Anvisa cria regras para imunização emergencial
Imunizante que receber o aval não poderá ser distribuído pela rede privada e ainda precisará de registro para uso em massa
Imunizante que receber o aval não poderá ser distribuído pela rede privada e ainda precisará de registro para uso em massa.
brasília A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) informou na tarde desta quarta (2) que vai passar a conceder autorizações temporárias e emergenciais para vacinas contra a Covid-19. Na prática, isso significa que podem ser emitidas autorizações para a aplicação de determinadas vacinas em alguns grupos da população, mesmo que esses imunizantes ainda não tenham registro na agência.
A Anvisa vai seguir, portanto, o exemplo de outros órgãos internacionais, como a americana FDA (sigla em inglês para Administração de Alimentos e Medicamentos).
Segundo o gerente de medicamentos, Gustavo Mendes, essas vacinas não poderão ser comercializadas.
“Elas só poderão ser utilizadas no que a gente chama de uso institucional. Só poderão ser destinadas a programas de governo, programas específicos para que se possa ter um controle e que fique muito claro que é uma autorização de uso emergencial com um foco muito específico”, afirma.
A Anvisa afirma que a autorização para uso emergencial já estava prevista em seus regulamentos e que neste momento, após intercâmbio de informações com as demais agências regulatórias do mundo, foi possível reunir informações e criar uma proposta para adotar esse modelo.
Será a primeira vez que a agência poderá conceder esse tipo de autorização. Um guia com as regras para esse processo foi criado para ser encaminhado aos laboratórios.
Mendes explica que o registro para um imunizante ou medicamento só é conferido quando a empresa interessada já apresenta dados completos sobre os estudos. No caso das autorizações emergenciais, os medicamentos ainda estão em fase experimental.
Ele acrescenta que os pedidos para autorização emergencial precisam delimitar um grupo específico para receber a vacina, como idosos ou profissionais da saúde. A Anvisa vai inclusive demandar uma quantidade específica de pessoas que se pretende imunizar.
“Se observarmos que existe um risco-benefício bastante claro e positivo, então a autorização de uso emergencial se justifica”, afirmou nesta tarde, em entrevista virtual a jornalistas. A agência acrescenta que as autorizações emergenciais continuarão válidas enquanto durar a “situação de emergência” devida à pandemia.
A imunização vai ser feita exclusivamente no âmbito do SUS (Sistema Único de Saúde), uma vez que as empresas e laboratórios que obtiveram a autorização estão proibidos de comercializar e promover uma vacinação em massa.
Mendes não quis estipular prazos para a concessão da autorização após o início do processo. A Anvisa ressalta que a autorização emergencial não substitui em hipótese alguma a necessidade de registro para que um imunizante seja aplicado em massa e comercializado no Brasil.
As decisões no âmbito da agência se darão por meio da Diretoria Colegiada, que podem se reunir de maneira extraordinária para avaliar os pedidos, com base em subsídios fornecidos pela área técnica.
“Serão considerados dados de estudos não clínicos e clínicos, de qualidade, boas práticas de fabricação, estratégias de monitoramento e controle e resultados provisórios de ensaios clínicos, entre outras evidências científicas”, informou a agência. “Além disso, a empresa deve apresentar informações que comprovem que a fabricação e a estabilidade são adequadas para garantir a qualidade da vacina.”
A Anvisa esclarece que podem pedir a autorização emergencial as empresas e laboratórios que já possuam autorização da agência para fabricar ou importar produtos.
É necessário que a agência candidata à autorização emergencial já esteja em fase 3 de ensaios clínicos, etapa final e na qual os testes abrangem uma parcela maior da população, conduzidos no Brasil.
Além disso, os candidatos a se imunizarem com essas vacinas precisam assinar um termo de consentimento.
Antes de encaminhar a documentação, as empresas ainda precisam se reunir com representantes da agência. Até a noite desta quarta, nenhum pedido de reunião para dar início ao processo havia sido protocolado na agência.
Existem atualmente no Brasil quatro vacinas em fase de testes clínicos de fase 3. A maior parte delas já adotou o procedimento de “submissão contínua” de documentos, procedimento estabelecido pela Anvisa para agilizar a obtenção do registro. No entanto, segundo Mendes, “o que a gente avaliou de submissão contínua até o momento representa em torno de 10% a 20% do que é importante para o registro.”
Também nesta quarta, o Reino Unido se tornou o primeiro país do Ocidente a autorizar uma vacina contra a Covid-19 —o imunizante da Pfizer.
Pazuello diz que há até três opções de vacina para o Brasil
O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, afirmou que são “uma, duas ou três” as opções de laboratórios que desenvolvem vacinas contra a Covid-19 em quantidade suficiente e um bom cronograma para atender as necessidades do Brasil.
Pazuello também disse que 15 milhões de doses de vacina devem chegar ao país no início de 2021. A quantidade representa a metade do que o ministério vinha informando que receberia no primeiro mês de 2021. Em diversas ocasiões, técnicos da pasta e da Fiocruz afirmaram que 30 milhões de doses estariam disponíveis em janeiro. O acordo assinado por R$ 1,9 bilhão prevê a entrega de 100 milhões de doses no primeiro semestre.
“Em janeiro e fevereiro, já começam a chegar 15 milhões de doses dessa encomenda tecnológica da AstraZeneca e de Oxford com a Fiocruz. E no primeiro semestre chegaremos a 100 milhões de doses. No segundo semestre, já com a tecnologia transferida pronta, nós poderemos produzir com a Fiocruz até 160 milhões de doses a mais. Só aí são 260 milhões de doses.”
Na tarde desta quarta (2) a Câmara aprovou a liberação do R$ 1,9 bilhão para a compra e a produção de 100 milhões de doses da vacina.
Em agosto, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) publicou uma medida provisória abrindo espaço no Orçamento para viabilizar a aquisição. Uma medida provisória passa a valer assim que é publicada, mas precisa do aval da Câmara e do Senado em 120 dias.
A proposta foi aprovada por unanimidade (em votação simbólica) na Câmara, com o apoio até mesmo da oposição a Bolsonaro. O texto segue agora para o Senado, que precisa votar a liberação dos recursos até a quinta-feira (3).
Pazuello participou na manhã desta quarta de audiência pública na comissão mista do Congresso, que acompanha as ações de enfrentamento ao novo coronavírus e a execução orçamentária durante a pandemia.
Ele afirmou que existe muita publicidade relacionada às vacinas, mas que as propostas se mostram insuficientes após escrutínio. “Queria deixar uma coisa clara: ficou muito óbvio que são muito poucas as fabricantes que têm a quantidade e o cronograma de entrega efetivo para o nosso país. Quando a gente chega ao final das negociações e vai para cronograma de entrega, fabricação, os números são pífios”, disse. “Números de grande quantidade realmente se reduzem a uma, duas ou três ideias. A maioria fica com números muito pequenos para o nosso país.”
O ministro deixou mais cedo a audiência, alegando ter sido convocado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para participar de reunião ligada ao PPI (Programa de Parceria de Investimentos), ligado ao Ministério da Economia.
Nas últimas semanas, representantes do Ministério da Saúde receberam os principais laboratórios que desenvolvem vacinas contra a Covid-19 para reuniões. Por enquanto, o Brasil mantém acordos garantidos para obter 142 milhões de doses de vacinas no primeiro semestre, sendo 100 milhões fruto da parceria da Fiocruz com o laboratório AstraZeneca e outras 42 milhões previstas no consórcio Covax Facility.
Ao explicar a participação brasileira na Covax Facility, o ministro afirmou que o país adquiriu 42 milhões de doses que podem ser fornecidas por qualquer um dos fabricantes que integram o consórcio, “inclusive, a própria AstraZeneca e a Pfizer, por exemplo, estão no consórcio”, acrescentou. A Pfizer, no entanto, ainda negocia sua adesão ao grupo.
A fala de Pazuello, abrindo a possibilidade de aquisição da vacina da Pfizer, no mesmo dia dos acontecimentos do Reino Unido, representam uma mudança na posição do ministério. Na manhã desta terça, o secretário de Vigilância em Saúde do ministério, Arnaldo Medeiros, afirmou que uma vacina para integrar o plano de vacinação brasileiro precisaria “fundamentalmente” ser termoestável por longos períodos em temperaturas de 2°C a 8°C.
A vacina da Pfizer exige condições especiais de armazenamento, com temperaturas de -70º C e aguenta apenas cinco dias na temperatura padrão dos refrigeradores do sistema brasileiro. Pazuello também afirmou que o país apenas vai aplicar no território brasileiro vacinas aprovadas pela Anvisa, agência que ele definiu como “padrão-ouro”.
Em relação à obrigatoriedade da vacina para a população, o ministro afirmou que o ministério não vai determinar a imunização compulsória. Em vez disso, vai trabalhar para o convencimento da população.
Na terça, o ministério lançou um plano inicial para a vacinação da população, que será dividido em quatro etapas.