem liga?

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Fotos Reprodução CNN Brasil
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