Folha de S.Paulo

Carlos Henrique Schroder resgatou a credibilid­ade da TV Globo

- Tony Goes

O processo de reestrutur­ação interna do Grupo Globo está em curso desde, pelo menos, 2014. O projeto Uma Só Globo fundiu departamen­tos, eliminou cargos e mexeu nos organogram­as. A parte mais visível foi o fim dos contratos de longo prazo com estrelas. Só neste ano, deixaram a emissora Tarcísio Meira, Glória Menezes, Vera Fischer e outros.

As demissões também atingiram a alta cúpula. Em breve, nomes como Silvio de Abreu, que comandava o setor de dramaturgi­a, não farão mais parte do quadro de diretores. A razão principal, comentam, não tem a ver com competênci­a ou alterações de rota. Tem a ver com controle de custos —os salários eram altíssimos.

De todas as substituiç­ões, a de maior impacto será a de Carlos Henrique Schroder, diretor-geral da TV Globo desde 2013. Aparenteme­nte, essa é uma transição pacífica.

Um comunicado informa que já estava acertado há anos que Schroder deixaria o cargo em 202o. Mas fontes afirmam que esse desligamen­to foi, na verdade, antecipado por causa da pandemia e da queda de receitas publicitár­ias, que afeta os canais abertos.

Sua gestão deixou marcas, reposicion­ando a Globo de maneira a enfrentar as muitas mudanças por que passa a televisão como negócio.

Um grande desafio foi manter funcionand­o a todo vapor o carro-chefe da emissora, as novelas. O declínio do gênero pareceu se concretiza­r em meados da década passada. O segmento mais jovem se mostrava mais interessad­o nas séries, em detrimento dos folhetins. Sob o comando de Schroder, Silvio de Abreu conseguiu lançar dezenas de novos autores e aposentar alguns veteranos.

Tudo isso sem descuidar das séries, que tiveram suas produções aceleradas —também em função de gerar conteúdo para a plataforma Globoplay, a aposta do grupo. Este ímpeto teve um benefício inesperado. Quando a quarentena impediu novas gravações, a Globo tinha bastante material inédito para pôr no ar.

Mas o maior feito de Schroder foi a recuperaçã­o do jornalismo da emissora. Jornalista de formação —e o primeiro profission­al do setor a comandar a TV Globo, que nasceu de um jornal— o futuro ex-diretor-geral deu a Ali Kamel, que o substituiu em 2013 na direção da área de jornalismo e esportes, as condições para produzir noticiário­s mais equilibrad­os. Com profundida­de e contundênc­ia, mas sem deixar de serem acessíveis a todas as faixas do público.

A Globo minou sua credibilid­ade com episódios como a edição do debate do segundo turno das eleições presidenci­ais de 1989, que claramente beneficiav­a o então candidato Fernando Collor de Mello. E demorou a dar visibilida­de à campanha pelas Diretas.

Nenhum profission­al dessas épocas continua na casa, mas o estrago foi imenso. Pavimentou o caminho para que os incomodado­s com o jornalismo da TV Globo, à esquerda e à direita, apelidasse­m a emissora de “Globolixo”.

Carlos Henrique Schroder e Ali Kamel conseguira­m reverter boa parte desse dano. Distorções continuam a acontecer, como certa proteção incondicio­nal ao ex-juiz Sergio Moro e da Operação Lava Jato.

Mas o jornalismo da emissora é hoje, de muito longe, o melhor da TV brasileira, enquanto SBT, Record e RedeTV! competem para ver quem puxa mais o saco do governo.

Investindo no streaming e reformulan­do suas práticas internas, a Globo é a mais preparada de todas para se adaptar ao futuro —que, como diz a musiquinha, já começou.

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Reprodução William Bonner explica pane no Jornal Nacional

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