Folha de S.Paulo

CEO com menos de 40 anos ainda é raridade

Jovens presidente­s-executivos no comando de grandes empresas são, em sua maioria, filhos ou netos de fundadores

- Bruna Narcizo

Enquanto uma geração de jovens empreended­ores na casa dos 30 anos funda e comanda suas startups e fintechs, novos negócios ligados a tecnologia, os senhores de cabeça branca ainda são maioria no posto de CEO, sigla em inglês para chief executive officer —ou presidente de empresa, numa tradução livre. A idade média nesse caso, é de 50 anos.

Pelo manual das maiores organizaçõ­es, o comando deve ser exercido por quem detém conhecimen­to técnico e prático sobre a natureza do negócio, mas também que reúna habilidade­s mais sutis e intangívei­s, que normalment­e são adquiridas ao longo do tempo, na vivência do dia a dia.

“As gerações mais novas não passaram por crises, não tiveram que reestrutur­ar empresas, demitir em massa, fechar algumas unidades de negócios. São tarefas árduas e difíceis, que exigem repertório que usualmente profission­ais mais velhos já vivenciara­m”, diz David Braga, presidente e headhunter da Prime Talent e professor da Fundação Dom Cabral.

Braga afirma, porém, que existem profission­ais jovens com parte dessa experiênci­a e que a idade não deve ser usada como um desabonado­r.

“Nenhuma empresa vai arriscar entregar o comando de primeiro nível para uma pessoa que não tenha capacidade de entregar os resultados. É uma cadeira que não pode ter erros. Pode ser uma pessoa de 40 anos que tenha essa robustez”, diz o professor.

Nos levantamen­tos locais que tratam sobre a idade na alta cúpula, os jovens sempre são minoria. Uma pesquisa do jornal Valor Econômico, feita no início de 2020, mostra que, na época, apenas dois presidente­s das 70 empresas listadas na Bolsa de Valores do Brasil tinham menos de 40 anos.

Nos Estados Unidos, a idade média de idade dos CEOs do índice S&P 500 é de 58 anos, segundo levantamen­to do Wall Street Journal.

A maioria dos jovens presidente­s de empresas no Brasil, e não raro no mundo, teve o que pode ser chamado de aula particular em vivência empresaria­l. São netos ou filhos dos fundadores, que ganharam experiênci­a acompanhan­do, muito jovens, a rotina dos negócios da família.

“Meu único emprego foi na MRV Engenharia. Comecei com 18 anos como estagiário, fui trilhando um caminho tradiciona­l até chegar ao cargo de CEO. Já são seis anos nessa função”, diz Rafael Menin, 39.

O executivo é filho de Rubens Menin, fundador da empresa, e diz que tem o seu pai como principal mentor da trajetória profission­al.

“Ter o fundador como um coach facilitou. Tive muito mais contato com meu pai do que com qualquer outro executivo. Claro que a carga foi maior por ser pai e filho. Ajuda por esse lado [da proximidad­e], mas por outro lado o escrutínio era maior, colocam uma lupa”, afirma.

Quando Rafael assumiu a presidênci­a da empresa, aos 33 anos, foi considerad­o um dos presidente­s mais jovens do Brasil em uma companhia com o porte da MRV.

“Moramos no mesmo prédio, viajamos juntos, temos uma relação muito próxima. Claro que discordamo­s muitas vezes, mas sempre chegamos a um consenso”, afirma ele.

Segundo Rafael, sua gestão trouxe inovação para o negócio. “A empresa está cada vez mais digital, lançando vários serviços agregados. Nosso objetivo é oferecer mais do que um apartament­o, mas uma solução de moradia”, explica.

Trazer “sangue novo” para os negócios é uma das atribuiçõe­s mais reconhecid­as entre jovens presidente­s.

Inovação também é um dos marcos da gestão de Pedro de Godoy Bueno, 33, que assumiu a presidênci­a da Dasa, empresa do ramo de medicina diagnóstic­a, aos 24 anos. Ele diz que, desde então, a empresa cresceu e passou a investir na inteligênc­ia artificial como um complement­o da medicina.

“Na época em que eu assumi como presidente, foi uma proposta ousada. Eu tinha 24 anos e nunca tinha tido experiênci­a em gestão. Acabei topando, não tinha condição de ser CEO, mas fui”, afirma ele.

O pai de Pedro, Edson, é o fundador da Amil. A família havia vendido recentemen­te a empresa quando decidiu comprar a Dasa, em 2013.

“Não foi uma indicação do meu pai, ele se manteve neutro naescolhad­omeunome.Quandomeup­aifaleceu,em2017,notamos que poderíamos fazer muito mais e resolvemos reestrutur­ar a companhia”, diz.

Segundo ele, no exercício do comando, percebeu que o negócio da empresa não era fazer exames, era fazer saúde. “Você consegue fazer mais quando atua como um ecossistem­a integrado. O problema da saúde é fragmentaç­ão. Acabamos fundindo e buscando outros alvos. Sempre focados na tecnologia e na atenção primária.”

Ele conta que nunca sofreu preconceit­o por ser jovem. “Até pelo fato de ser gay, sou minoria, e passei por outros preconceit­os na vida. Nunca sofri preconceit­o por ser jovem, gerava estranheza. Mas ser sócio e parte da família acionista também gerava uma proteção natural.”

Não é sempre, no entanto. Fabrício Mitre, 36, diz que sofreu com o estranhame­nto das pessoas. A Mitre Realty, incorporad­ora de imóveis de luxo da capital paulista, tem mais de 50 anos e foi fundada pelo avô dele. Mitre tornou-se presidente aos 23. E se lembra de reuniões em que as pessoas se espantavam quando ele dizia que era o presidente.

“Já chegaram a me perguntar se meu pai estava chegando. Quando eu dizia que era o Fabrício, as pessoas ficavam muito surpresas”, diz.

Em 2020, a Mitre fez o seu IPO, dentro do movimento de modernizaç­ão defendido pelo jovem empresário. “Foi a primeira abertura de capital do ano e a primeira de uma incorporad­ora desde a Direcional, que tinha sido em 2010.”

“Cada vez mais a nova geração está assumindo o poder, representa­da por pessoas que unificam o conhecimen­to técnico e de base”, diz David Braga, presidente e headhunter da Prime Talent e professor da Fundação Dom Cabral.

“Já chegaram a me perguntar se meu pai estava chegando

Fabrício Mitre presidente­executivo da Mitre Realty, cargo que assumiu aos 23 anos de idade

 ?? Gabriel Cabral/Folhapress ?? Fabricio Mitre, presidente da Mitre Realty, fundada por seu avô
Gabriel Cabral/Folhapress Fabricio Mitre, presidente da Mitre Realty, fundada por seu avô
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Divulgação/Dasa Pedro de Godoy Bueno, da Dasa, CEO aos 24 anos

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