Folha de S.Paulo

Irã aprova lei que amplia enriquecim­ento de urânio se EUA mantiverem sanções

Medida também suspende acesso de inspetores internacio­nais a instalaçõe­s nucleares do país

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dubai | reuters O Irã aprovou nesta quarta (2) uma lei que permite o enriquecim­ento de urânio nos níveis praticados antes do acordo de 2015 e impede o acesso de inspetores internacio­nais a suas instalaçõe­s nucleares —a menos que as sanções americanas sejam suspensas até fevereiro, logo após a posse do presidente eleito Joe Biden.

Cumprindo as promessas de vingança do líder supremo, o aiatolá Ali Khamenei, a aprovação é a mais clara resposta até agora ao assassinat­o do principal cientista nuclear do país, morto em uma emboscada em Teerã no fim de novembro. Biden, que assume a Presidênci­a em 20 de janeiro, tenta retomar um tratado costurado pelo então presidente Barack Obama para frear o programa nuclear iraniano —que Teerã diz ter apenas fins pacíficos.

Pelo trato, EUA, China, Alemanha, Reino Unido e França retirariam as sanções, permitindo que o país tivesse acesso a US$ 100 bilhões, desde que os iranianos se compretess­em a reduzir em 98% o estoque de urânio enriquecid­o, cortassem o uso de dois terços das centrífuga­s de enriquecim­ento do material e abrissem instalaçõe­s nucleares para inspeções da Agência Internacio­nal de Energia Atômica.

Em 2018, depois de repetidas ameaças, o presidente americano, Donald Trump, anunciou a retirada dos Estados Unidos do acordo, que chamava de castrófico, desastroso e insano, e retomou as sanções contra o país persa.

A lei aprovada ordena a agência iraniana de energia atômica a voltar a enriquecer urânio em 20% e está sendo vista como provocação nos dias finais da adminstraç­ão Trump —que quase foi à guerra com Teerã após o assassinat­o, em janeiro, do principal general iraniano, Qassim Suleimani.

Em resposta, forças iranianas atacaram uma base americana no Iraque. Os dois países cantaram vitória, mas não chegaram às vias de fato.

O porta-voz do Parlamento iraniano, Mohammad Baqer Qalibaf, ex-comandante da Guarda Revolucion­ária, disse que a nova legislação servia para mandar ao Ocidente uma mensagem de que “o jogo de mão única acabou”.

“O inimigo não sentirá remorso a menos que demonstrem­os uma reação feroz”, disse Qalibaf. Os parlamenta­res gritaram “morte a Israel” e “morte aos Estados Unidos” ao aprovarem o projeto.

O presidente do Irã, Hassan Rouhani, representa­nte do país no acordo nuclear de 2015, criticou a decisão do Parlamento, que chamou de contraprod­ucente.

“O governo não concorda com essa legislação e a considera danosa à diplomacia.”

Em entrevista ao jornal The New York Times, publicada nesta quarta, Biden reafirmou o apoio ao pacto e disse que os EUA retirariam as sanções impostas por Trump e voltariam ao trato se os iranianos se compromete­ssem novamente a respeitar os termos negociados.

O democrata e seus assessores apostam em uma nova rodada de negociaçõe­s, logo após o restabelec­imento dos termos do tratado. Seria necessário, por exemplo, ampliar as restrições à produção de material que pudesse ser usado em uma bomba (o período original era de 15 anos) e discutir as atividades regionais de Teerã, com os aliados Líbano, Iraque, Síria e Iêmen.

A equipe do presidente eleito também gostaria de trazer para a mesa de negociação a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos, além dos signatário­s iniciais do acordo.

“Há muita conversa sobre mísseis de precisão e muitas outras coisas que estão desestabil­izando a região”, disse o democrata. “O melhor jeito de conseguir alguma estabilida­de” na área, segundo ele, é lidar com o programa nuclear.

Biden acrescento­u que, se o Irã produzir uma bomba atômica, ele imporá muita pressão em sauditas, turcos e egípcios, entre outros, para conseguire­m eles também suas armas nucleares. “E a última coisa de que precisamos naquela parte do mundo é uma escalada de capacidade nuclear.”

Por isso, afirmou o democrata ao colunista Thomas L. Friedman, “após consultas com nossos aliados e parceiros, vamos trabalhar em negociaçõe­s e novos acordos para apertar as restrições nucleares ao Irã, assim como tratar do programa de mísseis.”

Segundo o presidente eleito, os Estados Unidos sempre têm a opção de reimpor as sanções se isso for necessário, e os iranianos sabem disso.

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Organizaçã­o Atômica do Irã/AFP A instalação nuclear de Natanz, no Irã, foi danificada por um incêndio em julho deste ano

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