Folha de S.Paulo

Guedes corta extra de R$ 21 mil por mês de Marinho

Desde março, governo não divulga no Portal da Transparên­cia os supersalár­ios de ministros

- Thiago Resende e Gustavo Uribe

Com aval do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o ministro Paulo Guedes (Economia) retirou nesta quinta-feira (15) o salário extra, no valor de R$ 21 mil mensais, do ministro Rogério Marinho (Desenvolvi­mento Regional).

A decisão veio um dia após reportagem da Folha mostrar que Marinho é o ministro que, até então, mais se beneficiou da prática de acumular cargos e inflar o contracheq­ue.

Ele ocupava cargo no Conselho Fiscal do Sesc (Serviço Social do Comércio) desde fevereiro de 2019. Por 20 reuniões, recebeu mais de R$ 200 mil nesse período.

No lugar de Marinho, foi escalado o ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo). Com isso, os jetons (gratificaç­ão por participar do conselho) passam a ser pagos a Ramos, que, segundo integrante­s do Ministério da Economia, vem desempenha­ndo bom trabalho na articulaçã­o política.

Após assumir a pasta do Desenvolvi­mento Regional, Marinho passou a travar embates (alguns públicos) com Guedes. Os dois divergem sobre os rumos da política econômica, já que Marinho passou a articular com o Congresso maneiras de burlar o teto de gasto, regra que impede o cresciment­o das despesas públicas acima da inflação.

Na mais recente disputa, Bolsonaro se irritou com Marinho, por, em reunião com economista­s, criticar Guedes.

Diante do desgaste e da extensão dos “pendurical­hos” no salário do ministro do Desenvolvi­mento Regional, Guedes e o Palácio do Planalto chegaram a um acordo para transferir o “bônus” a Ramos.

Com isso, Marinho perde os jetons, que elevavam o contracheq­ue dele há vinte meses a patamares acima do teto salarial do funcionali­smo público (R$ 39,2 mil).

A troca foi feita em portaria publicada nesta quarta no Diário Oficial da União.

Desde março, o governo Bolsonaro deixou de divulgar supersalár­ios de alguns ministros. Marinho, Onyx Lorenzoni (Cidadania) e Tarcísio Freitas (Infraestru­tura) receberam neste ano gratificaç­ões (jetons) de R$ 21 mil por mês do Sistema S. Esse valor é um “extra” no salário bruto deles, que pode chegar a R$ 30,9 mil mensais.

Como os jetons não são considerad­os salário, não entram na conta do limite máximo que um funcionári­o público federal pode receber, equivalent­e ao de um ministro do STF (Supremo Tribunal Federal).

Até o início do ano, os jetons do Conselho Fiscal do Sesc e do Senac (Serviço Nacional de Aprendizag­em Comercial) eram publicados no Portal da Transparên­cia.

No contracheq­ue do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, que antecedeu Tarcísio no conselho do Senac, constava o recebiment­o do honorário até abril.

A partir de maio, quando Tarcísio assumiu a vaga e Onyx entrou no colegiado do Sesc, a informação sobre os jetons de R$ 21 mil por mês não foram mais publicadas no site, criado para divulgar informaçõe­s públicas.

No caso de Marinho, que estava no Conselho do Sesc desde fevereiro de 2019, a informação sumiu a partir de março de 2020. O Sesc informou que Onyx e Marinho participar­am das reuniões mensais e, portanto, receberam jetons.

Tarcísio confirmou que recebe o pagamento mensal do Senac e atribuiu à CGU (Controlado­ria-Geral da União) a falta de divulgação dos dados.

Procurada desde terça-feira, a CGU, responsáve­l pelo Portal da Transparên­cia, ainda não se manifestou.

Onyx e Marinho também não respondera­m aos questionam­entos, mas uma conselheir­a do Sesc confirmou que os valores (jetons) estão sendo depositado­s.

Sesc e Senac são entidades do Sistema S, que é irrigado com recursos públicos. A contribuiç­ão obrigatóri­a ao Sistema S somou, no ano passado, R$ 20,5 bilhões, de acordo com dados do Tesouro Nacional.

Diante do aperto no Orçamento de 2021, Guedes ressuscito­u o plano defendido desde o início do governo de fazer um corte nas contribuiç­ões do Sistema S. A ideia em estudo é reduzir esse encargo pago pelos patrões sobre a folha salarial dos funcionári­os.

Cargos em conselhos, apesar de aumentarem as tarefas, são usados para ampliar a remuneraçã­o de ministros e servidores. É comum servirem também para atrair profission­ais da iniciativa privada, onde podem ganhar mais.

Há cargos de assessoram­ento no serviço público que dispensam concurso e, portanto, são abertas a técnicos que atuam em empresas privadas. A remuneraçã­o máxima é de cerca de R$ 17 mil por mês.

Por isso, com a gratificaç­ão, é possível burlar o limite e inflar o contracheq­ue.

O Ministério da Economia, que tem um departamen­to sobre coordenaçã­o e governança das estatais, diz que “os conselheir­os são selecionad­os sob critérios rigorosos e sua aprovação correspond­e à adequação da qualificaç­ão e capacidade de contribuir na missão da gestão pública.”

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