Fux quer que decisões liminares sejam enviadas imediatamente ao plenário
Presidente do STF diz a aliados que pretende propor mudança no regimento após caso André Rap
Após cassar a decisão de Marco Aurélio Mello que determinou a soltura de André de Oliveira Macedo, 43, conhecido como André do Rap, um dos líderes do PCC (Primero Comando da Capital), o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luiz Fux, quer levar ao debate da próxima sessão administrativa proposta para que liminares concedidas individualmente por ministros sejam imediatamente submetidas ao plenário.
O habeas corpus concedido ao traficante, que foi revogado quando ele já havia saído da prisão, reforçou as tratativas nos bastidores para que o tribunal crie um mecanismo que evite que decisões monocráticas perdurem no tempo sem serem analisadas pelo conjunto de ministros.
Embora tenha sido ele próprio alvo de críticas em julgamento nesta semana por ter sustado individualmente a ordem do colega, Fux tem dito nos bastidores do tribunal que quer evitar a monocratização no Supremo.
O presidente do STF ressaltou a pessoas próximas que um dos seus lemas será priorizar as decisões coletivas e reinstitucionalizar o Supremo.
Ele chegou a dizer a interlocutores, por exemplo, que desgastou a imagem do tribunal a concessão do habeas corpus a André do Rap.
A ordem de soltura ocorreu dias após a corte decidir que as ações penais passarão a ser julgadas pelo plenário, o que foi considerado uma vitória expressiva dos defensores da operação Lava Jato e uma derrota da ala garantista da corte, que prioriza o direito dos investigados em detrimento dos poderes dos investigadores.
Fux ainda avalia que a libertação do traficante, após decisões tomadas em instâncias inferiores e a um custo elevadíssimo da operação da Polícia Federal que o deteve, além de ter equívocos jurídicos, maculava a imagem do Supremo.
“Eu não quero fazer biografia. Eu fico com a que eu já tenho. Eu quero que o Supremo Tribunal Federal alcance o respeito que a corte merece”, disse o ministro.
A discussão sobre a necessidade de regulamentação de todas as ordens monocráticas, independentemente de envolver revogação de despacho de colega, não é novidade no tribunal. Outras decisões individuais já foram alvo de contestação.
Em 2018, o ministro Marco Aurélio deu uma liminar que suspendeu a prisão de pessoas que estivessem presas após condenação em segunda instância, sem o trânsito em julgado. A medida foi reformada pelo então presidente do STF, Dias Toffoli, durante um recesso do Judiciário.
Em julho deste ano, os ministros começaram a analisar em sessão administrativa virtual uma mudança no regimento segundo a qual toda medida cautelar precisa ser referendada em seguida em colegiado. O julgamento foi suspenso para análise de destaques de ministros.
Em agosto, a discussão sobre o tema foi retomada, mas interrompida novamente por solicitação de Fux, que pediu vista. Agora, ele deve retomar o debate do caso.
A emenda regimental foi proposta pelos ministros Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso e recebeu sugestões de alterações.
Segundo a última versão da proposta, a medida cautelar concedida por um só ministro deve ser incluída na pauta da sessão virtual “imediatamente posterior” à decisão. Pelo texto, o relator também ficaria autorizado a levar o caso à sessão plenária presencial.
Barroso, porém, afirmou no julgamento de André do Rap que o tribunal precisa pensar uma espécie de “fast track”, uma via expressa que submeta a decisão individual ao plenário virtual e de forma mais rápida do que o procedimento atual de inclusão dos processos no ambiente online.
O ministro disse que geralmente a inclusão dos processos no ambiente virtual leva uma semana e a sessão online tem duração de mais uma semana. No caso do traficante, por exemplo, o período para uma revisão colegiada do despacho de Marco Aurélio seria o suficiente para ele fugir.
Barroso, Alexandre de Moraes, Toffoli e Celso de Mello se posicionaram a favor da mudança no regimento. Já Marco Aurélio se posicionou contra a ideia.
Nesta semana, o debate sobre decisões monocráticas voltou à tona no julgamento que manteve a revogação do habeas corpus concedido a André do Rap por 9 a 1. Embora tenham mantido a decisão de Fux que revogou ordem de Marco Aurelio, todos os ministros fizeram ressalvas à atuação individual da presidência contra atos de outros ministros.
O temor dos magistrados é que, de algum modo, o caso tenha criado um precedente que autoriza o presidente do Supremo a revogar despachos de outros colegas. Isso porque, apesar de os magistrados terem feito ressalvas à atuação individual de Fux no julgamento de André do Rap, ao final foi referendada sua decisão no sentido de sustar efeitos de entendimento de outro ministro.
A obrigatoriedade de remeter a decisão individual à sessão seguinte no plenário, porém, reduz esse poder.
Isso porque, sem a mudança no regimento, o presidente passa a ter competência para suspender decisão de colega, além de ter o poder de controlar a pauta, tornando eventualmente uma decisão irrecorrível, uma vez que não há como forçar o presidente a pautar qualquer matéria no plenário da corte.
No julgamento desta quinta-feira (15), Fux foi criticado e Marco Aurélio chegou a chamar o colega de autoritário.
Fux se defendeu e avaliou que a suspensão da liminar foi incidente “excepcionalíssimo”, mas válido como “medida extrema”. O ministro justificou que a medida pode ser tomada se há risco à ordem e segurança pública.
O presidente do STF também reforçou que levou o caso rapidamente ao plenário em “respeito ao colegiado”.
“Eu não tenho nenhuma pretensão de ter superpoderes. Mas eu tenho a pretensão de manter a imagem do Supremo Tribunal Federal”, disse o ministro Fux.
Gilmar Mendes também criticou a atuação monocrática do presidente apesar de ter se posicionado a favor da revogação do habeas corpus para André Rap.
Fux se defendeu das críticas dos colegas e disse que tem honrado seu discurso de posse como presidente da corte de priorizar o colegiado em detrimento de despachos individuais. “E aí, ministro Gilmar, vossa excelência que tem experiência, eu pergunto: qual presidente que trouxe suspensão de liminar no plenário? Nenhum. Nenhum”, argumentou em resposta.