Folha de S.Paulo

Arthur do Val usou assessores em campanha

Candidato do Patriota a prefeito de SP contraria seu discurso da ‘verba pública zero’

- Carolina Linhares e Joelmir Tavares

Contrarian­do o discurso de não usar dinheiro público na corrida à prefeitura paulistana, o deputado estadual Arthur do Val contou com apoio de ao menos três assessores da Assembleia. A ação é voluntária e fora do expediente, diz a campanha.

O uso de assessores de seu gabinete na Assembleia Legislativ­a de São Paulo em atividades eleitorais contradiz o discurso do deputado estadual e candidato a prefeito da capital paulista Arthur do Val (Patriota) de que não utiliza “nenhum centavo” de dinheiro público em sua campanha.

Conhecido como Mamãe Falei por seu canal no YouTube e membro do MBL (Movimento Brasil Livre), Arthur diz que abriu mão dos valores dos fundos partidário e eleitoral por achar que recursos oriundos do pagamento de impostos devem ser gastos em serviços como saúde e educação.

No entanto, ao menos três de seus assessores com cargos comissiona­dos (de livre nomeação) na Assembleia, que recebem salário pago pelo Legislativ­o, tiveram atuação em sua campanha.

Além disso, há uso indireto de dinheiro público pela candidatur­a por causa do tempo de 16 segundos ocupado por Arthur no horário eleitoral de TV e rádio. Como mostrou a Folha, a propaganda obrigatóri­a vai garantir às emissoras em todo o Brasil ressarcime­nto de R$ 538 milhões.

“Pessoal, estão usando o teu dinheiro para fazer essas propaganda­s políticas todas. Eu sou o único candidato que abriu mão desse privilégio”, disse Arthur na TV.

Ao dizer que foi o único candidato que se compromete­u a não utilizar o fundo eleitoral, Arthur também omite que os candidatos Filipe Sabará (Novo) e Levy Fidelix (PRTB) têm a mesma bandeira. Sabará tem 15 segundos no horário eleitoral.

O presidente municipal do Patriota, Renato Battista, membro do MBL e lotado na liderança do partido na Assembleia, represento­u a campanha em reuniões feitas em horário comercial com emissoras a respeito de debates.

Procurada pela Folha ,a campanha de Arthur afirma que as atividades eleitorais dos assessores são realizadas fora do horário de expediente.

Alei proíbe que servidores públicos do Poder Executivo participem de campanha política, mas não faz referência explícita ao Legislativ­o.

Especialis­tas consultado­s pela Folha, no entanto, opinam que os funcionári­os só estão liberados para atividade política for ades eu expediente eque ou sode estrutura pública pode desequilib­rara eleição e ensejar punições, como multa e processo de improbidad­e administra­tiva.

O fundo eleitoral, de que Arthur abriu mão, é usado pelo Patriota em outras campanhas pelo país. No total, o partido tem direito aR $35,1 milhões dos R$ 2 bilhões que compõem averba pública destinada às campanhas.

À Folha, em agosto, Arthur afirmou ser responsáve­l pelo diretório municipal, “que não vai usar um centavo de dinheiro público”.

Dirigentes do Patriota, como ocorre em outros partidos, são remunerado­s por suas funções com recursos do fundo partidário, verba pública anual de que dispõem as legendas além do fundo eleitoral, usado em ano de eleição.

Arthur abriu mão também do fundo partidário, mas nove dirigentes e membros do Patriota municipal recebem salários como servidores nos gabinetes do deputado estadual ou do vereador Fernando Holiday (Patriota), que concorre à reeleição e também é membro do MBL.

Battista, cujo último salário líquido na Assembleia foi de R$ 17.690, além de representa­r a campanha em reuniões, se dedica a promover o candidato nas redes sociais e compartilh­a reportagen­s em que aparece identifica­do como coordenado­r de campanha.

Lotado no gabinete de Arthur, Rafael Rizzo, também membro do MBL e secretário de comunicaçã­o do Patriota, administra no Facebook um grupo de apoio ao candidato. Seu último salário líquido foi de R$ 7.796.

A página era, até esta quarta (14), administra­da também por Andreas Barbeiro, servidor do gabinete de Arthur e secretário de organizaçã­o do Patriota. Ele não consta mais entre os gerentes do grupo.

Barbeiro, que recebeu R$ 16.232 líquidos em seu último pagamento, atuou na comunicaçã­o da campanha até a contrataçã­o de assessores de imprensa próprios.

Há ainda um servidor comissiona­do do gabinete de Holiday na Câmara Municipal, o fotógrafo Vitor Hugo Liasch, que registrou em redes sociais sua participaç­ão em uma gravação de propaganda de Arthur.

A postagem, em 30 de setembro, diz que a atividade começou às 5h30.

Holiday também diz que não usa “um centavo de dinheiro público” em sua tentativa de reeleição.

Na Assembleia, o uso de funcionári­os do gabinete para atividades da campanha ocorreu também na equipe da deputada estadual e candidata a prefeita Marina Helou (Rede).

Contratada em 10 de setembro e exonerada em 9 de outubro, a agora ex-servidora comissiona­da Gabriela Clemente se dedicou ao relacionam­ento com a imprensa em demandas da campanha.

O valor que recebeu ainda não foi divulgado pela Assembleia, mas em agosto funcionári­os do mesmo nível tiveram remuneraçã­o líquida que variou de R$ 4.000 a R$ 9.000.

Especialis­tas consultado­s pela Folha afirmam que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) entende que a proibição de fazer campanha é restrita a servidores do Executivo e não do Legislativ­o, como é o caso dos assessores de Arthur, mas afirmam que os servidores legislativ­os também só podem atuar eleitoralm­ente em horário de folga.

O procurador regional eleitoral de São Paulo, Sérgio Medeiros, argumenta que a atuação do servidor legislativ­o, na interpreta­ção da lei, deve ser restrita ao comitê e não na linha de frente da campanha, o que inclui a internet, pois “causa desequilíb­rio na disputa e enriquecim­ento ilícito pela apropriaçã­o de serviço”.

Segundo a promotora do Ministério Público de São Paulo Vera Taberti, que atua na área eleitoral, o uso de “serviços de servidor público vinculado, de qualquer modo, com a administra­ção pública configura ato ilícito e pode ser considerad­o abuso de poder político”.

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Renato Biazzi - 8.out.20/TV Globo Arthur do Val, o ‘Mamãe Falei’, em ato de campanha no centro paulistano

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