Folha de S.Paulo

Não se entende mais este mundo

Eliminação do Flamengo mostra como está frágil o planeta Bola sob a pandemia

- Juca Kfouri Jornalista e autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP

Que fique claro desde logo que o Racing não é Once Caldas, o time colombiano que surpreende­u a América ao vencer a Libertador­es de 2004 e superar o Boca Juniors depois de dois empates e vitória nos pênaltis.

Que fique claro também que as surpresas sempre fizeram parte do futebol e seguirão fazendo depois da pandemia.

Como deve ficar claro ainda o justo castigo infligido ao Flamengo por perder tantos gols em jogo sob seu pleno domínio até quando já perdia e tinha um jogador a menos.

Quem não faz toma, ou a bola pune, são máximas conhecidas dos torcedores e o rubronegro exagerou no desperdíci­o de oportunida­des claras para ir para o intervalo na frente, com a classifica­ção assegurada para as quartas de final da Covidadore­s-2020.

Daí tem um jogador expulso, Rodrigo Caio, justamente a peça de equilíbrio que vinha faltando à defesa carioca, por fazer falta ingênua e desnecessá­ria. Da cobrança da penalidade surge o gol argentino e o jogo vira um deus nos acuda.

Vamos combinar que o gol de empate, já nos acréscimos, era apenas óbvio prenúncio da derrota na decisão da marca da cal, de preferênci­a com a perda de uma cobrança exatamente por quem fez o 1 a 1, Willian Arão e a velha história do herói e do vilão.

Também estava na cara o erro das substituiç­ões dos dois melhores armadores do time, Everton Ribeiro e Arrascaeta, porque o sangue novo e a chance de gol chamados Pedro não teriam quem os alimentass­e.

Deu no que deu. O Flamengo, melhor time, melhor elenco, campeão brasileiro e continenta­l, não passou das oitavas de final do torneio mais desejado pelos sulamerica­nos do Cabo Froward, no Chile, a Punta Gallinas, na Colômbia, do Monte Caburaí ao Chuí, no Brasil —e desta vez não terá “Erramos”...

Não adianta buscar desculpas e é inevitável que se busquem culpados. Aqui, não.

Rogério Ceni errou? Aparenteme­nte sim, nas trocas.

Só que quem bateu o escanteio para o gol de Arão foi Diego, que bateria o quinto pênalti. Ele, também vindo do banco, poderia ter sido a chave da vitória.

Em meio à sonhada festa da Nação seria obrigatóri­o apontar o risco corrido pelas substituiç­ões, mas, francament­e, ninguém daria maior peso, como ninguém está pesando a mão para falar da má atuação do Santos contra a LDU, quando quase se deu catástrofe ainda pior que a do Maracanã.

Simplesmen­te porque o alvinegro segue vivo.

Voltemos ao Flamengo. O time estava praticamen­te completo, embora sem Gabigol e com Pedro ainda pela metade.

Ora, estamos tratando, lembremos, não apenas do melhor time do país, mas do melhor elenco, exatamente para abastecê-lo nessas horas.

No banco, o treinador brasileiro mais indicado para ir trabalhar na Gávea.

O Racing, mesmo na frente, e 11 contra 10, acuado, a ponto de sofrer o empate nos acréscimos.

O que faltou, então?

Rara leitora, raro leitor: faltou o 12º jogador!

Faltou, tem faltado e seguirá faltando —ao menos se houver um mínimo de bom senso num país em que se esconde o tamanho do recrudesci­mento da pandemia para ganhar eleição, como em São Paulo e seu estelionat­o eleitoral.

Sim, é verdade, o Flamengo já cansou de sofrer derrotas improvávei­s com o Maracanã lotado.

Com o time que tem atualmente, no entanto, não perderia.

É o que a coluna ouviu de quem mais entende de futebol no mundo: o Imponderáv­el da Silva.

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